Do programa do próximo governo
Aquilo de que os partidos da “troika” (PS, PSD e CDS) não falam.
Extraído daqui:
«O Governo irá preparar até ao T4‐2011 um plano de acção para reformar o sistema de prestações de desemprego, com o propósito de reduzir o risco de desemprego de longa duração e fortalecer as redes de apoio social, de acordo com os seguintes orientações:
i. reduzir a duração máxima do subsídio de desemprego para não mais do que 18 meses. A reforma não abarcará os actuais desempregados e não irá reduzir os direitos adquiridos dos trabalhadores;
ii. limitar os subsídios de desemprego a 2.5 vezes o Indexante de Apoios Sociais (IAS) e introduzir um perfil decrescente de prestações ao longo do período de desemprego após seis meses de desemprego (uma redução de pelo menos 10% do montante de prestações). A reforma irá abranger os trabalhadores que ficarem desempregados após a reforma (…)
O Governo irá apresentar, até ao final de Julho de 2011, à Assembleia da República legislação no sentido de implementar reformas nas compensações em relação às novas contratações, de acordo com o Acordo Tripartido de Março de 201119. As compensações por cessação de contrato de trabalho para contratos sem termo serão alinhadas com as previstas para os contratos a termo. A reforma irá redesenhar os sistemas de compensações por cessação de contrato de trabalho da seguinte forma:
O total de compensações por cessação de contrato de trabalho para os novos contratos sem termo será reduzido de 30 para 10 dias por ano de antiguidade (e 10 dias adicionais a serem pagos por um fundo financiado pelos empregadores) com um limite máximo de 12 meses e a eliminação do limite mínimo de 3 meses de retribuição que não dependem da antiguidade;
O total das compensações por cessação de contrato de trabalho para os contratos a termo será reduzido de 36 para 10 dias por ano de trabalho, para contratos inferiores a 6 meses, e de 24 para 10 dias, para contratos de maior duração (com 10 dias adicionais a serem pagos por um fundo financiado pelos empregadores) (…)
Definição de despedimentos. O Governo irá preparar até ao T4‐2011 uma proposta de reforma com o objectivo de introduzir ajustamentos aos casos de despedimentos individuais com justa causa previstos no Código do Trabalho, tendo em vista combater a segmentação do mercado de trabalho e aumentar a utilização dos contratos sem termo. Esta medida dará origem a uma proposta de lei que será apresentada à Assembleia da República até ao T1‐2012.
Os despedimentos individuais por inadaptação do trabalhador deverão ser possíveis mesmo sem a introdução de novas tecnologias ou outras alterações no local do trabalho (art.ºs 373‐380, 385 do Código do Trabalho). Entre outras, pode ser acrescentada uma nova causa justificativa nos casos em que o trabalhador tenha acordado com o empregador atingir determinados objectivos e não os cumpra, por razões que sejam da exclusiva responsabilidade do trabalhador;
Os despedimentos individuais associados à extinção do posto de trabalho não devem necessariamente seguir uma ordem pré‐estabelecida de antiguidade, se mais do que um trabalhador estiver destinado a funções idênticas (art.º 368 do Código do Trabalho). A ordem pré‐definida de antiguidade não é necessária desde que o empregador estabeleça um critério alternativo relevante e não discriminatório (semelhante ao já existente no caso dos despedimentos colectivos);
Os despedimentos individuais, pelas razões acima indicadas, não devem estar sujeitos à obrigação da tentativa de transferência do trabalhador para outro posto de trabalho disponível ou uma função mais apropriada (art.ºs 368, 375 do Código do Trabalho). Em regra, se existirem postos de trabalho disponíveis, compatíveis com as qualificações do trabalhador, devem ser evitados despedimentos.»
O drama da esquerda
O Paulo até pode ter razão neste seu “post”. Seja como for, vale a pena olhar também para este outro texto a fim de vermos os dilemas com que a esquerda, em Portugal como na Europa, hoje se debate.
Há uma enorme dificuldade, por parte dos partidos à esquerda do PS, em designar o partido de José Sócrates por aquilo que ele realmente é: um partido de direita.
Fica-se assim perante um estranho paradoxo político: um partido “de esquerda” que, sempre que está no poder, só aplica políticas de direita.
Mas percebe-se porque o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda nunca nomeiam a natureza de fundo do PS, mesmo quando verberam as políticas de direita que esse partido invariavelmente desenvolve (e, no caso actual, as mais agressivas que alguma vez foram instauradas neste país, antes – note-se bem – de se sonhar sequer com descalabros financeiros e “troikas”). Percebe-se que o (não) façam, porque, sem o PS, uma maioria de esquerda é rigorosamente inimaginável em Portugal, dado que o crescimento do eleitorado do PCP e do BE tem limites social e culturalmente incontornáveis. É um outro paradoxo, porque o PS insiste em não ser de esquerda.
Quando lemos o “post” de Daniel Oliveira, lembramo-nos de que a história que lá se conta é ainda filha do colapso dos regimes “comunistas” do Leste europeu. Desaparecido do mapa o “espectro” que, apesar de tudo, era percepcionado como ameaça para o sistema do capitalismo global – mesmo quando alguns autores o inscrevem (paradoxalmente?) nesse sistema -, a social-democracia na Europa entendeu que era chegada a hora de se deixar absorver pelo modelo neoliberal que triunfou sobre antigos regimes comunistas. E a ex-social-democracia, mais do que os partidos da direita liberal pura e dura, tem sido a principal coveira do Estado-Providência e da economia keynesiana. Entre nós, o PS limitou-se a seguir essa tendência – se partirmos do princípio (muito discutível) de que esse poderia ser o nosso partido social-democrata (o PSD, que é apenas um partido neoliberal mal nomeado, não conta para esta história).
Sem partidos verdadeiramente social-democratas, pergunta-se: para onde emigrou então a social-democracia, no sentido que essa expressão adquiriu no pós-guerra europeu? Por bizarro que pareça, a social-democracia, com a defesa do «Estado Social» e de uma economia mista, encontra hoje o seu único esteio nos partidos que, outrora, se reclamaram de uma revolução socialista entretanto descredibilizada pelo modelo a que deu origem. Sem poderem reivindicar esse modelo, cujo colapso foi brutal e defnitivo, os partidos ditos “radicais” recuaram estrategicamente para uma defesa de um “socialismo” mínimo. Isto é, de um “socialismo” praticável no quadro capitalista.
Por outras palavras: Entre nós, os partidos social-democratas são o PCP e o BE. Mais um paradoxo.
É verdade que o PCP e o BE mantêm uma retórica anti-capitalista, para efeitos de arregimentação de hostes que continuam a praticar o “slogan” radical. Mas o que defendem, na prática, é uma espécie de “capitalismo de rosto humano”, um sistema social e económico que alie certos mecanismos da economia de mercado à preservação e ao aprofundamento dos direitos sociais e políticos dos trabalhadores, um capitalismo que produza bem-estar e o distribua igualitariamente.
Dito de maneira simples: a memória do que foram as sociedades da Suécia ou da Dinamarca – que, aliás, não foram construídas sem lutas sociais importantes – mora hoje com o PCP e com o BE.
Nada contra, bem entendido. E certamente muito melhor do que o revolucionarismo sem revolução que outros teimam em praticar.
Que a postura política desses partidos não mostre, contudo, condições para crescer eleitoralmente, é um facto que só poderá (começar a) ser resolvido no dia em que as direcções desses partidos encetem uma autocrítica e uma reflexão radicais – desta feita no sentido de ir à raiz do problema.
E o PS? Pois, essa é outra questão…
Porque há vida para além das rotineiras “acções de luta”
Embora já tenhamos estado mais convictos de que, em Portugal, se pode fazer mais e melhor, aqui fica um texto que “cola bem” no nosso “post” anterior:
E já que falamos de jovens…
… parece que os de Espanha, inspirados nos (nalguns) de cá, estão a fazer algo (muito?) por aquelas coisas de que já falámos noutros “posts”: resistência colectiva, desobediência civil, etc. etc.
Não há por aí alguém, entre nós, que os queira imitar, desta vez com eficácia e, se não for pedir muito, com ideias e propostas concretas?
Por que é que uma certa esquerda (mas há outra?) tem feito muitos estragos no ensino
Lemos esta prosa de Daniel Oliveira – um blogger e opinador que até nos merece alguma estima – e vemos o retrato do que uma certa esquerda pensa para o ensino em Portugal. Os punhos de renda que o autor da prosa utiliza para se referir ao programa das Novas Oportunidades dizem tudo sobre a sua visão relativamente a uma das mais abjectas fraudes que se instalou no sistema educativo português, por obra e graça da demagogia socratina. Como o dito programa é para os “pobrezinhos”, os “coitadinhos” que, «depois de um dia de trabalho, ainda arranjam forças para ir a uma escola», não se pode denunciar as Novas Oportunidades como aquilo que realmente são: uma mentira na qual não sei quantas centenas ou milhares de inocentes têm caído, para gáudio da máquina propagandística do PS. Daniel Oliveira acrescenta, sem se rir, que essas pessoas «tiram tempo ao seu tempo para aprender um pouco mais».
Mas aprender o quê? A fazer “portefólios” contando histórias da carochinha, os quais, pelos vistos, até podem ser integralmente comprados na Internet?
Estamos todos a brincar?
A complacência de uma certa esquerda – de que Daniel Oliveira é, neste aspecto, um lídimo representante – para com a fraude das Novas Oportunidades reflecte, no fundo, uma posição mais lata (na verdade, cheia de lata). Uma postura segundo a qual é preciso “desconstruir” a autoridade do professor na sala de aula, deixando-o entregue à descontraída indisciplina dos alunos, esses sim, reis e senhores, sobre os quais o ensino tem de estar “centrado” – o que significa abdicar de lhes transmitir saberes (essas coisas chatas) que possam colidir com aquelas magníficas “competências” que eles levam das suas casas para a escola. Etc., etc., etc.
Estas ideias “de esquerda” – adoptadas, aliás, pelo PSD sempre que foi responsável pela pasta da Educação – conduziram-nos ao lindo cenário de guerra em que muitas escolas estão transformadas, à desvalorização completa (cultural e política) do professor, ao abastardamento dos saberes e à produção de fornadas de jovenzinhos debilóides que vão depois engrossar as fileiras dos praticantes das praxes universitárias – tradução troglodítica do que significa hoje frequentar o ensino superior – para mais tarde acabarem a espernear na próxima «geração à rasca», sem perceberem muito bem (porque nunca perceberam nada) o que lhes aconteceu.
Ok, nós sabemos que não foram só as ideias “de esquerda” que nos trouxeram aqui. Diversos outros factores se acumularam para fazer do sistema educativo o rotundo fracasso em que se transformou (com raras e honrosas excepções, que existem e ainda bem). Mas lá que a esquerda à Daniel Oliveira insiste em não aprender com as asneiras cometidas, é um facto que nos parece evidente.
O Estado sou eu
Já nem há o mais pequeno pudor em disfarçar a completa promiscuidade entre organismos do Estado e o Partido Socialista. Quem trabalha nos CNO vê-se assim reduzido à condição de funcionário desse partido.
Com Sócrates, instalou-se a desvergonha absoluta no assalto partidário ao Estado.
Anedota final: é a isto que uma boa parte dos portugueses vai dar o voto no dia 5 de Junho. Perguntinha inocente: podem ser só eles a pagar a “austeridade”?
E não podiam ter colocado isso no vosso programa eleitoral?
O PSD continua errático em matéria de educação. Depois de Passos Coelho ter admitido, quando apertado por Santana Castilho, que seria necessário rever o programa do seu partido na parte relativa à educação, vem agora outro Pedro, o Duarte, proclamar contra a fraude das «Novas Oportunidades», dizendo aquilo que é óbvio para todos os que não estão comprometidos com o negócio.
Dir-se-ia então que já começou a revisão do programa do PSD em matéria de ensino. É que o dito programa está muito longe de ser tão assertivo (como agora se diz) no que toca à treta propagandística das «Novas Opotunidades» e da imensa negociata ligada aos CNO. Limita-se a dizer qualquer coisa vaga como:
«… deverá ainda ser realizada uma avaliação externa e uma reestruturação do Programa Novas Oportunidades, com vista à sua credibilização perante a sociedade civil e à sua melhoria em termos de valorização do capital humano dos portugueses»
Não diz, como devia:
… deverá ser ainda realizada uma avaliação externa apenas para confirmar o que, no fundo, toda a gente já sabe: que o Programa Novas Oportunidades é um sorvedouro de dinheiros públicos para alimentar uma enorme ilusão propagandística, fazendo perder tempo às pessoas que o frequentam, prometendo gato por lebre, equiparando, sob uma cornucópia de diplomas inúteis, escassos conhecimentos de senso comum ao saber arduamente adquirido em anos de frequência de uma escolaridade normal, e reforçando, assim, a pior cultura do facilitismo que conduziu Portugal ao buraco em que hoje está metido. Por tudo isto, é totalmente impossível credibilizar ou manter por mais tempo semelhante fraude, criada à medida e à imagem de José Sócrates, um homem cujo percurso académico é, em si mesmo, a ilustração definitiva da falta de exigência, de seriedade (e, já agora, de vergonha). A única solução será, por conseguinte, o encerramento imediato e definitivo dos CNO, acompanhado da reintrodução de um ensino nocturno ou pós-laboral com uma estrutura curricular e com critérios de rigor e de avaliação idênticos aos que vigoram para o ensino diurno.
Custava assim tanto terem-se lembrado disto? Ou será que, uma vez mais, estamos perante um PSD que fala com várias vozes, sem que nenhuma verdadeiramente se imponha?
Um homem livre
O recente episódio em torno de Santana Castilho – que, assim acreditamos, deve ter tido ontem o seu desfecho – veio demonstrar duas coisas:
– Num PSD cada vez mais labiríntico, Pedro Passos Coelho é um líder que não lidera, é um político impreparadíssimo para o cargo que actualmente ocupa, e é, pelos vistos, alguém em quem não se pode confiar, visto que assume compromissos com pessoas que depois mostra não conseguir honrar. Dar-lhe-emos o benefício da dúvida de pensarmos que não o faz por perversidade ou calculismo – como o pseudo-engenheiro – mas simplesmente por inépcia. E nós ficamos a matutar que, entre uma e outra, venha o diabo e escolha.
– Santana Castilho, em contrapartida, emerge deste episódio como esperávamos que emergisse: com a dignidade e a cabeça levantada de um homem livre.
Não cedeu, não tergiversou, foi acutilante onde tinha de o ser e perante quem tinha de o ouvir.
Ora, numa república apostada em fabricar amanuenses e espinhas dobradas, um homem livre é uma raridade que merece o nosso aplauso e o nosso reconhecimento.
Ensaio sobre a simetria política
PS e PSD ilustram, hoje, as contradições e os limites da deriva oligárquica que se apoderou dos principais partidos da cena política portuguesa. Mas ilustram-no exibindo males diametralmente opostos. Isto é: simétricos um do outro, num espelho que devolve o mesmo, mas invertido.
O PSD é, de há muito, um partido fragmentado por grupos e grupinhos de influência, por “personalidades” ávidas de protagonismo, todas a correr em pista própria e com a faca preparada para apunhalar o colega nas costas. E é um partido estruturalmente incapaz de gerar lideranças fortes. Passos Coelho é só mais um, pronto a ser devorado pela besta partidária, nem mais nem menos patético do que outros que o precederam.
O PS, em contrapartida, é a ilustração deprimente de um partido homogeneizado em torno de um líder que tem tanto de combativo, de teimoso, de profissional do faz-de-conta, como de medíocre, de mentiroso, de falho em quaisquer escrúpulos e de mitómano. Mistura perigosa, sem dúvida. Mas uma mistura à qual se rendeu um partido inteiro, com militantes e dirigentes que já não vêem mais nada a não ser o agarrarem-se ao homem que, apesar de tudo, lhes parece ser o melhor meio para continuarem a chupar a teta das sinecuras.
Votar no PSD é votar num barco caótico, com toda a gente a dar opiniões sobre como orientá-lo, mas sem ninguém no leme.
Votar no PS é votar num barco a afundar-se, com toda a gente a fazer continência ao comandante.
PS: a caminho do descalabro total?
Isto não vai, quase de certeza, acontecer. Até porque haverá sempre alguém, a começar por Cavaco Silva, para dar uma mãozinha ao partido da mesma e levá-lo a habitar o governo do “centrão” que está na forja. Mas, ainda assim, façamos um exercício de imaginação…
… Imaginemos que o PS leva uma tareia no dia 5, isto é: que os eleitores decidem, em cima da hora, penalizá-lo contra todas as sondagens.
O descalabro não poderia ser mais drástico para esse partido. É que a coesão unanimista criada à volta do “grande líder” no último congresso, sendo uma aparente manifestação de força e de determinação – para além de ser também um deprimento espectáculo de curto-circuito da razão crítica -, poderá vir a transformar-se na maior fraqueza do PS. Pela boa e simples razão de que uma massa amorfa, na qual já não resta a mais pequena dissidência inteligente (esqueçam, por favor, esse saco de vento que dá pelo nome de M.M. Carrilho), só pode afundar-se uniformemente e com fragor.
Da mesma maneira que José Sócrates estava disposto a afundar o país só para satisfazer o seu pequenino calculismo eleitoral, também está disposto a afundar o PS só para satisfazer o seu pequenino egocentrismo de dirigente político. «Depois de mim, o dilúvio», poderia ele dizer, a propósito do seu partido. E com razão.
O unanimismo que se gerou em torno de Sócrates significa que não há ninguém com capital de autoridade moral para o substituir, num cenário pós-socratino, e encetar um caminho inteiramente novo. E, mesmo que haja, não tem com ele um único soldado para formar um exército.
Se este fosse só um drama do PS, poderíamos todos dormir descansados. O problema é que isto é um drama de toda uma alternativa política da qual o país necessita desesperadamente.
O país precisa de um partido de governo que tenha a a lucidez e a coragem para contrariar o poder do capitalismo financeiro e para dar todos os passos necessários a uma renegociação da dívida.
O país precisa de um partido de governo que tome essa iniciativa antes de entrarmos numa situação de recessão crónica, de endividamento perpétuo, de desemprego galopante, de destruição total das classes médias, de acentuação ainda maior da miséria dos que já são miseráveis.
O país precisa de um partido de governo que consiga criar pontes com as outras organizações políticas que estariam dispostas a apoiá-lo numa iniciativa como essa.
É muito possível que o PS nunca tenha sido esse partido. Mas sabemos de ciência certa que, neste momento e no futuro próximo, não o é nem o será de todo.
A tragédia (mais do que drama) é que também nenhum dos outros partidos, ou por defeito deliberado ou por insuficiência involuntária, alguma vez o será.
E a isto estamos reduzidos. Sem movimentos sociais com a força de impor uma agenda favorável a quem trabalha e a quem perdeu o trabalho. Sem partidos capazes de bater o pé a Bruxelas e ao FMI.
A caminho do descalabro. Não o do PS. O do país.
Programa do PSD para o ensino: nada de novo na frente ocidental
No essencial, subscrevemos as análises que o Paulo Guinote foi fazendo no seu blogue. Para quem queira ler o original, deixamos também aqui o respectivo link.
Só fica desiludido com as propostas do PSD para o sistema de ensino quem foi suficientemente ingénuo para alimentar ilusões. A nossa ingenuidade não chega a tanto.
Não achamos, por exemplo, minimamente surpreendente que o PSD não pretenda mexer no essencial do modelo de gestão para-despótica que está actualmente em vigor nas escolas, e que, pelo contrário, se prepare para introduzir nos estabelecimentos de ensino o pior dos caciquismos locais. Aqui, como em muitas outras coisas, a governação socratina aplainou-lhe um caminho que o PSD não irá enjeitar.
Também não nos surpreende que nada seja dito no programa do PSD sobre a estrutura e as condições impostas à carreira docente. Como certas omissões são mais eloquentes que muito palavreado, significa isto que o PSD não tenciona alterar uma linha no que toca aos estrangulamentos que se colocam à progressão dos professores. Mas que tem isso de espantoso num partido que vai governar, se tiver a maioria dos votos, com o programa recessivo do FMI?
Pior: a única vez que no programa do PSD se menciona o Estatuto da Carreira Docente é para colocá-lo a reboque do actual modelo de administração escolar, com uma frase sibilina que deixa entrever um cenário perturbante: «Simplificação do Estatuto da Carreira Docente, em articulação com as competências mais extensas dos Directores das Escolas». Percebem o que isto pode querer dizer?
Como o Paulo sublinha, o programa é também eloquentemente omisso no que respeita à forma de colocação dos professores nas escolas. O que aponta para o provável fim dos concursos nacionais, com tudo o que isso implica de aumento da precarização para os contratados, de limites drásticos à mobilidade dos professores, de abertura das escolas à discricionaridade e aos habituais e inconfessáveis interesses privados, tão cultivados na nossa querida cultura.
E o programa é realmente vago no tocante ao modelo de avaliação do desempenho dos docentes, suscitando várias especulações, nenhuma delas benévola: a) quem elaborou o programa não se quer comprometer com ideias concretas para esse modelo de avaliação, esperando para ver em que param as modas; b) os autores do programa do PSD não têm, neste momento, qualquer ideia sobre o assunto; c) o PSD não pretende romper com o essencial das piores práticas que caracterizam o modelo em vigor, mas não se atreve a confessar isso em público.
O programa sugere ainda que o PSD não tenciona travar o processo de reagrupamento das escolas, altamente negativo e perturbador da estabilidade de funcionamento dos estabelecimentos de ensino e de quem lá trabalha.
E, em lugar de devolver ao ensino nocturno a sua dignidade perdida, o PSD parece apostado em prolongar a palhaçada das «Novas Oportunidades», só que desta vez com «credibilização» à mistura. Como se fosse possível «credibilizar» semelhante aborto.
Por fim, há aspectos no programa do PSD que, não sendo inteiramente negativos, deixam mais interrogações do que certezas geradoras de confiança. Um deles é a famosa «avaliação externa das escolas». O linguajar de “economês” com que essa avaliação é apresentada no programa não é de molde a inspirar as melhores expectativas. Feitas as contas, se o PSD tiver oportunidade para aplicar esses princípios, talvez tudo se venha a saldar nos resultados do costume: muita conversa fiada, muitos auto-inquéritos nas escolas promovidos por entidades externas “credenciadas”, para tudo ficar na mesma como a lesma. Os professores (e os alunos) estão marrecos de ver esse filme.
De tudo isto sobra a intenção de generalizar a avaliação nacional no final de cada ciclo, algo que a APEDE também defende na sua proposta alternativa.
É curto, muito curto, para quem pretende substituir o PS no governo.
Mas não é essa, afinal, a consequência de se querer ser Dupont em lugar do Dupond?
Programa (para a Educação) do PSD ou do bloco central?
Numa primeira leitura do programa eleitoral do PSD, e esmiuçando um pouco as suas linhas para a Educação, não é difícil encontrarmos algumas razões para uma séria e fundada preocupação por parte dos professores. Ora atentemos, então, em algumas passagens concretas:
“(…) estabelecimento de uma nova carreira profissionalizada de Director Escolar”
“No modelo de gestão das escolas deve ver-se reforçada a participação das autarquias e da sociedade civil na sua gestão estratégica, pela via do aumento da capacidade de intervenção nos Conselhos Gerais, através de um maior peso nas quotas de representação”
Isto é grave e ainda se torna mais grave quando se articula com isto:
“A selecção do Director deve ocorrer por via de concurso promovido pelo Conselho Geral”
Resumindo: cada vez maior afastamento entre a Direcção executiva da Escola e o corpo docente, crescente menorização do peso e da influência dos professores nos órgãos de gestão, impossibilidade de acesso dos “meros” professores a cargos de gestão executiva, gestão cada vez mais empresarial das escolas, caminho aberto para carreirismos e caciquismos, influência crescente dos municípios na gestão escolar e na escolha do Director com o consequente aumento da promiscuidade entre as escolas e o mundo da política partidária, enfim… tudo exactamente ao contrário do que devia ser feito. Muito preocupante.
Mais à frente pode ler-se ainda:
“A simplificação do Estatuto da Carreira Docente, em articulação com as competências mais extensas dos Directores de Escola”
Aí está o reforço dos poderes dos Directores, pois a um aumento de competências só pode corresponder um aumento de poderes. Se já tinhamos Directores tiranetes, ressoando autoritarismo por todos os poros, que caminho se quer agora aprofundar? O regresso aos antigos reitores? E não adianta lembrar Calvet de Magalhães, pois como esse não se encontram por aí aos pontapés. Não será, seguramente, com “competências mais extensas dos Directores” que se restituirá às escolas a “democraticidade perdida”. E o que significará “a simplificação” do ECD neste contexto?
Entretanto, mais uma “novidade”:
“Consolidação do Processo de Agrupamento de escolas, privilegiando a verticalização pedagógica e organizacional de todos os níveis de ensino”
Isto traduz-se numa coisa muito simples: os Mega-Agrupamentos, com o PSD, são para avançar!
Chegados aqui podemos mesmo começar a perguntar-nos se este é o programa eleitoral do PSD ou se não será já o programa de governo de um eventual futuro bloco central.
Continuando com mais uma (não) novidade:
“especialização dos recursos humanos e das equipas das Direcções Regionais de Educação em funções e projectos que acrescentem valor às escolas e potenciem a redução das assimetrias de desempenho.”
Podemos então concluir que as DRE’s se irão manter. Ora aí está uma oportunidade perdida.
Situação MUITO preocupante: não há uma palavra sobre os concursos de professores. Continuarão a ser concursos nacionais? Assim deveria ser, incluindo-se também nesse concurso nacional as escolas TEIP (algo que errada e injustamente não tem acontecido, dando origem a situações gravíssimas de total desrespeito pela graduação profissional nos concursos). Se cruzarmos este silêncio sobre os concursos de colocação de professores com a intenção de reforçar os poderes dos munícipios na Escola e de alargamento das competências dos Directores é razão para ficarmos muito, mas mesmo muito, preocupados.
E a pergunta é: será que é isto que está no livro de Santana Castilho? Será que Santana Castilho defende isto? Não nos parece.
Será isto que defendem os professores? Certamente que não!
Mas é o que defende o PSD.
P.S. – E, já agora, deixamos uma preocupação/pergunta adicional: o facto de não se encontrar, no programa eleitoral, a posição do PSD sobre a consideração dos resultados da ADD na graduação profissional para efeitos de concurso, significa que é para manter o actual “status quo”? Seria bom alguém colocar essa questão a Passos Coelho. Quem sabe já na próxima 5ª feira.
NOTA FINAL – Constata-se que na redacção do seu programa eleitoral o PSD não observou as novas regras do acordo ortográfico. Aí está uma boa decisão.
De pé atrás
Vamos lá a ver se isto não se vai revelar um dos equívocos e uma das desilusões do ano, quer para os dois protagonistas directamente envolvidos, quer para todos aqueles que depositam esperança na coisa:
Imagem roubada a um entusiasta
Sem vermelho, sem multidão
O título deste “post” é uma piscadela de olho (muito erudita) com isto.
Mas destina-se, sobretudo, a rimar com este “post” de Luís Rainha, que vai ao encontro de muita coisa que temos dito aqui sobre o esvaziamento (o auto-esvaziamento) da nossa esquerda.