APEDE


Ainda as colocações nas TEIP: actualização da história da Rita e da Sara… e outros escândalos!

Posted in Concursos,Contratados e Precariedade,Escolas TEIP,Injustiças por APEDE em 31/08/2011

No post anterior relatámos a história da Rita e da Sara, colegas do mesmo grupo de recrutamento, posicionadas na lista de graduação com cerca de mil lugares de diferença. Vamos então actualizar a situação face aos resultados dos concursos conhecidos hoje. Tal como tinhamos previsto, as férias da Sara foram descansadas, não passou pelo stress e pela angústia desta manhã e início de tarde, não teve de fazer as malas, não precisou de ir à secretaria solicitar a declaração para o Centro de Emprego. Ela já sabia que iria correr tudo bem. E correu. Acabou de aceitar a renovação do seu contrato na escola TEIP onde leccionava. Naturalmente, trata-se de um horário COMPLETO. São 22 horas e a garantia de continuidade nos próximos anos, se nada se alterar e este escândalo se mantiver.

E a Rita? A Rita já sabia que não iria renovar o seu contrato na escola onde leccionara em 2010/11. E não renovou. Acabou colocada noutra escola, mais distante, com um horário de 18 horas. Vai perder tempo de serviço, remuneração e não poderá renovar contrato.

Recorde-se: a Sara lecciona há 2 anos e uns meses. A Rita lecciona há 11 anos. A Sara está atrás da Rita cerca de 1000 lugares na lista de graduação! Repetimos: Mil lugares!!! Mais palavras para quê??!

Vamos deixar a triste história da Rita e da afortunada Sara (ambas classificadas com Excelente, note-se) e passemos a outros escândalos.

Como todos sabem, neste concurso, os horários completos para contratados não abundaram. Com excepção das TEIP. Aí a vida continuou a sorrir para muitos colegas, através dos tais critérios “feitos à medida”. Vamos a casos concretos, pois as situações têm mais força quando se referem casos concretos, sem com isto pretendermos fazer qualquer “caça às bruxas”, repetindo que não são os colegas que estão em causa, nem a qualidade do seu desempenho profissional mas sim os critérios de selecção e o erro crasso do ME em ter impedido os contratados de concorrerem para as TEIP, em devido tempo (2009). Voltando às situações concretas, importa referir também que as listas de colocação são públicas, qualquer professor as pode analisar. Foi só isso que fizemos. E não precisamos de procurar muito para termos a confirmação plena do que referimos no post anterior.

Vejamos o caso do grupo 520 (apenas como exemplo do que se passou, certamente, em muito dos restantes grupos): o último horário completo foi atribuído ao candidato com o número de ordem 551 (e é preciso frisar que muitos colegas colocados com número de ordem inferior, ou seja, com melhor graduação, não tiveram horário completo). No entanto, diversos candidatos com números de ordem superior a 1200, e até 1500 ou, pasme-se, cerca do 1700, que NÃO foram colocados neste concurso, acabaram de aceitar, com toda a tranquilidade, horários COMPLETOS (22 horas) nas escolas TEIP onde leccionaram em 2010/11. Mais palavras para quê??!

 Absolutamente inaceitável! Voltamos a frisar que não está em causa a qualidade do desempenho destes colegas, mas não podemos nem jamais admitiremos que os outros, posicionados muito, mas mesmo muito, acima na lista graduada (e com bastante mais tempo de serviço) não sejam também bons professores e, acima de tudo, fiquem impedidos de concorrer em condições de maior igualdade com os colegas agora “automaticamente” reconduzidos por critérios absolutamente blindados.

Fica ainda mais um pormenor tristemente caricato quanto aos resultados deste concurso: nas colocações do referido grupo de recrutamento, alguns colegas posicionados no topo da lista (entre os 20 primeiros), provavelmente preocupados com as notícias que apontavam para uma verdadeira hecatombe e um alastrar do desemprego docente (facto que, infelizmente, se confirmou em grande medida),  concorreram também a horários do intervalo 3 (12 a 17 horas). Deste modo, acabaram colocados (provavelmente na zona que desejavam, admitimos) mas com horários de 17 e 12 horas. Nas TEIP, 1600 lugares depois… os horários são todos completos, com 22 horas. Há aqui qualquer coisa que não bate certo. Definitivamente! É fundamental, é urgente, que esta situação seja corrigida e alterada, e faz todo o sentido exigir que, num próximo concurso para TEIP, todos os professores possam concorrer com respeito pela sua graduação profissional. E até admitimos que, a partir dessa hipótese dada a todos, no que seria um ano zero, os critérios de desempate, nos anos seguintes, possam privilegiar quem pretenda continuar e tenha tido um bom desempenho.

Colocações nas escolas TEIP: injustiças que urge denunciar e corrigir!

Posted in Concursos,Contratados e Precariedade,Escolas TEIP,Injustiças por APEDE em 23/08/2011

Num ano em que largos milhares de contratados, em muitos casos com mais de 10 anos de serviço, poderão sentir na pele o espectro e a realidade do desemprego, ou a quase certeza de horários incompletos, é preciso que se diga que para alguns, com muito menos anos de serviço, e com graduação profissional muitíssimo inferior, tudo está no melhor dos mundos e a renovação de contrato (nas escolas TEIP) mais que garantida, tendo mesmo partido para férias com essa absoluta (e tranquilizante) certeza no bolso. São situações de flagrante injustiça que nos levam a considerar urgente e inadiável uma alteração nas regras de concurso/critérios de selecção nas TEIP ou, pura e simplesmente, a sua inclusão nos concursos nacionais para satisfação das habituais (e falsamente rotuladas) necessidades “residuais”.

Para melhor compreensão do que afirmamos, relatamos de seguida uma história concreta, que é apenas um caso entre tantas e tantas situações idênticas que urge denunciar e corrigir:

A Rita e a Sara tiraram ambas o mesmo curso, com médias finais muito semelhantes. A Rita tem 34 anos e a Sara 29. A Rita terminou o curso há 11 anos e a Sara apenas há 6. A Rita começou a leccionar assim que acabou o curso e, mesmo tendo que saltitar de escola para escola, foi sendo sempre colocada, nos últimos anos com horário completo. A sua graduação profissional ultrapassa os 21 valores. A Sara não conseguiu colocação, nem sequer em substituições, nos primeiros anos pós-licenciatura. No final do ano lectivo 2008-09 conseguiu, finalmente, uma substituição por alguns meses, passando assim a concorrer em primeira prioridade. Logo no ano seguinte, em Setembro, em oferta de escola, e já após os concursos nacionais (necessidades residuais) – onde não foi colocada – acabou por conseguir um horário completo, numa escola TEIP. Tinha poucos meses de serviço e uma graduação profissional muito, mas mesmo muito, inferior à da Rita. No ano seguinte, precisamente por estar numa escola TEIP, o seu contrato foi renovado, e garantido previamente, através do 1º critério de selecção de 99% das TEIP: “docente que tenha leccionado no Agrupamento no ano lectivo anterior”. A graduação profissional vem quase sempre no final da lista. A Sara foi para férias absolutamente descansada, pois já lhe tinha sido comunicada a decisão de renovação. Tinha 1 ano e alguns meses de serviço. Naturalmente, na abertura dos concursos (oferta de escola) para TEIP, concorreu à mesma escola e através do tal critério de selecção o seu contrato foi tranquilamente renovado. O mesmo vai acontecer este ano. O mesmo irá acontecer no próximo ano, e no próximo, e no próximo ainda. E irá acontecer enquanto o Director da escola puder decidir qual é o critério de selecção dos professores. E enquanto a Sara quiser renovar. Nem a reorganização curricular, deste ano, a atingiu. Para ela continuou a haver horário. Vai para o 3º ano com horário completo. Começou com apenas alguns meses de serviço e sem qualquer experiência prévia em escolas TEIP.

Agora vamos ver o que aconteceu à Rita.

No ano em que a Sara foi colocada na escola TEIP, pela primeira vez (2009-10), a Rita (e outros milhares de contratados como a Rita) foram IMPEDIDOS de concorrer às TEIP. O concurso para as escolas TEIP, no final do ano lectivo anterior, foi apenas para afectação a quadro e só os QZP ou QE é que puderam concorrer. O argumento do ME era a necessidade de dotar essas escolas de profissionais bastante experientes. Ora a verdade é que muitas dessas vagas ficaram por ocupar, pois muitos dos mais experientes (QZP e QE) optaram por não concorrer para as TEIP e os contratados, como a Rita, foram IMPEDIDOS de o  fazer. Por este motivo, os horários sobrantes (e foram muitos) tiveram de ser sujeitos a oferta de escola, em data posterior às colocações para necessidades residuais (conhecidas a 31 de Agosto). Obviamente, a Rita já tinha concorrido, como habitualmente, e foi colocada a 31 de Agosto. As ofertas de escola para as TEIP só surgiram depois disso, em Setembro, e a Rita já tinha entretanto sido colocada numa escola não-TEIP.

Dois anos volvidos, a Sara soube, em Julho último, que ia continuar a leccionar na mesma escola TEIP, onde está há dois anos. Não foi grande novidade, pois já esperava por isso. Foi de férias absolutamente tranquila. Recorde-se: a Sara tem apenas 2 anos e alguns meses de serviço.

A Rita soube, também em Julho passado, que não teria qualquer hipótese de renovar contrato na sua escola, pelos efeitos da recente reorganização curricular e pela indefinição face ao arranque de turmas EFA. Enfrenta, talvez como nunca, o espectro do desemprego. Muito dificilmente terá um horário completo. Mas tem muito mais anos de serviço do que a Sara e uma graduação profissional muito superior. Na lista de graduação do seu grupo de recrutamento, que é o mesmo, a Rita está cerca de 1300 lugares à frente da Sara. Azar dos azares: há poucos anos atrás deu aulas numa escola que hoje é TEIP, tendo portanto experiência profissional, conhecimento do meio e das  problemáticas que envolvem os alunos destas escolas.

A Rita não teve sorte.

A Sara (após uns primeiros anos sem colocação) teve a sorte do ME só querer nas TEIP professores muito experientes, professores dos quadros. Mas depois, em Setembro, com inúmeros horários por preencher, já puderam concorrer os menos experientes. E mesmo os que não tinham experiência nenhuma. Por isso (e dado que a maioria dos contratados, com mais anos de serviço, obteve colocação a 31 de Agosto – caso da Rita), a Sara conseguiu ficar numa TEIP, em oferta de escola. Com apenas uns meses de serviço.

Ambas foram avaliadas neste ano lectivo (2010-11). Ambas tiveram Excelente (num modelo de ADD que surgiu para distinguir o mérito, correcto??!) 🙂 Como é óbvio, não duvidamos da qualidade, dedicação e empenho profissional das colegas. Não é isso que está em causa. Mas a verdade é que, ironia das ironias, a Rita corre o risco de ficar desempregada, ou ter apenas um horário incompleto, exactamente no ano em que,  farta de se ver ultrapassada por colegas “asteriscados”, solicitou avaliação completa e obteve um Excelente- que perfeita e irónica distinção do mérito confere este sério e justo (??!) modelo de ADD. Ao fim de vários anos, em que não teve necessidade de o fazer, voltou a concorrer a todo o país. Recorde-se: a Rita dá aulas há 11 anos. A Sara, apenas com 2 anos e alguns meses, e cerca de 1300 lugares atrás da Rita na lista de graduação, tem a renovação de contrato garantida, com horário completo, como já teve o ano passado, e como terá nos próximos, graças aos critérios de selecção feitos à medida. Teve sorte. Muita sorte mesmo. Ficou colocada numa TEIP e na altura exacta.

Agora imaginem o que poderá acontecer quando (e se) acabarem os concursos nacionais e for tudo decidido pelos senhores directores ou pelas autarquias.

NOTA: A situação que aqui descrevemos é verídica e absolutamente factual, excepção feita aos nomes das colegas.

A armadilha em que nos deixámos cair

Posted in (Des)avaliação,Contra o pensamento único por APEDE em 19/08/2011

Com a sua contundência habitual – aquela que torna altamente improvável que algum político do centrão o venha a convidar para ministro -, Santana Castilho abordou, nesta sua última crónica, um tema essencial: o vínculo profundo que liga o conceito de avaliação do desempenho a um modelo despótico de gestão que a ideologia neoliberal dominante transferiu do mundo empresarial, onde nasceu, para universos laborais e institucionais originalmente orientados para a prestação de serviços sociais cujo fim último não é (não deveria ser) a produção de lucros com vista à acumulação de capital.

No território das empresas, a avaliação do desempenho tem sido um notável mecanismo de coerção sobre os trabalhadores, dominados pelo jugo das metas e dos objectivos de produção. Muitas vezes arbitrariamente definidas e impossíveis de atingir, essas bitolas são, ainda assim, impostas como forma de manter quem trabalha sob a pressão permanente do patamar inalcançável. Inculcada a ideologia do sucesso, supostamente quantificável e mensurável à luz dos ditos objectivos e metas, a impossibilidade de as realizar é vivida pelo trabalhador como fracasso pessoal e como culpa. No quotidiano despótico das empresas, a violência destes dispositivos de poder tem conduzido a um aumento exponencial das doenças nervosas e até das taxas de suicídio, particularmente obscenas em casos que foram denunciados no país de Sarkozy.

Já o dissemos antes e agora repetimo-lo, movidos pelo texto de Santana Castilho: a introdução deste conceito de avaliação para aferir a qualidade do desempenho docente, feita pela mão de José Sócrates e Maria de Lurdes Rodrigues, e agora retomada por Nuno Crato, veio inscrever no exercício da profissão de professor o pior das estratégias de poder e de submissão usadas nas empresas.

E o erro fatal em que os professores – bem como os seus representantes sindicais – se deixaram cair foi precisamente o de aceitarem a inevitabilidade desta ideia de avaliação, como se de uma evidência se tratasse para a qual não haveria alternativa credível. Fragilizados perante a propaganda anti-docente montada pelos agentes do governo e pelos serventuários que regurgitam o que passa por opinião pública, os professores – todos nós – caíram na armadilha e cederam à chantagem. Capitularam face à imposição de um modelo de avaliação por «metas e objectivos», com receio de que a “opinião pública” pensasse que, afinal, os professores não queriam ser avaliados – o que, hoje em dia, parece quase um crime anti-social.

Divergir do rebanho traz sempre os seus riscos. Mas também acarreta as suas recompensas, às vezes inesperadas. Talvez tenha chegado o tempo de afirmar muito claramente, sem medo de escandalizar os nossos queridos conterrâneos, que, se a avaliação é esta coacção imbecil, então os professores não querem mesmo ser avaliados.

Temos mesmo de falar disto? (Parte 4)

Posted in (Des)avaliação por APEDE em 18/08/2011

E pronto. A páginas tantas do projecto de ADD apresentado pelo governo, lá tropeçamos no artigo 20.º

Não vamos acrescentar grande coisa ao muito que já se protestou contra toda a casta de assimetrias e de injustiças que esse artigo introduz entre professores. É claro que isto significa, de facto, reintroduzir pela porta baixa a distinção entre titulares e não-titulares que se julgava atirada pela janela fora. E está-se mesmo a ver que isto é feito para calar as vozes mais contestatárias que, por acaso ou não, habitam maioritariamente os professores dos escalões agora prometidos às delícias de uma isenção futura. Ao mesmo tempo que, pelo caminho, se poupa algum dinheirinho em conformidade com os ditames da “troika” & Co.

Mas, em abono da coerência, importa também dizer que, para nós, não faz muito sentido reclamar que este péssimo modelo de avaliação seja alargado a todos os professores em nome do bonito imperativo da igualdade. Não somos defensores do princípio: «é mau, mas tem de tocar a todos». Defendemos, isso sim, que um modelo simplificado de avaliação, conforme a desígnios de sanidade mental, seja aplicado a todos os professores sem excepção.

Portanto, o que está mal não é (só) o artigo 20.º É todo o projecto a que ele pertence! E esse é que tem de ser removido de uma vez por todas.

Temos mesmo de falar disto? (Parte 3)

Posted in (Des)avaliação por APEDE em 18/08/2011

Pois, a «avaliação externa» (n.º 3 do artigo 7.º) e o «avaliador externo» (artigo 13.º).

É tema que nos excita pouco. A sua discussão seria interessante se estivéssemos a falar de um modelo de avaliação totalmente despido da pedagogice dominante e da ideologia neoliberal que, subrepticiamente, a sustenta (assunto a que voltaremos noutro “post”).

Mas pronto. Lá tem de ser. Vamos dizer qualquer coisa.

O «avaliador externo» tem o mérito (chamemos-lhe assim) de resolver uma certa quadratura do círculo: subtrai-se a observação das aulas a todos os vícios inerentes à avaliação feita por “pares”, sem que, ao mesmo tempo, aquela deixe de ser realizada por professores que leccionam a disciplina do avaliado.

Até aqui, tudo bem. Mas está-se mesmo a ver que muita tinta, e muito “sangue” argumentativo, ainda vão correr a propósito dos critérios com que serão constituídas as «bolsas de avaliadores» às quais será entregue a «avaliação externa». E se essas bolsas forem compostas por professores «dispensados de avaliação» (artigo 20.º), então é que vai ser realmente “giro”!

Nota final sobre este ponto, apenas para sublinhar como a ideia de «avaliação externa», presente nesta proposta de modelo de ADD, está longe do que deveria ser uma avaliação externa efectivamente digna desse nome: uma avaliação global da actividade e dos resultados de um dado estabelecimento de ensino, conduzida por membros idóneos do Ministério da Educação, e que se deveria destinar à identificação e correcção de dificuldades ou actuações claramente inadequadas, bem como à divulgação de boas práticas observadas na dita escola. Sem qualquer cunho punitivo ou persecutório, claro está!

Temos mesmo de falar disto? (Parte 2)

Posted in (Des)avaliação por APEDE em 18/08/2011

Vários comentadores da blogosfera docente têm posto o dedo numa ferida fundamental, que vicia o novo (ou qualquer outro) modelo de ADD: o facto de a avaliação dos professores se dar no quadro de uma administração escolar autocrática e tendencialmente despótica.

Na verdade, o modelo agora proposto inscreve-se nos mecanismos de distribuição altamente desigual de poder no interior das escolas. Desde logo, o Director aparece (de novo) a concentrar o essencial das decisões em matéria de avaliação dos docentes, incluindo o que toca ao desempenho dos avaliadores, coordenadores e membros dos órgãos de gestão – o que significa que alguns dos «isentos» de avaliação (assunto a que regressaremos, claro!) serão avaliados pelo senhor Director sempre que exercerem cargos. Vai ser giro ver muitos dos «isentos» a fugirem desses cargos como o diabo da cruz! [Nota (completamente irrelevante) à margem: é um bocado esquisito que a referência à avaliação dos detentores de cargos surja no artigo 4.º, relativo às dimensões da avaliação, quando releva do artigo 10.º, respeitante às competências do Director, mas enfim…]

É verdade que este projecto de ADD introduz, no contexto das relações de poder entre os órgãos de gestão escolar, uns mui liberais “checks and balances”, quando concede ao Presidente do Conselho Geral a função de última reserva em caso de recurso interposto pelo professor avaliado. Sabendo nós que nalgumas escolas existem guerrilhas internas entre o Conselho Geral e a Direcção, vai ser igualmente divertido assistir às previsíveis refregas que esta atribuição vai alimentar…

Quanto às competências do Conselho Pedagógico e da sua Secção de Avaliação (note-se a tendência do novo documento para mudar os nomes a moscas já existentes), falta-nos francamente a pachorra para as analisar em detalhe. Limitamo-nos a constatar que elas complicam o que deveria ser simples e que reforçam a tendência orgástica de alguns pobres de espírito, a quem a lei confere poder nos estabelecimentos de ensino, para se desdobrarem na tal papelada inútil e na bizantinice conceptual que sempre encontra poiso em«parâmetros», «documentos de registo» e outras vacuidades pomposas.

Temos mesmo de falar disto? (Parte 1)

Posted in (Des)avaliação por APEDE em 18/08/2011

A pedido de muitas famílias e dos nossos milhares de admiradores, cá vamos proceder ao supremo frete de comentar o último modelo (ainda proposta) de ADD perpetrado pelo Ministério.

Primeira constatação global: o modelo agora apresentado é, no essencial, mais do mesmo. «Simplex 3», como vários lhe andam a chamar, e com toda a razão.

Na verdade, mantém-se tudo o que se relaciona com o preenchimento de papeladas parvas e escusadas (mesmo que, nalguns casos, alegadamente confinadas a poucas páginas), como o «Projecto docente» ou o «relatório de auto-avaliação» – sendo o conceito de auto-avaliação uma das cretinices mais irritantes que medraram na pedagogice dominante para nela depositarem os seus ovos asininos. A isto se junta, claro está, o inevitável cortejo de documentos «de registo». Com a agravante de que, agora, cada Conselho Pedagógico de cada escola poderá aprovar o que lhe der na alma. E como nós sabemos a quantidade de imbecilidade “pedagógica” que habita as almas de muitos dos rabinhos sentados nesses Conselhos, é certa e garantida a “criatividade” que fará proliferar tais documentos.  

Mas vejamos a “coisa” mais de perto.

Dimensões da avaliação (artigo 4.º): «a) Científica e pedagógica; b) Participação na escola e relação com a comunidade; c) Formação contínua e desenvolvimento profissional». Alguém consegue lobrigar aqui alguma diferença em relação ao modelo em vigor? Atente-se no conteúdo da alínea b. Não basta avaliar o professor naquilo que deveria ser considerado o cerne da sua actividade: o conhecimento científico e a capacidade de o transmitir. Não, mil vezes não! Também é preciso que o professor seja um palhaço-para-todo-o-serviço, sempre disponível para os mais diversos e ocos floreados em que invariavelmente se traduz a «participação na escola» e a «relação com a comunidade»! Escolas há cujos conselhos pedagógicos entenderam incluir, nas metas e objectivos, que os professores andassem a fazer publicidade da escola junto da «comunidade»! E ai de quem não cumprisse tão imperioso objectivo!

E, por falar em «metas e objectivos», vejamos o artigo 6.º da proposta de “nova” ADD, aquele que determina os «elementos de referência da avaliação». São três.

O primeiro compreende os «objectivos e metas [cá está!] fixadas no projecto educativo do agrupamento de escolas ou da escola não agrupada». Pelo exemplo acima referido, a que se poderia juntar um oceano de inanidades, está-se mesmo a ver todo o género de grandiosos propósitos que as escolas, com os seus esclarecidos Conselhos Pedagógicos, irão arvorar. Impacto sobre a qualidade do ensino? Nulo. Horas infernais de chatice para os professores? Garantidas.

É claro que este primeiro «elemento de referência» para a ADD tem de arrastar consigo um outro, o segundo: «os parâmetros estabelecidos para cada uma das dimensões aprovados pelo Conselho Pedagógico». É aqui que se irá manifestar toda a criatividade “eduquesa” a que nos referimos atrás. É que há pessoas, com assento nos Conselhos Pedagógicos, para as quais inventar «parâmetros» é o equivalente a uma refeição no Tours d’Argent ou, quem sabe, a uma noite passada na companhia de Beyoncé ou de George Clooney (conforme os gostos)…

Como se tanto «objectivo», «meta» e «parâmetro» não bastasse, eis que o artigo 6.º ainda vem acrescentar um terceiro «elemento de referência»: «os parâmetros estabelecidos a nível nacional para a avaliação externa por órgão a designar». Não fazemos a mínima ideia que órgão será esse, quem o irá compor, com que critérios essa composição será decidida, etc. etc. Mas podemos apostar em como os ditos «parâmetros» sairão de cabecinhas formatadas pela pedagogice da Bosta de Boston.

Para quem, como Nuno Crato, se afirmou como paladino da luta contra o domínio do «eduquês» no sistema de ensino, não há dúvida de que pode limpar as mãos a este «Projecto de Avaliação do Desempenho Docente»…

Nota prévia sobre a avaliação dos professores

Posted in ADD por APEDE em 18/08/2011

O professor é assíduo e pontual, tanto em relação às aulas como em relação às reuniões para as quais é convocado (ou que combina informalmente com os colegas)?

O professor cumpre o programa e as planificações acordadas no seio do seu grupo disciplinar, conforme se pode constatar a partir dos sumários das suas lições?

O professor avalia os alunos através de testes ou de trabalhos que reflectem os conteúdos programáticos e as planificações estabelecidas?

O professor entrega, atempadamente, as classificações aos directores de turma de modo a que estes não tenham de andar a correr atrás dele sempre que precisam de preparar as reuniões de avaliação?

O professor fornece ao coordenador do seu departamento – ou ao seu delegado de grupo – os testes e materiais que utiliza nas aulas?

O professor colabora com os colegas do seu departamento ou grupo nas planificações e na elaboração de materiais ou de testes, sempre que haja condições para esse trabalho de intercâmbio, e não está simplesmente encostado aos colegas, à espera de que sejam eles a fazer tudo para depois abocanhar o trabalho dos outros?

Não há discrepâncias demasiado gritantes entre as classificações que o professor atribuiu aos alunos no decurso dos três períodos?

Não há discrepâncias, demasiado óbvias e gerais, entre o aproveitamento obtido pelas turmas a que o professor lecciona e o aproveitamento alcançado em anos anteriores?

Não há casos, conhecidos e escancarados, de incompetência do professor em matéria de controlo da disciplina em sala de aula?

Então qual é o problema de, com base nestes indicadores acessíveis a qualquer coordenador de departamento, atribuir a classificação de Bom a um professor sem ser, para isso, necessário recorrer a porta-folhas, a “instrumentos de registo” e a outras papeladas identicamente idiotas?

Não é isto lógico, simples e linear, dispensando toda a tralha da definição de objectivos individuais – agora rebaptizados como «Projecto docente» – ou a treta da «auto-avaliação»? Isto é tão fácil que até poderia ser feito anualmente!

Quem preenchesse as exigências inerentes a estes indicadores – que não precisariam de ser (por amor da santa!) desdobrados em micro-objectivos – teria imediatamente assegurada a classificação de Bom. Quem mostrasse estar clamorosamente aquém do exigido teria classificação de Regular ou de Insuficiente. E quem quisesse aceder às classificações de Muito Bom ou Excelente teria de mostrar algo mais do seu trabalho – e que poderia passar, sim, por aulas assistidas, mas não previamente cozinhadas entre avaliador e avaliado.

Por que raio é que tudo isto há-de estar previamente inquinado pela pedadogice parva que insiste em contaminar tudo o que releva da avaliação dos professores (e dos alunos)?

Verão quente de 2011 ou o mal-estar da civilização

Posted in As revoluções não começam assim por APEDE em 18/08/2011

E, de repente, o Verão do nosso descontentamento (entre o frio e o morno) resolveu aquecer por terras de sua majestade.

Quando publicámos o último “post”, à volta da genial canção de Jarvis Cocker, estávamos longe de pensar que íamos, ao mesmo tempo, acertar na “mouche” e falhar o alvo.

É que a letra de Cocker parece, em determinadas passagens, articular-se muito bem com o que aconteceu, quando, noutras, remete para uma “consciência de luta” (ou “consciência de classe”) que tudo indica ter primado pela ausência nos acontecimentos deste Verão londrino.

Por um lado, a canção fala de um “raid” e do desejo de aceder a um padrão de vida de que os “misfits” se sentem excluídos:

“We want your homes, we want your lives, we want the things that you won’t allow us.”

Mas, como alguns comentadores lucidamente observaram, é justamente essa identificação com o modelo de vida, consumista e ostentatório, das classes “afluentes” que retira à violência protagonizada pelos bandos de jovens dos “bas-fonds” londrinos qualquer potencial socialmente transformador e emancipatório. Estamos a anos-luz do tipo de força na qual Cocker investia as suas esperanças:

“We won’t use guns, we won’t use bombs, we’ll use the one thing we’ve got more of – that’s our minds.”

Acontece que Cocker, e vários outros cultores da pop britânica de sentido verrinosamente crítico que pertencem à sua geração, veio precisamente de um meio social que, sendo baixo, pôde ainda beneficiar do acesso a um ensino público que permitia abrir os olhos a muita gente:

“We learned too much at school now we can’t help but see that the future that you’ve got mapped out is nothing much to shout about.”

Contrariamente ao que pretenderam os críticos da Escola Pública dos anos 60 e 70, que insistiam em ver nela um mero aparelho de poder ao serviço da inculcação da ideologia dominante, a canção de Cocker mostra que a passagem pela escola pôde ser, para muitos dos que nasciam nas classes sociais “erradas”, a condição para a construção de uma consciência crítica, capaz de questionar, de desafiar e de superar os mapas impostos por essa ideologia.

Em grande medida, o desmantelamento no Reino Unido das infra-estruturas de apoio aos grupos mais desfavorecidos, a começar pelo acesso a um ensino tendencialmente gratuito, não só pôs fim a experiências pop como o grupo de Jarvis Cocker – uma pop impregnada de crítica social e de “consciência de classe” –  como, sobretudo, produziu nos subúrbios das grandes cidades massas de jovens destituídos de perspectivas de futuro, condenados ao desemprego estrutural e desprovidos, nas suas cabeças, do mais pequeno vestígio de crítica contra-hegemónica ou anti-sistémica. Incapazes, portanto, de ser portadores de qualquer alternativa digna desse nome.

Engrossando as fileiras de um “lumpen-proletariado” que não cessa de crescer, a violência protagonizada por esses jovens acontece de uma forma espasmódica, dispersa, catártica e sempre volátil e inconsequente, oleada por uma testosterona que tem de desaguar para algum lado.

 

 Sintomático é que, na Londres de 2011 como em Paris de 2005, o confronto com as autoridades e a expansão de uma violência rapidamente generalizada tenha sido despoletada por episódios de abuso policial – “detalhe” não propriamente negligenciável e que revela os abismos de tensão social a que se chegou.

Mas o mais deprimente é constatar o total vazio ideológico – ou simplesmente cognitivo – que anima esta violência. Os jovens que partiram montras e arrombaram lojas para pilhar televisores e roupas de marca, os jovens que incendiaram carros e destruíram casas das suas próprias zonas de residência, os jovens que agrediram vizinhos e que, quando descendentes de imigrantes, atacaram membros dos seus próprios grupos étnicos ou de grupos afins, representam o paradoxal triunfo da tal ideologia dominante: ataca-se o que está mais à mão, nem que seja o sítio onde se dorme, e o consumismo como forma de vida não é minimamente posto em causa – é apenas objecto de desejo e de inveja. Pode o oprimido espelhar melhor os valores do opressor?

É provável que estejamos perante uma “luta de classes” que não ousa dizer o seu nome. Mas trata-se de uma luta reduzida ao grau zero da consciência política. Luta esquálida, linear e nua, entre os que têm e os que querem ter o que os outros têm – sem que a estrutura de poder inerente aos objectos possuídos e à sua distribuição seja minimamente interrogada. 

A revolução, de facto, não passa por aqui.

 


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