Caro professor Ricardo Silva,
Sou jornalista do Diário Económico e estou a preparar um artigo de análise e perspeciva da Educação. Para isso, era importante contar com a sua colaboração. Queria saber de que forma o posso contactar para conversarmos um pouco sobre as grandes preocupações dos professores e os dissiers mais quentes que a ministra Isabel Alçada tem nas mãos.
Exma. Senhora
Presidente da Comissão Administrativa Provisória
Agrupamento de Escolas da Moita
Dra. Isabel Roma
ASSUNTO: Pedido de escusa do cargo de relator
O artigo 40º do Estatuto da Carreira Docente, intitulado “Caracterização e objectivos da avaliação do desempenho” refere, no ponto 3, alíneas a), b) e h), respectivamente: “contribuir para a melhoria da prática pedagógica do docente”; “contribuir para a valorização do trabalho e da profissão docente” e “promover o trabalho de cooperação entre os docentes, tendo em vista a melhoria do seu desempenho”.
Contudo, a realidade da nossa escola, no decurso do seu labor quotidiano, corre o risco de comprometer esse objectivo. As tarefas burocráticas exigidas ao professor/relator vêm ocupar o tempo destinado à preparação das actividades lectivas, à construção de materiais didácticos que se querem inovadores, ao acompanhamento de projectos diversos. Além disso, a existência de quotas vai perturbar a vida escolar pois suscita a competição entre pares e põe em causa o trabalho colaborativo. Como poderia este modelo de avaliação – em que se é relator de um seu parceiro e em que se concorre com ele por meio de quotas – contribuir para a melhoria da função docente?
A aplicação deste modelo de avaliação tem implicações negativas no funcionamento da escola, nomeadamente a nível das relações interpessoais e da redução das horas de acompanhamento dos alunos.
O modelo envolve, de forma continuada, todos os professores como avaliados e muitos como avaliadores, num processo complexo em que os avaliadores não estão legitimados, pese o questionável critério da senioridade, imposto pela lei.
A avaliação é feita pelos pares. Avaliados e avaliadores concorrem às mesmas quotas sem que estejam garantidos os princípios da isenção e de ausência de conflito de interesses.
A prioridade estabelecida para este processo e o tempo que inevitavelmente consumirá conduzirá à redução das horas de acompanhamento dos alunos.
O tempo necessário para fazer o acompanhamento de todos os professores, tendo em conta padrões de desempenho, definição de instrumentos de avaliação, preenchimento das fichas de avaliação, realização de reuniões da Comissão de Avaliação e Júri de Avaliação, assistências a aulas, entrevistas, etc…, acabará inevitavelmente também por recair sobre a componente de trabalho individual dos professores tão essencial à preparação de aulas, produção de materiais, correcção de trabalhos, etc…
Apesar de estarmos a poucos meses do fim do ciclo de avaliação em curso e cuja duração foi fixada em dois anos, existem inúmeras dúvidas, lacunas e incongruências legais.
Sendo as quotas (% de Muito Bons e Excelentes) por escola, como se resolve o conflito de interesses existente quando elementos da Comissão de Avaliação e relatores concorrem à mesma quota dos professores a quem atribuem Excelente ou Muito Bom?
Qual a legitimidade de os coordenadores poderem assistir a aulas dos relatores e o Director dos coordenadores, não avaliando a qualidade científica do trabalho? Faz sentido separar a dimensão pedagógica da científica, quando se observa uma aula?
A legislação sucessivamente publicada e os esclarecimentos que a DGRHE tem vindo a dar às escolas, por vezes de legalidade duvidosa, não ajudam e confirmam que o modelo não é exequível.
Por exemplo, no que respeita ao tempo, o Decreto Regulamentar nº 2/2010 de 23 de Junho, refere explicitamente no artigo 14º, ponto 3 “Os relatores que não exerçam em exclusividade as funções … beneficiam da redução de um tempo lectivo por cada três docentes a avaliar.” O despacho n.º 11120-A/2010 de organização do ano lectivo, publicado em 6 de Julho de 2010, refere no Artº 8º, ponto 1 “Para efeitos de avaliação do desempenho do pessoal docente deve considerar-se o critério, por relator, de um tempo lectivo semanal para avaliação de três docentes” e a informação da DGRHE – ORGANIZAÇÃO DO ANO ESCOLAR, de 26 de Julho de 2010 – refere “As horas de redução a que os relatores têm direito para o exercício das funções de avaliação de desempenho de outros docentes aplicam‐se em 1º lugar sobre as horas de redução da componente lectiva que o docente beneficia ao abrigo do art.º 79 do ECD e sobre horas da componente não lectiva de estabelecimento e só depois, em caso de insuficiência, na componente lectiva”. A circular B10015847T estabelece que “a função de avaliação dos relatores pelo coordenador de Departamento curricular integra-se nas funções de coordenação deste, não existindo qualquer previsão legal para uma redução específica de componente lectiva em razão desta função”. Ou seja os coordenadores de departamento não têm qualquer tempo destinado ao desempenho das funções de relator, embora possam ter de avaliar vários professores/relatores? Como podem desenvolver, de forma séria, este e todo o trabalho de coordenação previsto na lei e no Regulamento Interno da escola? Afinal há ou não direito a redução da componente lectiva de 1 hora para 3 professores avaliados?
As recomendações da Comissão de Avaliação podendo, em abstracto, fazer sentido do ponto de vista teórico, não ajudam à concretização da implementação do modelo por não estarem minimamente reunidas condições para a sua aplicação, tornando-se por isso inúteis.
Pelo que foi dito não restam dúvidas que o actual modelo de avaliação é injusto, confuso e não exequível. Em vez de “contribuir para melhorar a prática pedagógica, valorizar o trabalho e a profissão, promover o trabalho de colaboração” fomenta conflitos e, em virtude da sua questionável exequibilidade, tem implicações negativas na prática pedagógica e na qualidade da escola pública.
Parece evidente que o único objectivo atingível é a introdução de quotas para efeitos de progressão na carreira docente. Mas mesmo este objectivo está colocado em causa pelo congelamento anunciado.
De acordo com a alínea d) do nº 2 do Artigo 14.º do Decreto Lei 2/2010, compete ao relator:
“ … Apresentar ao júri de avaliação uma ficha de avaliação global, que inclui uma proposta de classificação final”
Mas como pode ele fazê-lo com imparcialidade, se se insiste na determinação das quotas da ADD por Agrupamento de Escolas não considerando o universo de professores por grupos específicos.
Também no Decreto Lei 75/2010 pode ler-se no número 3 do artigo 46º:
3 — Por despacho conjunto dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da educação e da Administração Pública são fixadas as percentagens máximas para a atribuição das classificações de Muito bom e Excelente, por escola não agrupada ou agrupamento de escolas, as quais terão por referência os resultados obtidos na avaliação externa da escola.
A inexistência de quotas por grupos de docentes faz com que a ADD assente num princípio em que o Relator sendo parte interessada na proposta de classificação final discrimina o grupo dos avaliados não relatores.
Avaliadores e avaliados são concorrentes na mesma carreira profissional, o que fere inapelavelmente as garantias de imparcialidade.
As perspectivas de progressão na carreira de cada professor dependem, não apenas da sua própria classificação, como também da que os outros professores da mesma escola/agrupamento tiverem. Ora, avaliados e avaliadores pertencem à mesma escola/agrupamento e são muitas vezes concorrentes aos mesmos escalões da carreira, o que (por si só) constitui um forte motivo de impedimento.
E, mesmo quando pertencem a escalões diferentes, é óbvio que o avaliador tem interesse directo nas classificações atribuídas ao seu avaliado: se estiver posicionado em escalão superior, só terá a perder com a subida de escalão daquele, pois tornar-se-á concorrente directo numa futura transição de carreira, aumentando ainda as hipóteses de o poder vir a substituir como avaliador; se, o que a lei permite em determinados casos, o avaliador pertencer a um escalão de carreira inferior ao do seu avaliado, é-lhe oferecida a possibilidade de, através da classificação que atribuir, o fazer marcar passo na carreira e poder alcançá-lo, conferindo assim solidez ao seu recém-adquirido estatuto de avaliador.
Independentemente dos incontornáveis impedimentos legais, dificilmente se poderia conceber um esquema mais maquiavélico de “avaliação entre pares”, que só poderá ter como resultado a degradação do clima de trabalho na escola. Quanto ao princípio da imparcialidade, foi feito em pedaços.
Assim, de acordo com as alíneas a), c) e d) do artigo 44º do Código do Procedimento Administrativo, declaro o meu impedimento em avaliar os docentes que me foram confiados no processo de ADD, bem como, ao abrigo dos números 1 e 2 do artigo 48º do Código do Procedimento Administrativo, solicito escusa do cargo de relator para o qual fui nomeado.
Somos um grupo de docentes atentos à política educativa levada a cabo pelo ministério que nos tutela. Gostaríamos de congratular a APEDE pela iniciativa que levou a cabo no dia 28 de Janeiro nas Caldas da Rainha. É nossa intenção que esta iniciativa ganhe reflexos no nosso Distrito. Desta forma contamos com o vosso contributo na organização e divulgação de uma próxima iniciativa em Aveiro. Certos que a experiência pode ser partilhada e repetida por outras zonas do País, solicitamos a divulgação dos trâmites legais e organizacionais necessários.
Agradecendo as vossas palavras,felicitamo-vos pela intenção manifestada e, naturalmente, ficamos ao vosso dispor para o que necessitem. Podem usar o e-mail (correioapede@gmail,com) para podermos trocar informações e acertarmos outros contactos posteriores.
Como sei que o meu colega de escola não se vai zangar comigo, aqui fica o seu pedido de escusa do cargo de relator:
António Carlos Freire Brinco, professor do grupo de recrutamento 410
> da Escola Secundária do Monte de Caparica, tendo sido nomeado relator
> no processo de avaliação do desempenho docente regulado pelo Decreto
> Regulamentar 2/2010, vem expor a V. Exa. o seguinte:
>
> I
> A legislação aplicável ao processo de Avaliação de Desempenho Docente
> – DL75/2010, DR 2/2010 e Despacho ME 16034/2010 – não faz qualquer
> distinção no que se refere à distribuição das quotas de mérito entre
> avaliados, relatores, coordenadores e membros da Comissão de
> Coordenação da Avaliação de Desempenho.
>
> II
> Dessa forma o requerente concorre às mesmas quotas de mérito que os
> colegas que, por força da nomeação supracitada, irá avaliar e/ou
> assistir a aulas.
>
> III
> Acresce que da leitura atenta e cuidadosa dos instrumentos elaborados
> pela CCAD, a que V. Exa. preside, bem como do teor dos descritores
> enunciados no Despacho ME 16034/2010, não resulta claro para o
> requerente a forma como se pode dar cumprimento à distinção entre os
> cinco níveis de proficiência do desempenho dos avaliados –
> Insuficiente, Regular, Bom, Muito Bom e Excelente.
>
> IV
> Do ponto III resulta que a proposta de Avaliação Global de Desempenho
> que o relator fará carece de um mínimo de rigor e objectividade. De
> facto ficará completamente ao arbítrio do relator colocar a cruz num
> dos três espaços de Bom, Muito Bom ou Excelente.
>
> V
> A ponderação dos factos enunciados nos pontos anteriores determina a
> impossibilidade de o relator realizar uma avaliação justa,
> transparente e acima de qualquer suspeita de favorecimento ou prejuízo
> dos seus avaliados, por parte destes e dos restantes membros da
> comunidade escolar.
>
> VI
> Face ao exposto no ponto II, o(a) signatário(a) vem arguir perante V.
> Exa. o seu impedimento para o exercício das funções de relator(a), ao
> abrigo da alínea c) do artigo 44º do Código do Procedimento
> Administrativo, dando cumprimento ao n.º1 do artigo 45º do mesmo
> código.
>
> VII
> Face ao exposto nos pontos III, IV e V, o signatário vem solicitar a
> V. Exa. a sua escusa do exercício das funções de relator, ao abrigo da
> alínea d) do n.º1 do artigo 48º do Código do Procedimento
> Administrativo, dando cumprimento ao n.º1 do artigo 49º do mesmo
> código.
>
> Pede deferimento,
>
> Monte de Caparica, 31 de Janeiro de 2011
>
No preâmbulo do Decreto-Lei n.º 75/2010 de 23 de Junho, lê-se que as “alterações” introduzidas no ECD “visam (…) assegurar a prioridade ao trabalho dos docentes com os alunos, tendo em vista o interesse das escolas, das famílias e do País”.
Porém, nas escolas, hoje, os professores vivem no avesso.
Hoje, os professores são forçados a não dar prioridade ao trabalho com os alunos.
Hoje, para implementar esta ADD, os professores são forçados a se ocuparem de tarefas burocráticas que ocupam o tempo da preparação das actividades lectivas, da produção de materiais didácticos, do acompanhamento de projectos diversos.
Esta ADD não é sã.
Esta ADD rouba o tempo dos professores para os alunos.
Esta ADD não atribui valor nenhum ao trabalho dos professores.
Esta ADD cria um clima cilindrador nas escolas.
Esta ADD desperta boas vontades em espiar. Me dói esse frenesim. Me soluça haver medo no meu país.
Esta ADD não se dá bem com a justiça, a transparência, o rigor, a imparcialidade.
Esta ADD só consegue engordar os egos magrinhos de professores fartos da sua inutilidade ruidosa.
Esta ADD amiúda.
Esta ADD arrebanha.
Esta ADD trata como populaça os professores.
Esta ADD está às portas da lei da chibata.
Esta ADD não é sã.
Quem me dera que esta ADD prestasse.
Hoje, porém, o ME força os professores a servirem o Estado como máquinas.
Hoje, o ME força os professores a não fazerem uso livre da sua inteligência.
Hoje, o ME força os professores a serem avaliados por pares sem formação especializada.
Hoje, o ME força os professores a serem avaliados por pares de áreas científicas diferentes, se não opostas.
Hoje, o ME força os professores mais experientes a serem avaliados por pares com posição menos elevada na carreira.
Hoje, o ME força os professores mais qualificados a serem avaliados por pares com menos habilitações académicas.
Hoje, a implementação da ADD aponta a porta da rua aos professores situados nos últimos escalões da carreira.
Hoje, os professores mais experientes, os que foram, durante anos, psicólogos, assistentes sociais, investigadores, moralizadores, educadores de tantos jovens, sentem-se pisados, humilhados, desrespeitados.
Hoje, o ME trata os professores mais experientes, mais qualificados, como inúteis.
Hoje, os professores mais experientes vêem, e sentem na pele, que o ME os despreza e que os sindicatos a isto dizem nada e até assina(ra)m de cruz.
Hoje, professores, entre os mais experientes, que cumpriram com brio e dedicação a elevada missão da escola pública, pedem a reforma antes do tempo. “Que lágrimas, que grito hão-de dizer/ A desilusão e o peso em vosso corpo”, ó meus colegas?
Para o ME um bom professor é aquele que está de saída.
O ME (re)faz contas e esfrega as mãos com volúpia e todo ele é um hino.
O nome do ME é desprezo pelos “professorzecos”.
Quem me dera que o ME honrasse os professores.
Hoje, a Educação é uma área preferencial de cortes brutais na despesa orçamental.
Hoje, por descuido, está em causa o “interesse das escolas, das famílias e do País”.
Hoje, tudo isto nos diz respeito – somos cidadãos.
Maria José Cheira
Escola secundária D. Manuel I de Beja
Parabéns, Ricardo Silva!
Pela EXCELENTE intervenção na SIC notícias. Era bom que a informação chegasse a todos os órgãos de comunicação, à CONFAP, a todos os cidadãos. Para ver se acabavam as falácias.
Olá São, bom dia.
Agradecemos as palavras, o apoio e o incentivo. A intenção da nossa intervenção sempre foi, como agora neste caso do Ricardo (que chegou realmente a muita gente), com a intenção de reforçar a luta dos professores, esclarecer a opinião pública e defender a Escola Pública e os seus profissionais.
Muito obrigado! Seguimos juntos na luta!
Olá Alda, bom dia.
Nós é que agradecemos a força e o incentivo. A APEDE como poderá perceber melhor aqui: https://apede08.wordpress.com/about/
foi criada exatamente com a intenção de contribuir para o reforço da luta de professores, e assim estivemos durante vários anos desde o governo de Sócrates e também nos tempos de Passos Coelho e do ministro Crato. Naturalmente, e como somos todos professores no terreno, a dar aulas dia a dia, com todos os afazeres pessoais e familiares, entre outros compromissos, era impossível continuarmos sempre ativos e presentes no espaço público e a nossa atividade acabou por se centrar até mais no interior das escolas, sem grande exposição pública. Claro que se nos convidarem a participar e a dar a nossa opinião no espaço mediático (como agora aconteceu na SIC Notícias) não deixaremos de o fazer, sem qualquer outra intenção que não seja fazer ouvir a voz dos professores, esclarecer a opinião pública, defender a Escola Público e todos quantos nela trabalham. Da parte dos colegas, só esperamos a vossa compreensão, apoio e que, juntos, continuemos a dignificar a nossa profissão e a exigir o respeito e a valorização que tanto merecemos.
Muito obrigado.
Abraço
em 22/04/2010 em 16:51
Caro professor Ricardo Silva,
Sou jornalista do Diário Económico e estou a preparar um artigo de análise e perspeciva da Educação. Para isso, era importante contar com a sua colaboração. Queria saber de que forma o posso contactar para conversarmos um pouco sobre as grandes preocupações dos professores e os dissiers mais quentes que a ministra Isabel Alçada tem nas mãos.
Desde ja agradeço a sua disponibilidade e ajuda.
Melhores cumprimentos,
Catarina Madeira
Jornalista
DIÁRIO ECONÓMICO
Rua Vieira da Silva, 45 I 1350-342 Lisboa
Tel. +351 213 236 965
Telm. +351 927 984 089
catarina.madeira@economico.pt
em 07/01/2011 em 13:22
Exma. Senhora
Presidente da Comissão Administrativa Provisória
Agrupamento de Escolas da Moita
Dra. Isabel Roma
ASSUNTO: Pedido de escusa do cargo de relator
O artigo 40º do Estatuto da Carreira Docente, intitulado “Caracterização e objectivos da avaliação do desempenho” refere, no ponto 3, alíneas a), b) e h), respectivamente: “contribuir para a melhoria da prática pedagógica do docente”; “contribuir para a valorização do trabalho e da profissão docente” e “promover o trabalho de cooperação entre os docentes, tendo em vista a melhoria do seu desempenho”.
Contudo, a realidade da nossa escola, no decurso do seu labor quotidiano, corre o risco de comprometer esse objectivo. As tarefas burocráticas exigidas ao professor/relator vêm ocupar o tempo destinado à preparação das actividades lectivas, à construção de materiais didácticos que se querem inovadores, ao acompanhamento de projectos diversos. Além disso, a existência de quotas vai perturbar a vida escolar pois suscita a competição entre pares e põe em causa o trabalho colaborativo. Como poderia este modelo de avaliação – em que se é relator de um seu parceiro e em que se concorre com ele por meio de quotas – contribuir para a melhoria da função docente?
A aplicação deste modelo de avaliação tem implicações negativas no funcionamento da escola, nomeadamente a nível das relações interpessoais e da redução das horas de acompanhamento dos alunos.
O modelo envolve, de forma continuada, todos os professores como avaliados e muitos como avaliadores, num processo complexo em que os avaliadores não estão legitimados, pese o questionável critério da senioridade, imposto pela lei.
A avaliação é feita pelos pares. Avaliados e avaliadores concorrem às mesmas quotas sem que estejam garantidos os princípios da isenção e de ausência de conflito de interesses.
A prioridade estabelecida para este processo e o tempo que inevitavelmente consumirá conduzirá à redução das horas de acompanhamento dos alunos.
O tempo necessário para fazer o acompanhamento de todos os professores, tendo em conta padrões de desempenho, definição de instrumentos de avaliação, preenchimento das fichas de avaliação, realização de reuniões da Comissão de Avaliação e Júri de Avaliação, assistências a aulas, entrevistas, etc…, acabará inevitavelmente também por recair sobre a componente de trabalho individual dos professores tão essencial à preparação de aulas, produção de materiais, correcção de trabalhos, etc…
Apesar de estarmos a poucos meses do fim do ciclo de avaliação em curso e cuja duração foi fixada em dois anos, existem inúmeras dúvidas, lacunas e incongruências legais.
Sendo as quotas (% de Muito Bons e Excelentes) por escola, como se resolve o conflito de interesses existente quando elementos da Comissão de Avaliação e relatores concorrem à mesma quota dos professores a quem atribuem Excelente ou Muito Bom?
Qual a legitimidade de os coordenadores poderem assistir a aulas dos relatores e o Director dos coordenadores, não avaliando a qualidade científica do trabalho? Faz sentido separar a dimensão pedagógica da científica, quando se observa uma aula?
A legislação sucessivamente publicada e os esclarecimentos que a DGRHE tem vindo a dar às escolas, por vezes de legalidade duvidosa, não ajudam e confirmam que o modelo não é exequível.
Por exemplo, no que respeita ao tempo, o Decreto Regulamentar nº 2/2010 de 23 de Junho, refere explicitamente no artigo 14º, ponto 3 “Os relatores que não exerçam em exclusividade as funções … beneficiam da redução de um tempo lectivo por cada três docentes a avaliar.” O despacho n.º 11120-A/2010 de organização do ano lectivo, publicado em 6 de Julho de 2010, refere no Artº 8º, ponto 1 “Para efeitos de avaliação do desempenho do pessoal docente deve considerar-se o critério, por relator, de um tempo lectivo semanal para avaliação de três docentes” e a informação da DGRHE – ORGANIZAÇÃO DO ANO ESCOLAR, de 26 de Julho de 2010 – refere “As horas de redução a que os relatores têm direito para o exercício das funções de avaliação de desempenho de outros docentes aplicam‐se em 1º lugar sobre as horas de redução da componente lectiva que o docente beneficia ao abrigo do art.º 79 do ECD e sobre horas da componente não lectiva de estabelecimento e só depois, em caso de insuficiência, na componente lectiva”. A circular B10015847T estabelece que “a função de avaliação dos relatores pelo coordenador de Departamento curricular integra-se nas funções de coordenação deste, não existindo qualquer previsão legal para uma redução específica de componente lectiva em razão desta função”. Ou seja os coordenadores de departamento não têm qualquer tempo destinado ao desempenho das funções de relator, embora possam ter de avaliar vários professores/relatores? Como podem desenvolver, de forma séria, este e todo o trabalho de coordenação previsto na lei e no Regulamento Interno da escola? Afinal há ou não direito a redução da componente lectiva de 1 hora para 3 professores avaliados?
As recomendações da Comissão de Avaliação podendo, em abstracto, fazer sentido do ponto de vista teórico, não ajudam à concretização da implementação do modelo por não estarem minimamente reunidas condições para a sua aplicação, tornando-se por isso inúteis.
Pelo que foi dito não restam dúvidas que o actual modelo de avaliação é injusto, confuso e não exequível. Em vez de “contribuir para melhorar a prática pedagógica, valorizar o trabalho e a profissão, promover o trabalho de colaboração” fomenta conflitos e, em virtude da sua questionável exequibilidade, tem implicações negativas na prática pedagógica e na qualidade da escola pública.
Parece evidente que o único objectivo atingível é a introdução de quotas para efeitos de progressão na carreira docente. Mas mesmo este objectivo está colocado em causa pelo congelamento anunciado.
De acordo com a alínea d) do nº 2 do Artigo 14.º do Decreto Lei 2/2010, compete ao relator:
“ … Apresentar ao júri de avaliação uma ficha de avaliação global, que inclui uma proposta de classificação final”
Mas como pode ele fazê-lo com imparcialidade, se se insiste na determinação das quotas da ADD por Agrupamento de Escolas não considerando o universo de professores por grupos específicos.
Também no Decreto Lei 75/2010 pode ler-se no número 3 do artigo 46º:
3 — Por despacho conjunto dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da educação e da Administração Pública são fixadas as percentagens máximas para a atribuição das classificações de Muito bom e Excelente, por escola não agrupada ou agrupamento de escolas, as quais terão por referência os resultados obtidos na avaliação externa da escola.
A inexistência de quotas por grupos de docentes faz com que a ADD assente num princípio em que o Relator sendo parte interessada na proposta de classificação final discrimina o grupo dos avaliados não relatores.
Avaliadores e avaliados são concorrentes na mesma carreira profissional, o que fere inapelavelmente as garantias de imparcialidade.
As perspectivas de progressão na carreira de cada professor dependem, não apenas da sua própria classificação, como também da que os outros professores da mesma escola/agrupamento tiverem. Ora, avaliados e avaliadores pertencem à mesma escola/agrupamento e são muitas vezes concorrentes aos mesmos escalões da carreira, o que (por si só) constitui um forte motivo de impedimento.
E, mesmo quando pertencem a escalões diferentes, é óbvio que o avaliador tem interesse directo nas classificações atribuídas ao seu avaliado: se estiver posicionado em escalão superior, só terá a perder com a subida de escalão daquele, pois tornar-se-á concorrente directo numa futura transição de carreira, aumentando ainda as hipóteses de o poder vir a substituir como avaliador; se, o que a lei permite em determinados casos, o avaliador pertencer a um escalão de carreira inferior ao do seu avaliado, é-lhe oferecida a possibilidade de, através da classificação que atribuir, o fazer marcar passo na carreira e poder alcançá-lo, conferindo assim solidez ao seu recém-adquirido estatuto de avaliador.
Independentemente dos incontornáveis impedimentos legais, dificilmente se poderia conceber um esquema mais maquiavélico de “avaliação entre pares”, que só poderá ter como resultado a degradação do clima de trabalho na escola. Quanto ao princípio da imparcialidade, foi feito em pedaços.
Assim, de acordo com as alíneas a), c) e d) do artigo 44º do Código do Procedimento Administrativo, declaro o meu impedimento em avaliar os docentes que me foram confiados no processo de ADD, bem como, ao abrigo dos números 1 e 2 do artigo 48º do Código do Procedimento Administrativo, solicito escusa do cargo de relator para o qual fui nomeado.
Peço deferimento,
João António Cavaco Medeiros
(Professor de Economia do Grupo 430)
Moita, _____/_____/____________
em 02/02/2011 em 11:41
Somos um grupo de docentes atentos à política educativa levada a cabo pelo ministério que nos tutela. Gostaríamos de congratular a APEDE pela iniciativa que levou a cabo no dia 28 de Janeiro nas Caldas da Rainha. É nossa intenção que esta iniciativa ganhe reflexos no nosso Distrito. Desta forma contamos com o vosso contributo na organização e divulgação de uma próxima iniciativa em Aveiro. Certos que a experiência pode ser partilhada e repetida por outras zonas do País, solicitamos a divulgação dos trâmites legais e organizacionais necessários.
em 02/02/2011 em 17:09
Caros colegas,
Agradecendo as vossas palavras,felicitamo-vos pela intenção manifestada e, naturalmente, ficamos ao vosso dispor para o que necessitem. Podem usar o e-mail (correioapede@gmail,com) para podermos trocar informações e acertarmos outros contactos posteriores.
Forte abraço
em 03/02/2011 em 23:11
Como sei que o meu colega de escola não se vai zangar comigo, aqui fica o seu pedido de escusa do cargo de relator:
António Carlos Freire Brinco, professor do grupo de recrutamento 410
> da Escola Secundária do Monte de Caparica, tendo sido nomeado relator
> no processo de avaliação do desempenho docente regulado pelo Decreto
> Regulamentar 2/2010, vem expor a V. Exa. o seguinte:
>
> I
> A legislação aplicável ao processo de Avaliação de Desempenho Docente
> – DL75/2010, DR 2/2010 e Despacho ME 16034/2010 – não faz qualquer
> distinção no que se refere à distribuição das quotas de mérito entre
> avaliados, relatores, coordenadores e membros da Comissão de
> Coordenação da Avaliação de Desempenho.
>
> II
> Dessa forma o requerente concorre às mesmas quotas de mérito que os
> colegas que, por força da nomeação supracitada, irá avaliar e/ou
> assistir a aulas.
>
> III
> Acresce que da leitura atenta e cuidadosa dos instrumentos elaborados
> pela CCAD, a que V. Exa. preside, bem como do teor dos descritores
> enunciados no Despacho ME 16034/2010, não resulta claro para o
> requerente a forma como se pode dar cumprimento à distinção entre os
> cinco níveis de proficiência do desempenho dos avaliados –
> Insuficiente, Regular, Bom, Muito Bom e Excelente.
>
> IV
> Do ponto III resulta que a proposta de Avaliação Global de Desempenho
> que o relator fará carece de um mínimo de rigor e objectividade. De
> facto ficará completamente ao arbítrio do relator colocar a cruz num
> dos três espaços de Bom, Muito Bom ou Excelente.
>
> V
> A ponderação dos factos enunciados nos pontos anteriores determina a
> impossibilidade de o relator realizar uma avaliação justa,
> transparente e acima de qualquer suspeita de favorecimento ou prejuízo
> dos seus avaliados, por parte destes e dos restantes membros da
> comunidade escolar.
>
> VI
> Face ao exposto no ponto II, o(a) signatário(a) vem arguir perante V.
> Exa. o seu impedimento para o exercício das funções de relator(a), ao
> abrigo da alínea c) do artigo 44º do Código do Procedimento
> Administrativo, dando cumprimento ao n.º1 do artigo 45º do mesmo
> código.
>
> VII
> Face ao exposto nos pontos III, IV e V, o signatário vem solicitar a
> V. Exa. a sua escusa do exercício das funções de relator, ao abrigo da
> alínea d) do n.º1 do artigo 48º do Código do Procedimento
> Administrativo, dando cumprimento ao n.º1 do artigo 49º do mesmo
> código.
>
> Pede deferimento,
>
> Monte de Caparica, 31 de Janeiro de 2011
>
em 15/02/2011 em 13:15
No preâmbulo do Decreto-Lei n.º 75/2010 de 23 de Junho, lê-se que as “alterações” introduzidas no ECD “visam (…) assegurar a prioridade ao trabalho dos docentes com os alunos, tendo em vista o interesse das escolas, das famílias e do País”.
Porém, nas escolas, hoje, os professores vivem no avesso.
Hoje, os professores são forçados a não dar prioridade ao trabalho com os alunos.
Hoje, para implementar esta ADD, os professores são forçados a se ocuparem de tarefas burocráticas que ocupam o tempo da preparação das actividades lectivas, da produção de materiais didácticos, do acompanhamento de projectos diversos.
Esta ADD não é sã.
Esta ADD rouba o tempo dos professores para os alunos.
Esta ADD não atribui valor nenhum ao trabalho dos professores.
Esta ADD cria um clima cilindrador nas escolas.
Esta ADD desperta boas vontades em espiar. Me dói esse frenesim. Me soluça haver medo no meu país.
Esta ADD não se dá bem com a justiça, a transparência, o rigor, a imparcialidade.
Esta ADD só consegue engordar os egos magrinhos de professores fartos da sua inutilidade ruidosa.
Esta ADD amiúda.
Esta ADD arrebanha.
Esta ADD trata como populaça os professores.
Esta ADD está às portas da lei da chibata.
Esta ADD não é sã.
Quem me dera que esta ADD prestasse.
Hoje, porém, o ME força os professores a servirem o Estado como máquinas.
Hoje, o ME força os professores a não fazerem uso livre da sua inteligência.
Hoje, o ME força os professores a serem avaliados por pares sem formação especializada.
Hoje, o ME força os professores a serem avaliados por pares de áreas científicas diferentes, se não opostas.
Hoje, o ME força os professores mais experientes a serem avaliados por pares com posição menos elevada na carreira.
Hoje, o ME força os professores mais qualificados a serem avaliados por pares com menos habilitações académicas.
Hoje, a implementação da ADD aponta a porta da rua aos professores situados nos últimos escalões da carreira.
Hoje, os professores mais experientes, os que foram, durante anos, psicólogos, assistentes sociais, investigadores, moralizadores, educadores de tantos jovens, sentem-se pisados, humilhados, desrespeitados.
Hoje, o ME trata os professores mais experientes, mais qualificados, como inúteis.
Hoje, os professores mais experientes vêem, e sentem na pele, que o ME os despreza e que os sindicatos a isto dizem nada e até assina(ra)m de cruz.
Hoje, professores, entre os mais experientes, que cumpriram com brio e dedicação a elevada missão da escola pública, pedem a reforma antes do tempo. “Que lágrimas, que grito hão-de dizer/ A desilusão e o peso em vosso corpo”, ó meus colegas?
Para o ME um bom professor é aquele que está de saída.
O ME (re)faz contas e esfrega as mãos com volúpia e todo ele é um hino.
O nome do ME é desprezo pelos “professorzecos”.
Quem me dera que o ME honrasse os professores.
Hoje, a Educação é uma área preferencial de cortes brutais na despesa orçamental.
Hoje, por descuido, está em causa o “interesse das escolas, das famílias e do País”.
Hoje, tudo isto nos diz respeito – somos cidadãos.
Maria José Cheira
Escola secundária D. Manuel I de Beja
em 16/03/2011 em 17:52
Esta fulana nunca fez nada de jeito !
Vive e adora conflitos !!!
Mandem-na para a Líbia !Assessora do Kadafi!
em 16/01/2023 em 20:15
Parabéns, Ricardo Silva!
Pela EXCELENTE intervenção na SIC notícias. Era bom que a informação chegasse a todos os órgãos de comunicação, à CONFAP, a todos os cidadãos. Para ver se acabavam as falácias.
em 19/01/2023 em 11:10
Olá São, bom dia.
Agradecemos as palavras, o apoio e o incentivo. A intenção da nossa intervenção sempre foi, como agora neste caso do Ricardo (que chegou realmente a muita gente), com a intenção de reforçar a luta dos professores, esclarecer a opinião pública e defender a Escola Pública e os seus profissionais.
Muito obrigado! Seguimos juntos na luta!
em 19/01/2023 em 00:01
Olá,
Estou imensamente grata pelo vosso papel na luta pela educação, nomeadamente ao cega Ricardo.
Quero saber de q forma posso ajudar-vos.
Saudações
em 19/01/2023 em 11:24
Olá Alda, bom dia.
Nós é que agradecemos a força e o incentivo. A APEDE como poderá perceber melhor aqui:
https://apede08.wordpress.com/about/
foi criada exatamente com a intenção de contribuir para o reforço da luta de professores, e assim estivemos durante vários anos desde o governo de Sócrates e também nos tempos de Passos Coelho e do ministro Crato. Naturalmente, e como somos todos professores no terreno, a dar aulas dia a dia, com todos os afazeres pessoais e familiares, entre outros compromissos, era impossível continuarmos sempre ativos e presentes no espaço público e a nossa atividade acabou por se centrar até mais no interior das escolas, sem grande exposição pública. Claro que se nos convidarem a participar e a dar a nossa opinião no espaço mediático (como agora aconteceu na SIC Notícias) não deixaremos de o fazer, sem qualquer outra intenção que não seja fazer ouvir a voz dos professores, esclarecer a opinião pública, defender a Escola Público e todos quantos nela trabalham. Da parte dos colegas, só esperamos a vossa compreensão, apoio e que, juntos, continuemos a dignificar a nossa profissão e a exigir o respeito e a valorização que tanto merecemos.
Muito obrigado.
Abraço