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O Natal do nosso descontentamento

Posted in Ai Portugal por APEDE em 20/12/2011

Para a restauração dos três “ff”: Fado, Futebol e Fátima

Posted in Ai Portugal por APEDE em 27/11/2011

Já tínhamos os três pastorinhos devidamente beatificados.

O futebol também já tinha a beatificação das massas.

Só faltava o faduncho. Pronto: já cá canta!

“Levados, levados, sim!…”

 

Ainda o “day after”

Posted in Ai Portugal por APEDE em 26/11/2011

O Estado-esmoleiro num país de mão estendida

Posted in Ai Portugal por APEDE em 26/11/2011

Estando hoje a decorrer mais um campanha do Banco Alimentar contra a fome, pensamos como é cada vez mais pertinente a caracterização que o sociólogo Boaventura de Sousa Santos faz de Portugal: uma país onde um Estado-Providência anémico teve sempre de ser compensado por uma «sociedade-providência» de ajudas ou de socorros mútuos. Acontece que o governo actual, ao serviço de predadores e de usurários, está empenhado em demolir o pouco que ainda resta dessa rede de protecção social garantida pelas solidariedades entre vizinhos ou no seio de famílias urbanas que dispõem da sua courela como pequeno «banco alimentar».

Seja como for, a lógica da esmola está a impor-se. E, como se vê, já está a atingir as instituições do Ensino Superior:

Cortes levam universidades a apostar em donativos de alunos.

Fim de ciclo

Posted in Ai Portugal por APEDE em 20/10/2011

Podemos sempre invocar as causas externas do desastre social que estamos a viver. Podemos dizer que as políticas europeias estão a conduzir a Europa para uma queda sem fim num abismo ao qual é sempre possível acrescentar mais uns metros. Podemos acusar os seguidores domésticos das receitas do FMI de nada terem aprendido com as catástrofes latino-americanas e africanas que tais receitas geraram.

Podemos (e devemos) fazer tudo isso. Mas o que não podemos é ignorar o que a tremenda crise actual revela sobre o nosso país.

Estamos a chegar ao fim de um ciclo. Um ciclo que foi parcialmente aberto com o 25 de Abril de 1974, mas que teve o seu verdadeiro início no 25 de Novembro do ano seguinte. Encerrando o breve, mas intenso, período experimental da luta de classes de onde resultaram as conquistas básicas do nosso «Estado social»,  0 25 de Novembro de 1975 criou as condições para a estabilização do sistema que vigorou até agora:

– No plano político, uma democracia representativa, dita “liberal”, dominada por partidos oligarquizados e clientelares, dos quais dois (PS e PSD, por vezes em arranjos com o CDS) se alternam na partilha das sinecuras do Estado e no serviço dos grandes grupos económicos, a par de uma esquerda institucionalizada, sobretudo empenhada em preservar os seus nichos de representação parlamentar e de controlo nalgumas autarquias, e em manter o domínio sobre as direcções dos principais sindicatos.

– No plano económico, a manutenção dos mesmos de sempre – as poucas famílias que há muito vêm dominando a economia nacional – à frente de sectores tradicionalmente associados a monopólios protegidos da concorrência, deixando para as pequenas e médias empresas, quase sempre à margem da inovação tecnológica, a tarefa de criar os tais «bens transaccionáveis». Corolário deste modelo: a aposta nos baixos salários como único factor «competitivo».

37 anos de democracia não alteraram o padrão estrutural acima descrito. Pelo contrário: agravaram-no. A entrada na União Europeia – então ainda designada como CEE – e o posterior ingresso na zona euro só vieram dispensar os nossos governantes, as nossas “elites” políticas e económicas, da necessidade de efectuar as rupturas que se impunham para acedermos a uma social-democracia sustentada e sustentável. Seguindo uma tradição histórica que, em Portugal, é multissecular, as oportunidades que então surgiram foram sistematicamente desperdiçadas por essas “elites” ignaras e indolentes: os fundos estruturais europeus perderam-se num mar de oportunismos estéreis e de corrupção galopante, servindo, quando muito, para alimentar a indústria do betão. Nada se fez de molde a reformar o nosso tecido produtivo e o nosso modelo industrial; desmantelou-se a agricultura para fazer crescer, em seu lugar, uma imensa mancha florestal de eucalipto destinada à pasta de papel e aos incêndios de Verão (uma novidade  das últimas décadas), enquanto se estimulou o crescimento exponencial dos mega-retalhos, assentes na importação dos bens alimentares que deixámos de produzir.

A adopção do euro acentuou, como hoje se percebe, todas as nossas insuficiências. Privados de soberania monetária, tornámo-nos ainda menos competitivos nas exportações – a tal panaceia a que hoje se agarram os tristes governantes que nos couberam no azar. Em contrapartida, tivemos acesso fácil ao crédito, à conta de taxas de juro baixas. O resultado está à vista: um endividamento em cadeia, com o sector financeiro a hipertrofiar e a endividar-se junto da banca estrangeira para alimentar os vícios que criou numa pequena burguesia suburbana, repentinamente rendida às maravilhas de um consumo para o qual não dispunha, de facto, de bases financeiras reais. Com a multiplicação do dinheiro de plástico – puramente virtual – e do crédito fácil, muitos portugueses – há que reconhecê-lo – passaram a viver acima das suas possibilidades. Foram a isso induzidos. Na verdade, foram assediados por cantos de sereia constantes. A banca não cessou de engordar por fora – e de se endividar por dentro. A bolha do mercado imobiliário inchou até ao mais que previsível estouro.

O essencial de tudo isto não aconteceu na era de José Sócrates, ao contrário do que alguns amnésicos gostam de insistir. Aconteceu nas décadas em que Cavaco Silva e António Guterres foram primeiros-ministros. Esse foi o período das oportunidades perdidas. E foi também o período das escolhas desastrosamente erradas cujos efeitos agora nos caem em cima.

E estamos nisto. Nesta fossa à beira-mar plantada. E compreendemos, de forma cada vez mais dolorosa, que o regime inaugurado a 25 de Novembro de 1975, com todas as suas opções estratégicas (ou com a ausência delas), chegou ao fim.

Permanecemos, no entanto, sem saber o que virá a seguir. Em grande medida porque os actores que dominam a cena política continuam a ser os mesmos que nos levaram ao poço sem fundo. O mundo em que eles se movem morreu, eles próprios estão moribundos, mas continuam a encher-se com a nossa carne, à maneira dos mortos-vivos. 

Retrato (integral) do país

Posted in Ai Portugal por APEDE em 03/10/2011

Madeira jardinista, nosso espelho

Posted in Ai Portugal por APEDE em 20/09/2011

Nestes dias que correm, é difícil dizer alguma coisa original sobre a Madeira e Alberto João Jardim. Mas, como nos fica mal passar o assunto em silêncio, aqui vai.

Sabemos bem como aqui, no “contenente”, existe a tendência comum de olhar para a Madeira com desprezo e para Alberto João Jardim como uma aberração que, sendo patológica, é também exclusiva das insularidades. E nada haveria de surpreendente se, na hipótese longínqua de um referendo sobre a independência (forçada) da Madeira, o «sim» obtivesse, no Portugal continental, uma ampla maioria de votos.

Devemos, contudo, fazer um acto de contrição e humildade sempre que nos inclinamos para ver o madeirismo jardinista como um abcesso insular distante e estranho à restante realidade portuguesa.

É que há boas razões para pensarmos que o madeirismo está muito mais presente entre nós do que gostaríamos de imaginar. Mesmo que sob a forma de caricatura. Digamos que Alberto João Jardim é assim uma espécie de imagem de nós mesmos naquele género de espelhos que dantes existiam nas feiras populares: o facto de a imagem parecer deformada, nem por isso deixa de reflectir o nosso corpo.

O madeirismo jardinista contém, de facto, muitas tradições nacionais:

– O baixíssimo nível de exigência das populações relativamente ao respeito pelas mais elementares regras democráticas (quando não simplesmente por regras de decência e de boa educação);

– A complacência, a cumplicidade e a venalidade perante o atropelo da lei, o tráfico de influências, a corrupção (económica mas também moral) praticados por políticos poderosos, sempre que estes sabem comprar o silêncio e anestesiar as consciências através da distribuição de prebendas e da apresentação de “obra feita” – sobretudo quando esta se orienta para encher o olho.

– A completa impunidade dos poderosos face ao referido atropelo da lei, num país em que esta é, invariavelmente, letra morta quando se trata de beliscar interesses instalados e fortemente protegidos.

A combinação destes três factores explica por que motivo, desde que há eleições na Madeira, Alberto João Jardim tem vindo a coleccionar maiorias absolutas. E explica também o fenómeno, surreal apenas na aparência, de vermos todos os primeiros-ministros e todos os Presidentes da República de Portugal a curvarem a cerviz e a tratarem João Jardim com pinças, algodão e rama. Parece que José Sócrates lhe franziu um bocadinho o sobrolho, mais por força das circunstâncias do que por vontade própria (vale a pena, por isso, recordar estes encontros). O que não impediu o bonzo de gastar à tripa-forra o dinheiro dos nossos impostos, de o ocultar e de ainda vir gabar-se por isso.

Não nos apressemos, porém, a rejeitá-lo como quem sacode a caspa dos ombros. Há muitos Albertos Joões Jardins por esse país fora, chamem-se eles Ferreira Torres, Valentim Loureiro – estes dois quase tão coloridos como o colega madeirense -, Fátima Felgueiras ou Isaltino Morais. E muitos mais haverá no futuro.

Se, entretanto, pensarem que os supracitados são estranhezas meramente regionais, pensem também nos políticos do centrão em que o povinho tem vindo a votar recorrentemente. Pensem (isto é só um exemplo) no Sócrates dos casos por explicar, da licenciatura por fax e dos projectos de “vivendas”-que-assinou-mas-não-podia-assinar, e que, mesmo assim, arrebanhou uma segunda vitória eleitoral.

Portanto, não desviem a cara com repugnância. Olhem bem para o Alberto João Jardim. A nossa realidade está lá chapadinha. É feio, é grotesco, é português:

Para posições similares à que aqui defendemos, pode-se ler, com proveito, este texto e este.

10 de Junho de 2011

Posted in Ai Portugal por APEDE em 10/06/2011

Oh! Se eu soubesse que o Inferno

não era como os padres mo diziam:

uma fornalha de nunca se morrer…

mas sim um Jardim da Europa

à beira-mar plantado…

Eu teria tido certamente mais juízo,

teria sido até o mártir São Sebastião!

E inda há quem faça propaganda disto:

a pátria onde Camões morreu de fome

e onde todos enchem a barriga de Camões!

Bom povo português

Posted in Ai Portugal por APEDE em 03/06/2011

Telejornal da SIC-Notícias, 9h da manhã. Um sujeito é entrevistado na estação de comboios da Amadora. Perguntam-lhe: «O que pensa da greve dos maquinistas?» Resposta: «Uma vergonha». E o sujeito acrescenta, ar severo e orgulhoso: «Tenho 53 anos e nunca fiz uma greve na vida. Sempre trabalhei.»

Uma pessoa olha para o dito sujeito e fica a matutar na enorme quantidade de portugueses que poderiam, com o mesmo orgulho e a mesma severidade, fazer uma afirmação como essa. Para certos lunáticos de esquerda, que acham que meia dúzia de «acampadas» no Rossio significam já a revolução ao virar da esquina, é bom lembrar que este é o país que teve a mais longa ditadura fascista da Europa (quase meio século). E que tão extensa duração não se ficou a dever, exclusivamente, à repressão.

Nenhuma ditadura se aguenta tanto tempo apenas com base em medidas repressivas. A tristíssima verdade é que a «heróica resistência do povo português» não passa de um mito – que o PCP, por exemplo, gosta tanto de evocar para efeitos de autolegitimação histórica. A resistência e o combate estiveram a cargo de nichos muito reduzidos da população, que nunca conseguiram atrair as chamadas «massas», a não ser em dois momentos episódicos (ainda que significativos): o fim da Segunda Guerra Mundial e a campanha eleitoral de Humberto Delgado em 1958. Tirando isso, na maior parte do tempo o «bom povo português» tratou de se adaptar, melhor ou pior, à situação de miséria e de cinzentismo que se vivia, sem se preocupar grandemente com a ausência de liberdades cívicas e esforçando-se, numa base quase sempre individual, por se desenrascar em várias estratégias de sobrevivência – que, nos anos 60-70, se traduziram pela emigração de mais de 1 milhão de portugueses.

Ora, além das estratégias de adaptação, um número muito grande de portugueses apoiava activamente a ditadura de Salazar. E, por muito que isso custe à mitologia da resistência antifascista, as manifestações de apoio ao ditador não eram só compostas por gente arrebanhada das aldeias em camionetas. Se a isso juntarmos a rede de “bufos” com que a PIDE contava, a qual se calcula ter chegado às 20.000 almas (número provavelmente subavaliado), está feito o quadro completo do «bom povo português» e daquilo com que os resistentes podem contar, neste país, em tempos de ditadura.

Porque o PREC foi um brevíssimo interregno numa longa história de submissões, porque a liberdade não ocupa, de facto, a prioridade na cabeça da maioria dos portugueses, continua a haver tanta gentinha a suspirar por um qualquer Salazar, coisa que o senhor de 53 anos que nunca fez uma greve na vida muito possivelmente subscreve e apoia.

A realidade é esta: a democracia em Portugal é um facto bem mais frágil do que gostamos de imaginar.

Portugal: questão que temos connosco mesmos

Posted in Ai Portugal por APEDE em 13/04/2011

(Sob o signo de Alexandre O’Neill)

Face à terrível crise actual, podemos perguntar-nos o que ela nos diz sobre o nosso país.

E aí temos duas hipóteses possíveis. Uma, a mais fácil porque menos intelectualmente exigente, é entregarmo-nos aos discursos identitários do costume: «Portugal é uma piolheira», «Portugal é o cú da Europa» (variante metafórica do mais directo «este país é uma merda»), «país pequenino» ou «Portugal dos pequeninos», «Pátria madrasta», «vergonha de país», etc., etc. Estes discursos, que praticam uma espécie de auto-racismo (quase sempre glosado por quem possui de si mesmo uma imagem que o resgata de todos os seus conterrâneos), são tão delirantes como os discursos inversos, que prometem de nós mesmos uma representação hipertrofiada:

Em alternativa a estes discursos, que dizem muito mas pensam pouco, é preferível ensaiarmos uma tentativa para perceber, fora dos estereótipos, que parte nos cabe na situação em que hoje estamos.

Ora, uma primeira constatação, já assinalada por vários historiadores e que Francisco Louçã recorda no seu livro recentemente publicado, é que crises como a que estamos a viver têm sido frequentes, se não mesmo regulares, ao longo da história de Portugal, com particular incidência no nosso pobre século XIX, numa sucessão de catástrofes que culminaram com a bancarrota de 1891, e cujos efeitos políticos se fizeram sentir, para além da queda da monarquia, até à ascensão ao poder de Oliveira Salazar. Num certo sentido, Salazar foi o FMI dos anos 30, e todos sabemos (ou devíamos saber) o que isso custou ao país: uma ditadura e um prolongadíssimo atraso.

A pergunta que cumpre fazer é esta: por que raio é que, com 200 anos em cima, nunca conseguimos sair deste ciclo vicioso de atraso, de dependência e de endividamento?

A resposta é, seguramente, complexa e multicausal (como é “fino” dizer).

Antes de mais, Portugal é um país pobre, sem matérias-primas de vulto, prejudicado por uma geografia que acentua a sua posição periférica e afastada do centro (rico) da Europa. Com um tipo de relevo que não ajuda, sobretudo a norte do Tejo, à criação de grandes propriedades agrárias onde se possa produzir com capacidade exportadora, Portugal sempre viveu o drama do défice de produção agrícola, especialmente num domínio tão vital, no passado, como era o dos cereais (o Alentejo, obviamente, jamais conseguiu suprir essa lacuna). Este país nunca teve recursos para ser auto-suficiente e dispensar o apoio do exterior – chame-se a esse apoio «expansão marítima», «exploração colonial» ou «integração na União Europeia».

A tudo isto soma-se a particularidade da estrutura de poder social e político: desde, pelo menos, a era dos «Descobrimentos» que em Portugal se criou uma classe dominante essencialmente rentista, ociosa, dependente de um Estado hipercentralista. Isto explica boa parte do nosso atraso económico, da dificuldade em aceder à modernidade capitalista, do carácter sempre incipiente desse capitalismo – traços que o Portugal oitocentista partilhou com a Espanha (“por supuesto”), mas também com outro país da periferia europeia: a Rússia.

Em Portugal, o Estado foi comprando a anuência da nobreza e, mais tarde, da burguesia, distribuindo por essas classes prebendas e negócios. Isto faz-nos lembrar qualquer coisa do nosso presente, não?

Finalmente, temos os próprios portugueses como causa. Sem querer cair nas generalizações fáceis dos tais discursos identitários – até porque há estudos científicos sérios que o comprovam -, o facto é que os portugueses se vêem a si próprios como predominantemente passivos, infantis, irresponsáveis (com escasso superego), pouco tementes à lei (e, portanto, ao sentido do dever), etc. Numa palavra: os portugueses não são, nunca foram nem serão, alemães, dinamarqueses ou finlandeses. E isto explica muito da nossa complacência para com a corrupção, o chico-espertismo, o desenrascanço, explica a tendência para sacudir a responsabilidade e atribuí-la ao vizinho do lado. Explica, em suma, aqueles aspectos caracteriais que são uma parte substancial do nosso atraso.

Quando criticamos os políticos que temos, é bom não esquecer que eles são, afinal, o nosso reflexo: somos nós que votamos neles. 

Este peso multissecular que carregamos, que se confunde connosco, é um lastro pesadíssimo. E não vai desaparecer tão cedo.


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