«Mudar» para que tudo continue na mesma?
Pelo que se vai sabendo sobre as intenções do Ministério da Educação em matéria de alterações ao Estatuto do Aluno, a premissa de base parece ser a de não tocar no núcleo fundamental de desresponsabilização do comportamento absentista dos alunos e naquilo que mais trabalho inútil e mais dores de cabeça tem dado aos professores. Como se vê, o «eduquês» e o «pedagogês» continuam a imperar nas cabecinhas ministeriais, sem que a necessária barrela se vislumbre no horizonte.
É verdade que, no caso das alterações ao Estatuto do Aluno, a Assembleia da República não se poderá demitir – como o fez relativamente ao ECD – das suas funções. No entanto, tendo em conta que o tal «eduquês» atravessa as bancadas de quase todos os grupos parlamentares – pois a erva daninha medra mesmo com facilidade -, é de temer que venha aí uma “nova” lei com pouquíssimas novidades, e mesmo essas não necessariamente boas. A ver vamos…
À atenção dos responsáveis do ME
Sempre insistimos na necessidade de serem ouvidos os professores, que estão no terreno, sobre eventuais alterações nos diversos domínios da política educativa, nomeadamente no que respeita à reorganização curricular.
A APEDE apresentou publicamente a sua Proposta Alternativa, no passado mês de Dezembro, da qual surgiram hoje alguns aspectos (que devem ser contextualizados com a leitura da proposta global), no Jornal Público, em conjunto com algumas sondagens oportunamente promovidas pelo Paulo Guinote. Seria bom que estes contributos e opiniões de professores, que leccionam dia a dia nas escolas, e conhecem bem a realidade concreta, fossem tidos em conta nas medidas e decisões que vierem a ser adoptadas pelos responsáveis do ME.
Criando cortinas de fumo
Isto, isto e isto significam exactamente o quê? Razão tem o Paulo quando chama os bois pelos nomes, para falarmos em vernáculo. Estas manobras de bastidores trazem, de facto, um cheiro suspeito. É que os professores já estão demasiado escaldados com semelhantes coreografias e cortinas de fumo.
De uma coisa podemos estar certos: a tal «harmonização» do ECD com a lei geral da Função Pública não deixou de estar na agenda deste governo (e dos que hão-de vir). Apenas foi, por agora, metida na gaveta. Mas, como o Ramiro refere, é só uma questão de tempo. E, nessa altura, vai ser interessante ver o que os sindicatos têm a dizer.
Irão manter o mesmo tipo de bravata que agora proclamam aos quatro ventos?
Ou vão aceitar a dita «harmonização» apenas porque, dessa vez, ela será negociada? (Como se houvesse alguma coisa a negociar)
Os próximos capítulos desta história mal contada vão ser esclarecedores.
O fim das nomeações definitivas
O que se começa a saber da versão do Ministério para o Estatuto da Carreira Docente só vem confirmar aquilo que já estava, há muito, anunciado: os professores vão deixar de ser uma «carreira especial», passando a estar sujeitos a todas as demais regras da lei geral da Função Pública.
Leiam o artigo 29.º do ECD cozinhado pela anterior equipa de Maria de Lurdes Rodrigues, artigo esse que definia as modalidades de vinculação: lá estava a distinção entre nomeação provisória e nomeação definitiva. Procurem essa distinção na proposta que o Ministério agora apresenta. Não a encontram. Em lugar disso, encontram um artigo 29.º, igualmente dedicado à «modalidade de vinculação», com a seguinte redacção:
«O exercício de funções integrado na carreira docente é efectuado na modalidade prevista na lei geral».
Ora essa «lei geral» tem um nome, nome esse que já foi aqui várias vezes denunciado: chama-se Lei 12-A/2008 de 27 de Fevereiro, e tem um artigo, o 88.º, cujo ponto 4 diz que
«Os actuais trabalhadores nomeados definitivamente que exercem funções em condições diferentes das referidas no artigo 10.º mantêm os regimes de cessação da relação jurídica de emprego público e de reorganização de serviços e colocação de pessoal em situação de mobilidade próprios da nomeação definitiva e transitam, sem outras formalidades, para a modalidade de contrato por tempo indeterminado.»
Esclareça-se que o citado artigo 10.º determina que o conceito de «nomeação» (defnitiva ou transitória) passa a aplicar-se apenas aos quadros permanentes das Forças Armadas, aos diplomatas, a quem trabalhe na investigação criminal ou nos serviços de informações – em suma, a quem desempenha funções essenciais no Estado, coisa que, como toda a gente sabe, não é o caso dos professores, esses parasitas que é preciso pôr na ordem e precarizar o mais possível para ver se ganham e juízo e se convencem de vez da sua total irrelevância.
Portanto, no caso dos professores, o lema da carreira vai passar a ser:
Todos diferentes, todos precários.
Mas a história não acaba aqui. É que há sempre um elemento de farsa nestas coisas. Pois não é que agora os sindicatos ficaram muito surpreendidos por constatarem que, segundo a proposta ministerial de alteração do ECD (art. 24.º), o recrutamento e a mobilidade dos professores passam a ser geridos pelo Ministério das Finanças e que isso não estava previsto naquele magnífico acordo que assinaram com a ministra? Sentem-se traídos, coitadinhos. Ó sacrossanta inocência! (Que de inocente não tem nada, pois tudo isto são só coreografias para o pagode ver).
O que está a acontecer é a morte anunciada da carreira dos professores como uma carreira digna desse nome. Tudo feito em função da drenagem financeira das classes médias, apanhando na curva os professores reconduzidos ao seu redil, com escassa capacidade de reacção.
Acontece que, sem luta, não vamos lá. E se houver, como tem de haver, essa luta, ela terá de ser um combate alargado e articulado com toda a Função Pública, com todos os trabalhadores explorados e precarizados do sector privado, com todos os desempregados. E terá de ser uma luta inventiva, dura e corajosa, fora dos quadros tradicionais. E QUE SEJA MUITO MAIS DO QUE GREVES DE UM DIA ROTINIZADAS NAS AGENDAS SINDICAIS.
Um testemunho sentido…
Com um forte abraço para o Paulo Ambrósio, colega de todas as lutas, e que muito prezamos, aqui deixamos o seu texto, que constitui uma homenagem e um grito de alerta para sacudir muitas consciências adormecidas.
MEMÓRIAS ESPARSAS DO LUÍS
O Luís era uma daquelas pessoas já raras, porque digna, guiado por princípios e valores, exigente consigo próprio, tímido e muito metido com ele (era difícil arrancar-lhe um sorriso). Aos 51 anos, “solteirão”, ainda contratado – o professorado é a única profissão em Portugal onde isto ainda acontece! – veio até nós, no decurso da luta pela Profissionalização, contexto onde convivi com ele directamente durante cerca de três anos.
Portador de Habilitação Própria, foi eleito em Lisboa, em Plenário para a Comissão de Contratados, em 2004. Participou activamente em todos os protestos e acções reivindicativas da nossa Frente de Trabalho do SPGL, que levaram à conquista do Despacho nº 6365/2205 (profissionalização em serviço em ESE’s e Faculdades).
Era conhecido entre nós pelo ”freelancer” (alusão à sua segunda ocupação de jornalista eventual). Dotado de forte sensibilidade em relação ao mundo da informação e da comunicação social, propôs e pedia frequentemente, nas nossas reuniões, que os sindicatos encarassem esta frente (relações públicas) com outros olhos, mais eficazmente. A partir de 2006, não se recandidatou mais à nossa comissão de contratados.
Encontrei-o mais tarde nas mega-manifestações de professores: estava na Escola EB 2,3 Ruy Belo, e achei-o disposto a não entregar os Objectivos Individuais, um verdadeiro problema de consciência moral, para ele.
Depois disso, mais uma ou duas vezes, espaçadamente. Soube que tinha sido colocado na EB2,3 de Fitares, mas pouco mais.
No passado dia 11 de Fevereiro, revi-o pela última vez, em Oeiras, já deitado no caixão na capela mortuária. Conversei longamente com a mãe, a irmã, a empregada doméstica. Vêm-me à memória as palavras do pai, militar aposentado: “o Luís era bom moço, quis ser bom até ao fim, só que não aguentou o inferno das escolas de hoje… Vocês têm que fazer qualquer coisa!”
O Luís nos, últimos tempos, já tinha tomado friamente a decisão, inabalável. Por isso, não creio que nesse período, tenha pedido ajuda a ninguém. Segundo me disseram familiares, no velório, pela consulta do histórico do seu PC, ele, um mês antes e se lançar da ponte, consultava sites sobre suicídio, na internet. Escolheu o dia da sua morte coincidindo com a data de aniversário do pai, com o qual, aliás, se dava bem.
O ambiente no velório foi impressionante, pela dignidade, revolta interior e tristeza da cerimónia, com alguns professores presentes, num silêncio de cortar à faca, só rasgado por frases em surdina, de justo ódio, visando os políticos responsáveis pela situação a que nos últimos anos chegou o Ensino Público. Foi, sem dúvida, dos velórios mais tocantes em que estive até hoje, mesmo estando já habituado a duras perdas, e tendo estado na semana anterior, noutro, de um familiar directo. Quando escrevi no livro de condolências o que me ia no espírito, tive dificuldade em o fazer, a cortina de lágrimas teimava em desfocar-me as letras.
Pessoalmente, decidi manter silêncio durante um mês, por respeito ao pesado luto da família, só o quebrando depois da irmã dele (nossa colega, também) o ter feito, decorridos cerca de trinta dias, com a divulgação da notícia à comunicação social, para assim tentar evitar que outros casos se repitam, colocar toda a verdadeira dimensão das depressões e suicídios profissionais à luz do dia, rasgar o manto hipócrita dos silêncios assassinos e abalar as consciências de toda a sociedade.
Paulo Ambrósio
Membro da Comissão de Professores Contratados e da Frente de Professores e Educadores Desempregados do SPGL desde 1999.
Dois comentários que merecem urgente reflexão…
A propósito das declarações da ministra Isabel Alçada, publicadas no Público on-line :
“A ministra da Educação, Isabel Alçada, insistiu hoje que é preciso “dar mais força” aos directores das escolas para resolver casos de agressões e de “bullying” em meio escolar, considerando “grave” qualquer violência sobre alunos ou professores.”
“As situações graves de violência nas escolas “não são numerosas, felizmente”, mas basta “uma situação grave ou duas para nos termos que preocupar muito”, realçou. “Não podemos deixar que, no nosso país, haja nem um caso desta natureza. Sabemos que tem havido comunicação de quatro casos, mas quatro casos é muito. É indispensável que não haja nenhum caso”, argumentou.”
reparámos em dois comentários que não podemos deixar de destacar, transcrevendo-os de seguida, com a devida vénia:
“Anónimo , Norte. 16.03.2010 16:59
Não conhecem as escolas
Pois é Senhora Ministra, parece-me ser muito bem intencionada, mas meu Deus, não conhece as escolas. Neste momento os professores até escondem problemas de disciplina porque é a eles que muitos directores apontam o dedo. Há receio de dizer que se foi agredido ou vítima de indisciplina. Muitos directores não actuam como deviam fazer, responsabilizando os professores, não querem ter problemas com os alunos e com os pais. Simplesmente não fazem nada e quem se lixa é o professor. Tenho um irmão que é professor e veja bem, pelo que me diz custa-lhe tanto a indisciplina dos alunos como a indiferença da direcção. Deixou de participar dos alunos, para o director é ele o culpado. A antiga ministra estragou tudo.”
“El-Rey D. Sebastião , Reino da Dinamarca. 16.03.2010 16:58
Quer dar força aos Directores?
Por amor de Deus, Senhora Ministra, não a fazia tão ingénua! Eles já a têm demais. Acarinhe os professores e dê a força aos Directores de Turma, que aguentam com tudo em cima. De resto continuamos para aqui com conversas de mudos.”
A APEDE deixa uma última questão: quatro casos, senhora Ministra? Tem consciência, ou não, de que a realidade é outra e muito mais grave? Bem mais grave? Compreende, ou não, que estes lamentáveis e gravíssimos casos que agora vieram a público são apenas “a ponta do icebergue”? Será assim tão complicado ouvir os professores nas escolas? Mas atenção a uma precisão importante: é preciso ouvir os professores, dizemos bem, e não tanto os “especialistas” de gabinete, para já não falar do Conselho de Escolas e do seu presidente… acerca do qual o post anterior da APEDE é bem esclarecedor.
O que seria de nós sem estes optimistas de serviço?
A falta de vergonha tem muitos rostos. E há sempre quem goste de usar a máscara de Pangloss. No entender do presidente do Conselho Nacional de Escolas, esse órgão criado à medida da demagogia socratina em versão Ministério da Educação, não há motivo para alarmismos relativamente à violência escolar no nosso país. Sempre foi assim e sempre assim será, tudo está bem no melhor dos mundos, e abençoados os pobres de espírito pois é deles o reino dos céus. Aliás, como dizia um colega (por sinal, excelente romancista), se o reino dos céus é dos pobres de espírito, então isto aqui já é o paraíso!
Audição Pública do Bloco de Esquerda – Regime de Autonomia e Gestão dos Estabelecimentos de Ensino
O Bloco de Esquerda promove a discussão pública, na próxima quinta-feira, dia 18 de Março, às 10h30, no Auditório da Casa Amarela (Rua de S. Bento, junto à escadaria da entrada principal da Assembleia da República) da sua proposta de alteração ao actual regime de gestão das escolas, com base no documento que pode encontrar-se aqui.
Esta é, sem qualquer dúvida, uma importante iniciativa, e a APEDE agradece desde já à deputada Ana Drago o convite que nos endereçou para estarmos presentes.
Na audiência que teremos, em breve, junto da Comissão Parlamentar de Educação e Ciência, não perderemos a oportunidade de indagar junto dos restantes partidos políticos que iniciativas contam desencadear e até onde estarão dispostos a ir na urgente alteração do actual modelo de gestão das escolas.
Cartaz do Protesto Gráfico com o texto da APEDE: “Sobre a Autoridade do Professor”
O post anterior da APEDE “Sobre a Autoridade do Professor” está agora disponível em formato cartaz, que pode ser descarregado, impresso e afixado nas salas de professores.
Download aqui.
É fundamental promover e alargar o debate a todos os colegas!
Sobre a autoridade do professor…
… Umas tantas teses, em jeito telegráfico, e porque os acontecimentos graves destes últimos dias (destas últimas semanas, meses, anos) a isso nos obrigam:
1. A autoridade do professor, na sala de aula e perante os seus alunos, é um atributo estruturalmente indissociável do seu ofício. Não se é professor sem autoridade.
2. A autoridade do professor não é um dado natural, nem está imune aos processos de transformação histórica e social. Além disso, essa autoridade necessita de ser legitimada (perante os alunos, como perante os colegas de profissão)
3. O ponto anterior não implica, porém, que tal autoridade seja totalmente arbitrária ou tenha de ser absolutamente relativizada (o oxímoro é aqui propositado).
4. A autoridade do professor assenta no seu saber e na sua capacidade de o transmitir aos alunos, de modo a que, nessa transmissão, eles saiam mais enriquecidos no plano intelectual e no plano ético.
5. A autoridade do professor, de acordo com a definição anterior, cria uma assimetria incontornável entre professor e alunos. A relação pedagógica só é possível dentro dessa assimetria e no reconhecimento da mesma por parte dos actores envolvidos.
6. O exercício da autoridade pode (e, em certos casos, deve) ser parcialmente negociado pelo professor com os alunos.
7. O ponto anterior não implica, contudo, que a autoridade em si mesma, quando devidamente legitimada, seja objecto de negociação.
8. Na escola pública democrática, tal como em qualquer organização social dotada de hierarquias estruturais (que diferenciam, por exemplo, quem sabe e quem não sabe, quem ensina e quem aprende), nem toda a autoridade pode e deve ser partilhada, nem todas as decisões podem e devem ser objecto de negociação, e nem todos os indivíduos podem e devem deter autoridade sobre qualquer assunto. Nenhuma democracia consegue funcionar sem espaços que são, por essência, não-democráticos. A escola pública limita-se a confirmar esta regra.
9. O conhecimento não é democrático, mesmo que o acesso a ele possa e deva ser democratizado.
10. A democratização do acesso ao conhecimento, através da escola pública, coincidiu historicamente com o domínio político de uma ideologia apostada em relativizar a própria ideia de conhecimento, nomeadamente do conhecimento científico.
11. A ideologia da relativização do conhecimento dominou politicamente o discurso pedagógico encarregue de legitimar as práticas da escola pública democrática. Uma boa parte das chamadas «ciências da educação» foi mobilizada para esse exercício de relativização e para a destruição da assimetria pedagógica entre professor e aluno, fomentando a ilusão da igualdade de todos os «saberes».
12. A relativização do conhecimento acarretou, assim, a relativização da autoridade do professor, com danos irreparáveis na legitimidade deste último perante os alunos e perante a sociedade.
13. A relativização e a desautorização do saber e do seu representante, o professor, ficou associada à entronização do jovem e de um modelo de ensino «centrado no aluno». Esse modelo corresponde a um igualitarismo falacioso segundo o qual os supostos «saberes» dos alunos têm valor idêntico, senão superior, ao dos professores.
14. O igualitarismo pedagógico destruiu a possibilidade de uma igualdade social genuína e genuinamente democrática, pois manteve os jovens estagnados na miopia dos seus supostos «saberes» – invariavelmente ligados ao senso-comum de uma experiência social limitada – e incapazes de aceder à consciência crítica que só a cultura científica e humanística, transmitida pela instituição escolar, pode proporcionar.
15. A desautorização permanente do professor passou a ter o aval institucional do Ministério da Educação, traduzindo-se no discurso dos seus dirigentes políticos transitórios, caucionados pela ideologia pedagógica de um relativismo dominante que permanece bem enraizado nesse Ministério.
16. Em Portugal, a desautorização do professor, estimulada pelos poderes instituídos, tem sido reforçada por um senso-comum dominante em que imperam o desprezo pelos saberes académicos, o culto do oportunismo e do arrivismo social, o fascínio pela «esperteza saloia» e pela ascensão social fácil, mesmo quando reconhecidamente associada à corrupção económica.
17. O caldo de cultura mencionado nos pontos anteriores, conduzindo à perda de referências ético-políticas e de modelos de identificação, desemboca facilmente na violência exercida sobre antigas figuras de autoridade que sofreram e continuam a sofrer um processo de erosão imparável. O professor é uma dessas figuras. Não surpreende, por isso, que hoje ele se encontre particularmente exposto a diversas formas de agressão, formas que a ideologia relativista sempre procura desculpabilizar.
18. A violência dos alunos sobre os professores e a vulnerabilidade destes últimos são tanto maiores quanto a ideologia relativista suprimiu as categorias morais de responsabilização e de culpa, substituindo-as por um psicologismo generalizado para o qual só existem «vítimas» e potenciais «traumatizados», mesmo quando são estes os agressores.
19. Nenhuma reforma do sistema educativo e da escola pública, orientada para recentrar o ensino na transmissão intergeracional do conhecimento e na figura do professor, será minimamente eficaz, ou sequer possível, enquanto perdurarem os factores que fomos aqui assinalando.
E agora?
“Se o meu destino é sofrer, dando aulas a alunos que não me respeitam e me põem fora de mim, não tendo outras fontes de rendimentos, a única solução apaziguadora será o suicídio”. (Luís C. 51 anos, malogrado colega)
A APEDE, com uma audiência, em breve, na Comissão Parlamentar de Educação e Ciência, não se esquecerá de abordar este e outros assuntos absolutamente obrigatórios e inadiáveis.
Forever Young
10 de Março de 2010, Coliseu dos Recreios:
Concerto memorável de uma mulher eterna
E a interpretação (perfeita) de uma das mais belas canções do Bob Dylan pode ser ouvida (e vista) aqui. A interpretação que Joan Baez fez da mesma canção nesta noite do dia 10 não foi menos perfeita.
Um momento particularmente emotivo do concerto de ontem deu-se quando Joan Baez, sozinha no palco, pegou numa folha de papel, disse ao microfone, em português, «cantem comigo», e começou a cantar… a «Grândola Vila Morena». O Coliseu em peso acompanhou-a.
Felizes dos que, no século XXI, ainda vão colhendo notícias do melhor que o século XX nos legou.
Forever young, pois claro.
No Rescaldo da Greve de 4 de Março
A APEDE considera que, uma vez mais, interpretou correctamente o sentir da grande maioria dos professores ao demarcar-se desta greve. Ou não fossem todos os seus membros professores no activo, a leccionar em diferentes níveis de ensino, colocados em escolas de diferentes regiões do país, em contacto com muitos outros colegas. Para além de todas as razões invocadas no comunicado conjunto, não podemos deixar ainda de salientar que a APEDE desde há muito vem apelando para a tomada de posições de luta mais firmes, duras e efectivas, inseridas num plano articulado e coerente de reivindicação, decidido com independência e pelas bases, sem cedências prévias em memorandos/acordos claramente insuficientes e desmobilizadores. Temos muita coisa ainda para conquistar e muita luta para desenvolver: gestão das escolas, modelo de avaliação, condições de trabalho e de carreira, precariedade, desburocratização do trabalho docente, dignificação e revalorização da profissão, etc. Estaremos sempre disponíveis para essa luta, como sempre estivemos, desde que cumpra os princípios atrás definidos. Continuaremos firmes e independentes, sem cedermos um milímetro naquilo que consideramos essencial. E há mesmo algumas importantes questões para colocar, em breve, sobre problemas e assuntos que parecem andar esquecidos e que se relacionam com o primeiro ciclo avaliativo e a sua excrecência, absolutamente lamentável, que actualmente decorre, e se mantém nas escolas, para milhares de professores. Porque, afinal, nem suspensão, nem substituição, temos tido apenas mais do mesmo. Que é mau, muito mau, como todos sabemos.
Carta Aberta de 5 ONG de defesa dos Direitos Humanos sobre a morte do Leandro, vítima de bullying na escola
Ao Ministério da Educação, à Direcção Regional de Educação do Norte e ao Conselho Directivo da Escola E.B. 2,3 Luciano Cordeiro
A Amnistia Internacional – Portugal, a AMI – Assistência Médica Internacional, a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, a Margens – Associação para a Intervenção em Exclusão Social e Comportamento Desviante e a OIKOS – Cooperação e Desenvolvimento, juntam-se para:
Publicamente manifestar:
– A sua sentida solidariedade com a família e amigos do Leandro, criança de 12 anos, que optou por pôr termo à sua vida devido ao espancamento repetido por dois colegas mais velhos da Escola E.B. 2,3 Luciano Cordeiro. – A sua indignação perante os factos que estão na origem de tão grave acontecimento e que, segundo familiares, já tinham tido lugar repetidas vezes, uma das quais originando internamento hospitalar do Leandro.
Publicamente instar:
– Os destinatários da presente carta a apurarem todas as responsabilidades por acção e por omissão na morte deste jovem e concomitantemente envolverem as autoridades policiais e judiciais.
Portugal, Estado parte da Declaração dos Direitos da Criança e da Convenção dos Direitos da Criança está comprometido a respeitar e garantir os Direitos das Crianças. Prescreve, designadamente, o n.º 3 do artigo 2.º da Convenção sobre os Direitos da Criança que “Os Estados Partes garantem que o funcionamento de instituições, serviços e estabelecimentos que têm crianças a seu cargo, assegurem que a sua protecção seja conforme às normas fixadas pelas autoridades competentes, nomeadamente nos domínios da segurança e da saúde, relativamente ao número e qualificação do seu pessoal, bem como quanto à existência de uma adequada fiscalização.”
Estamos perante um caso que, à luz do ordenamento jurídico nacional e internacional, tem que ser objecto de investigação objectiva e célere. A inacção e passividade dos responsáveis constituem uma grave violação de Direitos Humanos, em especial dos Direitos das Crianças.
As Organizações subscritoras, exigem o cumprimento das normas que protegem as crianças.
Para que tanto seja possível, reforçamos a importância da Educação para os Direitos Humanos na Escola, quer para os alunos, quer para os professores e restante comunidade escolar.
Convidamos todas as escolas do país a, na segunda-feira dia 8 às 11h00 da manhã a fazerem um minuto de silêncio em homenagem ao Leandro. Seja essa a ocasião para recordar a todos a gravidade deste tipo de situações. Acabar com elas é a melhor homenagem que se pode prestar ao Leandro e à sua família.
“Todas as grandes personagens começaram por ser crianças, mas poucas se recordam disso.”Antoine de Saint-Exupéry
As organizações subscritoras:
Amnistia Internacional – Portugal
AMI – Assistência Médica Internacional
APAV – Associação Portuguesa de Apoio à Vítima
Margens – Associação para a Intervenção em Exclusão Social e Comportamento Desviante
OIKOS – Cooperação e Desenvolvimento
Petição “Por um Departamento Curricular de Educação Especial”
Destinatário: Docentes de Educação Especial
Petição “Por um Departamento Curricular de Educação Especial”
Assinar aqui: http://www.peticao.com.pt/educacao-especial
A publicação do Decreto-Lei nº 3/2008, de 7 de Janeiro, veio estabelecer novas regras no atendimento a crianças e adolescentes com necessidades educativas especiais (NEE), alterando os pressupostos legais determinados pelo Decreto-Lei nº 319/1991, de 23 de Agosto. Contudo, este novo Decreto-Lei incute também grandes responsabilidades no que se refere à implementação das novas medidas ao Departamento Curricular de Educação Especial das escolas agrupadas, organismo este que neste momento deixou de existir nas escolas.
De facto, desde o Decreto Regulamentar nº 2/2008 de 10 de Janeiro em conjunto com o Despacho nº 7465/2008, que regem a avaliação de desempenho docente, que este Departamento Curricular passou a estar integrado no Departamento de Expressões, em conjunto com áreas de saber tão distintas como Artes Visuais, Educação Musical, Educação Tecnológica e Educação Física. Dada a sua especificidade, acreditamos que o Departamento Curricular de Educação Especial deveria existir autonomamente, funcionando como motor impulsionador de práticas, projectos e um atendimento verdadeiramente inclusivo extensível a toda a comunidade escolar.
A inexistência de Departamento de Educação Especial nas escolas agrupadas em nada favorece a criação de um bom atendimento à comunidade educativa na promoção de uma educação verdadeiramente inclusiva, conforme os pontos descritos nas alíneas seguintes:
O primeiro ponto prende-se com o número de docentes existente no Departamento de Expressões. Na maioria das escolas agrupadas, o número de docentes de Educação Especial é de 2/3 relativamente a outras áreas disciplinares do mesmo departamento, o que justificaria desde logo a criação de um departamento curricular autónomo.
O segundo ponto refere-se à operacionalização de algumas das competências próprias dos departamentos curriculares, que se torna inviável dada a diferença abismal entre as áreas de saber que fazem normalmente parte do Departamento Curricular de Expressões, a saber: a) planificação conjunta de actividades lectivas e não lectivas; b) produção conjunta de materiais de apoio à actividade lectiva; c) identificação de necessidade de formação consonantes com cada área de saber. Acreditamos, pois, que a natureza transversal mas também específica do domínio da Educação Especial beneficiaria toda a escola, caso fosse constituído um departamento curricular autónomo.
Quanto ao terceiro ponto que aqui enunciamos, consideramos que está a ser praticada uma ilegalidade nas escolas. Ao analisarmos com cuidado o Decreto-Lei nº 3/2008, de 7 de Janeiro, verificamos que o departamento de educação especial é invocado 4 vezes nos artigos 6º e 21º, para: a) a realização de actividades de avaliação diagnóstica de competências dos alunos; b) a criação e implementação de adequações curriculares; c) o encaminhamento de alunos para serviços de apoio e de psicologia; d) o estímulo à participação activa de encarregados da educação no seio escolar; e) e, ainda, a implementação de currículos específicos individuais.
Por último, pretendemos chamar a atenção para o facto de que a avaliação do desempenho docente dos professores de Educação Especial é muitas das vezes supervisionada por docentes de áreas do saber distintas, uma vez que o número de professores titulares de Educação Especial é escasso para que haja delegação de competências. Consideramos, pois, que a avaliação deveria ser assegurada por pares mas com competências específicas na área. Mais uma vez, esta situação seria facilmente resolvida com a criação de um Departamento Curricular de Educação Especial e, concomitantemente, com a existência de vagas para professores titulares poderem assumir a referida supervisão.
Nestes termos, solicitamos muito respeitosamente os bons ofícios e a intervenção de V. Exa. no sentido de contribuir para que a actual situação seja objecto de uma decisão política clara e inequívoca que viabilize a resolução dos constrangimentos acima referidos, os quais afrontam a promoção de práticas e desenvolvimento de projectos inclusivos.
Atentamente,
Os Peticionários
Por que nos Demarcamos da Greve do dia 4 de Março
COMUNICADO DOS MOVIMENTOS INDEPENDENTES DE PROFESSORES
POR QUE NOS DEMARCAMOS DA GREVE DO DIA 4 DE MARÇO
Os movimentos independentes de professores, APEDE, MUP e PROmova, demarcam-se da greve de professores agendada pelos sindicatos para o próximo dia 4 de Março e, por conseguinte, não farão nenhum apelo à participação dos docentes nesta jornada de luta, sem que tal opção traduza da nossa parte qualquer beliscar da justeza da greve para muitos funcionários públicos ou mesmo qualquer discordância de fundo com a maioria das razões invocadas para a justificação da mesma.
Esta posição, além de exprimir o sentimento geral de desmobilização e de falta de confiança dos professores na capacidade destas direcções sindicais para defenderem as suas reivindicações centrais, mercê da frustração e da indignação com que a maioria dos docentes recebeu o Acordo de Princípios celebrado entre sindicatos e ME, escora-se no conjunto das razões a seguir expostas:
1. ninguém compreende que escassas semanas após a celebração de um Acordo entre sindicatos e ME, que passou para a opinião pública uma mensagem de entendimento e pacificação (mesmo que ilusória), os sindicatos se venham agora envolver na forma de luta mais extrema, ao mesmo tempo que continuam a negociar com o ME, sobretudo quando, no momento oportuno para o fazerem, claudicaram na defesa das principais reivindicações dos professores, nomeadamente o fim deste modelo de avaliação e a recusa do sistema de quotas (porque o fim da divisão da carreira era uma conquista adquirida), permitindo que a negociação se confinasse a uma redefinição das progressões na carreira, por sinal penalizadora para a maioria dos professores;
2. as questões salariais nunca foram o ímpeto da mobilização dos professores e seria um mau sinal que a justíssima luta dos professores pudesse ser confundida, pela opinião pública, com reivindicações de natureza salarial, particularmente num período em que a situação económica da maioria das famílias portuguesas passa por dificuldades, em muitos casos dramáticas;
3. é de todo incompreensível que a reivindicação que mobilizou a esmagadora maioria dos professores, a saber o fim deste modelo de avaliação, a qual persiste quase intacta na filosofia e nas práticas do modelo de avaliação em vigor e dos retoques que se anunciam, tenha sido inexplicavelmente abandonada pelos sindicatos e não constitua, sequer, parte das razões da greve;
4. persiste a dificuldade em explicar aos professores a espantosa contradição entre aceitar, no precipitado e injustificado Acordo de Princípios, os bloqueios no acesso ao 5.º e 7.º escalões e vir agora invocar a contestação desses bloqueios como uma reivindicação que legitima a greve, o que constitui pura hipocrisia ou mero tacticismo sindical à custa dos interesses dos professores;
5. a marcação desta greve foi, mais uma vez, decidida pelas cúpulas sindicais e à revelia da auscultação da vontade dos professores, a que acresce a circunstância de não se vislumbrar nenhuma movimentação significativa a nível dos sindicatos nas escolas para que a greve resulte;
6. os professores sentem que os sindicatos, em sede negocial e pela segunda vez, não interpretaram e não defenderam condignamente as suas principais reivindicações, pelo que prevalece um sentimento, dificilmente superável nos próximos tempos, de que as estruturas sindicais não os representam convenientemente. A ideia que predomina nas escolas é a de que não vale a pena lutar conjuntamente com estas direcções sindicais, pois estas acabam quase sempre por desbaratar o capital de luta alcançado.
Tudo isto torna expectável uma baixíssima adesão à greve por parte dos professores, embora tal não deva ser interpretado como um sinal de apaziguamento ou de satisfação da classe pelas parcas conquistas alcançadas, pelo que se torna fundamental repensar formas, estratégias e acções de luta para o futuro que sejam verdadeiramente unitárias entre sindicatos, movimentos e professores.
Este modelo de avaliação, o sistema de quotas, o actual modelo de gestão, as situações de precariedade de muitos docentes e o desemprego de muitos milhares de outros, deverão mobilizar-nos para a definição e a dinamização de uma convergência de vontades que ausculte e debata formas de luta, antes de as impor.
APEDE,
MUP,
PROmova