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(Re)começar a mexer: um texto de Maria José Cheira

No preâmbulo do Decreto-Lei n.º 75/2010 de 23 de Junho, lê-se que as “alterações” introduzidas no ECD “visam (…) assegurar a prioridade ao trabalho dos docentes com os alunos, tendo em vista o interesse das escolas, das famílias e do País”.
Porém, nas escolas, hoje, os professores vivem no avesso.

Hoje, os professores são forçados a não dar prioridade ao trabalho com os alunos.
Hoje, para implementar esta ADD, os professores são forçados a se ocuparem de tarefas burocráticas que ocupam o tempo da preparação das actividades lectivas, da produção de materiais didácticos, do acompanhamento de projectos diversos.
Esta ADD não é sã.
Esta ADD rouba o tempo dos professores para os alunos.
Esta ADD não atribui valor nenhum ao trabalho dos professores.
Esta ADD cria um clima cilindrador nas escolas.
Esta ADD desperta boas vontades em espiar. Me dói esse frenesim. Me soluça haver medo no meu país.
Esta ADD não se dá bem com a justiça, a transparência, o rigor, a imparcialidade.
Esta ADD só consegue engordar os egos magrinhos de professores fartos da sua inutilidade ruidosa.
Esta ADD amiúda.
Esta ADD arrebanha.
Esta ADD trata como populaça os professores.
Esta ADD está às portas da lei da chibata.
Esta ADD não é sã.
Quem me dera que esta ADD prestasse.

Hoje, porém, o ME força os professores a servirem o Estado como máquinas.
Hoje, o ME força os professores a não fazerem uso livre da sua inteligência.
Hoje, o ME força os professores a serem avaliados por pares sem formação especializada.
Hoje, o ME força os professores a serem avaliados por pares de áreas científicas diferentes, se não opostas.
Hoje, o ME força os professores mais experientes a serem avaliados por pares com posição menos elevada na carreira.
Hoje, o ME força os professores mais qualificados a serem avaliados por pares com menos habilitações académicas.
Hoje, a implementação da ADD aponta a porta da rua aos professores situados nos últimos escalões da carreira.
Hoje, os professores mais experientes, os que foram, durante anos, psicólogos, assistentes sociais, investigadores, moralizadores, educadores de tantos jovens, sentem-se pisados, humilhados, desrespeitados.
Hoje, o ME trata os professores mais experientes, mais qualificados, como inúteis.
Hoje, os professores mais experientes vêem, e sentem na pele, que o ME os despreza e que os sindicatos a isto dizem nada e até assina(ra)m de cruz.
Hoje, professores, entre os mais experientes, que cumpriram com brio e dedicação a elevada missão da escola pública, pedem a reforma antes do tempo. “Que lágrimas, que grito hão-de dizer/ A desilusão e o peso em vosso corpo”, ó meus colegas?
Para o ME um bom professor é aquele que está de saída.
O ME (re)faz contas e esfrega as mãos com volúpia e todo ele é um hino.
O nome do ME é desprezo pelos “professorzecos”.
Quem me dera que o ME honrasse os professores.

Hoje, a Educação é uma área preferencial de cortes brutais na despesa orçamental.
Hoje, por descuido, está em causa o “interesse das escolas, das famílias e do País”.
Hoje, tudo isto nos diz respeito – somos cidadãos.

Maria José Cheira
Escola secundária D. Manuel I de Beja

25 Respostas para '(Re)começar a mexer: um texto de Maria José Cheira'

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  1. Força Zézita! Vamos dizer um rotundo não a esta farsa toda. Que todos em todas as escolas se ergam e proclamem a sua total indisponibilidade para colaborar e por de pé estas estratégias indignas e destruidoras da Escola Pública!!!!

  2. joaoandrade said,

    Essa senhora Zézita nunca fez a ponta de um chavo! Ganha ordenado e anda de tribunal em tribunal…

    • Maria José Cheira said,

      Não vou seguir o “guião” que quer impor. Ninguém pode obrigar-me a dizer o que prefiro calar, aqui. Todavia, convém rectificar que nunca andei, nem ando, de “tribunal em tribunal”.
      Quando me fizeram andar em tribunal estive acompanhada de colegas, sindicalizados todos. Esclareça-se.
      Sei bem que há pessoas provocadoras que desfrutam tentando levar os outros a situações limites. Há mesmo, infelizmente, quem tenha feito disso a sua forma de vida.
      Sei bem que há colegas que se arrependem do que escrevem nos blogues, e que pedem para isso ser apagado, como há colegas que usurpam a identidade de outros.

  3. leopoldo said,

    Essa mulher adora conflitos ! cada ano que passa a única coisa que escreve no diário é o número de pessoas com quem se zangou..Trabalhar, trabalhar..nunca vimos
    Adora confusões, conflitos, inspecções.. toda a gente a conhece !

    • Maria José Cheira said,

      Olhe, “Leopoldo” X: conheço muitos colegas que, em determinado momento das suas vidas, outros quiseram comprar, mas não conheço ninguém “com ética” que seja feliz depois de se ter vendido. Desculpar-me-á, mas, em meu entender, há coisas que não podem ser vendidas.
      Reconheço que, no meu trabalho, a minha maior debilidade é ser capaz de expressar com sinceridade as minhas opiniões. Reconheço tab que tenho sofrido ataques por terem querido comprar-me a minha vontade, o meu silêncio ou a minha cumplicidade, em troca de promessas ou de promoções. Poderia exemplificar? claro que sim, “Leopoldo X”, mas, agora, não me apetece.

  4. bettencourt said,

    Ela tem razão! O problema é que com os órgãos da escola a fazerem tudo com diz na cartilha, não tem hipótese.Eu sei que muitos não concordam.. mas fazem !

  5. bettencourt said,

    Mas ela pensa que está em Maio 68? Temos um estado de direito ! Temos que cumprir, quer concordemos ou não. Imaginem que cada funcionário não fizesse aquilo com que não concordasse.. que falta de juízo.Prejudica-se a si principalmente. E sai desta história ainda mais mal vista !!Ela e mais dois ou 3.Um até já não está no activo… mas continua a ser urso!Outro finge que está no activo, mas é um texugo que escava no fundo para procurar lixo.e .uma franjinha histérica que virou a cabeça dos mais ponderados… que tristeza, que tristeza…

    • maria said,

      Fui aluno e agora sou colega da Maria José.
      Não posso deixar passar sem dizer que quanto mais
      tentam denegri-la, mais brilhante ela fica.

      É uma mulher inteligente
      que não se acomoda
      que é frontal
      que não é pequenina…
      com ela ao lado as coisas podem mudar para melhor !
      Que bom tê-la ao lado !

      Dá muito trabalho ser inteligente !
      É um trabalho que não se vê… mas nós, alunos, bem o
      sabemos apreciar. E agora, como colega, dou muito
      valor a pessoas que têm capacidade de luta…não é fácil lutar !

      No meio da escuridão há sempre alguém que diz, não !!!!!!
      Força Maria José, estás a fazer um grande trabalho… O trabalho mais difícil… lutar !

      maria

      • julia said,

        A história repete-se por outras palavras …

        Há 70 anos atrás os que accionaram o “botanito” das câmaras de gás também cumpriam a lei, as normas, os regulamentos que vinham de cima … e assim morreram milhões !

        Será que passámos pela escola e não aprendemos nada? …

        Queremos gente que pense e não autómatos ! Não podemos ser subservientes dos decretos que nos causam tanto mal … que dão cabo de nós !

        haja luz !

    • Maria José Cheira said,

      O “bettencourt” deste post é o mesmo que escreveu o post anterior?? 2 “bettencourt”, 2 estilos, 2 condutas em tudo diferentes.
      Perfeito como agitprop, i.e., manipulação.
      Que o verdadeiro Bettencourt não fique amargurado por isso. É que os trepadores existem tb entre os professores, hélas …

      Estou disponível para o intercâmbio de ideias acerca do meu texto/posição sobre a ADD.
      Não estou disponível para falar mal dos outros, porque não posso e nem devo abdicar da minha ética pessoal e profissional.


    • 2 ou três, “bettencourt”? olhe que não, olhe que não… mas leia isto aqui e impregne o seu espírito desta certeza: esta ADD não presta.
      Palavras do grande Miguel Torga, tão mal visto no seu tempo, coitado.

      Não sei quantos seremos, mas que importa?!
      Um só que fosse, e já valia a pena.
      Aqui, no mundo, alguém que se condena
      A não ser conivente
      Na farsa do presente
      Posta em cena!

      Não podemos mudar a hora da chegada,
      Nem talvez a mais certa,
      A da partida.
      Mas podemos fazer a descoberta
      Do que presta
      E não presta
      Nesta vida.

      E o que não presta é isto, esta mentira
      Quotidiana.
      Esta comédia desumana
      E triste,
      Que cobre de soturna maldição
      A própria indignação
      Que lhe resiste.

  6. coelho said,

    Não estamos no maio de 68, mas estamos quase na primavera de 2011.
    As flores estão a chegar aos campos …
    Saibamos vê-las !
    Essas sim , valem a pena … não difamam ! Não têm máscara ! São belas !

    coelho

  7. said,

    No Japão, as centrais nucleares estão quase a rebentar ……. ………. parece que basta o mínimo tremor … e depois, nada fica …

  8. said,

    Concordo contigo, Julia, a história repete-se …

    Na sala dos professores…

    dão-se gritos de revolta, quando se confia nos colegas,
    mas sempre com o ouvido à escuta, pode entrar algum “capacete de aço”.
    Há medo ! Muito medo ! Sabes, os colegas têm filhos, têm de ganhar o pão… Um pão que sabe a sofrimento ! Estão à beira de um “ataque de nervos” ! A aflição das câmaras de gás … Algumas bocas abrem-se para dizer que se vão embora, nem que seja para lavar escadas, outros dizem que não podem fugir… E o “botanito” continua pressionado, por dedos que cumprem a lei e esperam mais uma divisa ou uma promoção …
    Isto é revoltante, Julia !
    Isto está a passar-se … quem me dera não ter de o dizer !

    • ana said,

      Ainda bem que aqui podemos desabafar !

      A intimidação e o dizer mal está a tomar proporções…
      Tenho saudades do tempo em que havia partilha e convívio !

      Hoje, há nervos, atestados, caras mal humoradas…
      Revolta !

      Precisamos de uma ajuda, lá de cima !

      Ensinar é libertar, não é chafurdar em decretos… em papéis.
      Estamos cansados e uns contra os outros… É triste sentir-me mal no sítio onde mais horas passo, a Escola.

      Que quem dirige os nossos destinos nos ajude, senão, daqui a pouco o corpo está todo minado e não sobra um sorriso …

      Um obrigado aos colegas que estão a dar a cara contra este processo, de norte a sul do país… Dão-me o ânimo que me falta nos momentos mais difíceis.

      ana

      • gabriel said,

        Infelizmente, muitas vezes segue-se o lema :

        “Quem não está comigo é contra mim” ! E vai daí …
        chamam-se nomes, desce-se baixinho… muito baixinho ! Que prepotência ! Muita falta de formação … ou sei lá do quê … Discutam-se ideias e deixe-se as pessoas em paz… Cada um de nós tem muito valor e ao mesmo tempo tem coisas menos boas, somos humanos… e ainda bem ! Nas discussões, que tal nos habituarmos a valorizar o que cada um tem de bom … e discutir ideias, sem o sinal da pessoa x ou y… Todos ganhávamos ! A escola agradecia !

      • andré said,

        Concordo contigo Gabriel !

        Dizer mal, não ! Dá cabo de todos… e todos somos um !
        Só quem não tem argumentos recorre à ameaça e ao insulto ! É mau … Não vamos por aí ! Se todos procedessemos dessa maneira, a radioactividade era de tal ordem que era o nosso fim … era o colapso !

  9. bia said,

    Li e gostei, das palavras da maria, da julia, do zé…

    Estas sim, estão ao nosso nível e com elas não há erva daninha
    que cresça no quintal…

    É bom que se diga tudo para que se saiba … e a história
    não se repita !

    Obrigado à Maria José, cujo texto abriu esta conversa…
    são estes pequenos gestos que nos vão libertando até chegar
    o dia desejado…

    bia

    • joão said,

      A ADD está no fim ! morre com a queda do governo e com a pressão dos que deram a cara ao chicote. Pelo que circula nos corredores, a morte está a ser anunciada para antes do final do ano… Com a luta que se está a travar nas escolas, esta é a solução mais certa.
      joão

  10. Joaquim said,

    Pensando em ti, Maria José. Obrigada por existires.

    Porque

    Porque os outros se mascaram mas tu não
    Porque os outros usam a virtude
    Para comprar o que não tem perdão.
    Porque os outros têm medo mas tu não.

    Porque os outros são os túmulos caiados
    Onde germina calada a podridão.
    Porque os outros se calam mas tu não.

    Porque os outros se compram e se vendem
    E os seus gestos dão sempre dividendo.
    Porque os outros são hábeis mas tu não.

    Porque os outros vão à sombra dos abrigos
    E tu vais de mãos dadas com os perigos.
    Porque os outros calculam mas tu não.

    Sophia de Mello Breyner Andresen

  11. Maria José Cheira said,

    Obrigada, Joaquim. Touchée. Reparaste que no texto há um verso da Sophia?

  12. Emília Manuela Magalhães said,

    Colegas,
    … só conseguimos ultrapassar problemas que nos insurgem diariamente,…….. se formos autênticos com os outros e, essencialmente, connosco!!!!!!

    Saudades da colega do Porto que já por aí passou…….
    Jokas
    Emília para uns e Milé para outros

    • Maria José Cheira said,

      Saudades Milé.

  13. ferro said,

    Tenho uma veia de transmontana !
    Mais vale quebrar que torcer !
    Tenham coragem e mandem a AAD às urtigas !
    Levantem-se e digam não !
    Não vos hão-de comer e, se comerem …

    Quanto mais continuarem na estrada AAD2011,
    mais problemas vão surgir … e de que maneira …
    Antes de começar o verão vêm as maiores chatices e estas
    trazem outras … digam

    NÃO !

    Tenham um rasgo de inteligência !

    Conheço-te, Maria José, do tempo em que passei pela escola…
    ajuda esse pessoal a sair dessa ! É boa gente, conheço-os…
    ajuda-os, nem que queimes a pele… um dia hão-de reconhecer !

    Pelas escolas, não teimem em continuar …
    Esta AAD está moribunda, o mal estar é muito !
    Vamos acabar com ela…

    ferro


  14. Não conheço nenhum dos colegas que aqui têm comentado. Mas não posso deixar de enviar um forte abraço a todos aqueles que continuam, com a máxima dignidade, seriedade e respeito pela profissão que abraçaram, a resistir activamente contra os desvarios deste governo que pode estar (finalmente) prestes a cair e que nos tomou como alvo. Que com ele caiam tb as medidas desastrosas que tem tentado impor às Escolas e aos professores é o meu desejo e, por certo, motivo para continuarmos a lutar sem cedências, com coragem e determinação.
    Venceremos esta “guerra” porque temos razão, e a força da razão não pode ser derrotada.


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