Manifesto em defesa da Escola Pública, do Ensino e dos seus Profissionais.

Após duas décadas de erosão contínua, orquestrada e intencional, da autoridade e do estatuto socioprofissional dos professores, assente na degradação das carreiras e salários, precariedade laboral e falta de respeito pelos vínculos familiares e afetivos, desautorização pedagógica, indisciplina crescente, burocracia infernal, modelo de avaliação injusto e opaco, gestão escolar unipessoal e autocrática, crescente facilitismo e pressão para o sucesso administrativo, sobrecarga horária, múltiplas tarefas e funções burocráticas, enfim, um ataque ao prestígio e à dignidade profissional docente, que levou muitos milhares a abandonar o ensino, deixando muitos dos que ficaram no sistema em situações intoleráveis de exaustão, “burnout” e desânimo, parece-nos imperioso, urgente e necessário, uma clara e decidida inversão no rumo das políticas educativas que mergulharam a Escola Pública na sua maior crise de sempre em democracia. A Escola Pública só poderá retomar o papel de elevador social que tem de ter, integrando todos os alunos, sendo instrumento de justiça e valorização social, rasgando horizontes e desarmando desigualdades com vista a um Portugal melhor e com futuro, se os governantes entenderem, verdadeiramente, os desafios que estão colocados e os caminhos que devem ser percorridos. Desde logo, é fundamental que exista vontade política e políticos com estatura e visão prospetiva que assumam como prioridade a valorização da Escola Pública e de todos os seus profissionais, a pacificação e a melhoria do clima escolar, o apetrechamento das escolas com os meios e recursos humanos e materiais necessários, a remoção dos obstáculos que dificultam um ensino de qualidade, feito de conhecimento, criatividade e sentido crítico. Só assim a Escola Pública poderá cumprir o seu importante e insubstituível papel social. A aposta na Educação tem de ser feita de uma forma sustentada e prolongada no tempo, assente num pacto de regime (que não pode ser fundado em tacticismos políticos conjunturais ou oportunismos demagógicos de puro eleitoralismo), acompanhado dos recursos financeiros necessários que permitam investir a sério no tanto que está por fazer. Idealmente, gostaríamos de ter na pasta da Educação um Ministro ou, no mínimo, um Secretário de Estado, com conhecimento e experiência real, direta e vivida de lecionação nas salas de aula do ensino básico e secundário, especialmente nas últimas duas décadas, para que pudesse verdadeiramente entender os problemas e necessidades da Escola e dos seus profissionais, docentes e não docentes. Se assim fosse, teríamos a certeza de que iria concordar connosco quando referimos que para termos uma Escola Pública melhor seria necessário conseguir:

1. A valorização e atratividade da carreira, com a devolução integral do tempo de serviço congelado (incluindo um mecanismo de compensação para os professores já aposentados, ou que estejam nos últimos escalões da carreira e já não possam recuperar todo o tempo a devolver), o reposicionamento de todos os docentes de acordo com o seu tempo de serviço, (resolvendo-se assim as injustiças ocorridas com as ultrapassagens) e a atualização dos índices remuneratórios (corrigindo a significativa perda de poder de compra ao longo dos últimos 15 anos), devolvendo-se justiça e esperança e criando condições para que possam regressar ao sistema milhares de professores que optaram por outros percursos profissionais, motivar os que ainda se mantêm no ensino e, finalmente, atrair os mais jovens à profissão, combatendo-se o dramático problema da falta de professores;

2. A promoção da Escola como um espaço privilegiado de conhecimento e de desenvolvimento de valores, criatividade e  sentido crítico, assente no rigor, respeito e responsabilidade, assegurando uma verdadeira igualdade de oportunidades, e garantindo as respostas educativas mais adequadas a cada aluno, para o que será fundamental a contratação dos recursos humanos necessários- psicólogos, terapeutas, assistentes sociais, professores de apoio/substituição, etc.;

3. A democratização da gestão escolar, alterando o atual modelo unipessoal e autocrático para um modelo colegial, de equipa diretiva eleita em conjunto, de forma universal e com limitação de mandatos;

4. A reversão dos mega-agrupamentos, devolvendo identidade às escolas, sentido de pertença, uma gestão democrática de proximidade e a melhoria do clima escolar;

5. O melhoramento e requalificação dos espaços escolares: climatização, atualização e manutenção dos recursos tecnológicos (incluindo internet fiável), auditórios, espaços de convívio abrigados para os alunos, salas de trabalho para os departamentos/grupos disciplinares e para receber Encarregados de Educação, conservação dos edifícios, mobiliário e equipamentos, etc.;

6. A criação de um maior número de vagas de quadro (deixando de as mascarar como meras necessidades transitórias) de forma a estabilizar mais docentes e permitir uma aproximação à residência, o que pode também ser conseguido com a recuperação da “lei dos cônjuges”;

7. A garantia da colocação de professores em respeito exclusivo pela lista nacional graduada, sem qualquer cedência, como seria a possibilidade da contratação direta de docentes pelas escolas e/ou municípios;

8. A atribuição de ajudas de custo e subsídios de alojamento adequados e eficazes, que resolvam de vez os graves problemas de habitação dos professores deslocados;

9. O fim das quotas no acesso ao 5.º e 7.º escalão e um modelo de ADD justo, motivador e transparente, com divulgação pública das classificações;

10. O respeito pela autonomia científica, pedagógica e didática dos docentes, recusando o “totalitarismo” pedagógico em voga, com a imposição de metodologias de ensino,  teorias, modelos e práticas, importadas de outros contextos e realidades, muitas vezes sem sucesso comprovado, ao sabor de modismos e “impressões digitais” governativas, prescritas numa política “top to down”, excludente de outras abordagens pedagógico-didáticas e experiências educativas;

11. Uma maior e melhor articulação com as instituições de Ensino Superior, assegurando uma formação  inicial exigente e de qualidade que prestigie a profissão, e também uma formação contínua que garanta a permanente atualização científica e pedagógica dos docentes, sendo aqui de sublinhar a importância dos Centros de Formação, que deverão ter mais autonomia e recursos financeiros para o desenvolvimento dos seus planos de formação;

12. A redução das horas da componente não letiva, pois a CNL tem sido, ao longo dos anos, um dos maiores fatores de exaustão e desgaste profissional, não só esvaziando por completo a redução do tempo de serviço letivo (ao abrigo do artigo n.º 79), mas também amarrando os professores às escolas em tarefas muitas vezes não adequadas ao seu perfil e sem ganhos significativos de produtividade na dinâmica escolar. Desse modo, seriam criadas condições para estimular a autoformação docente (com a frequência de seminários e colóquios, etc.). Paralelamente à redução das horas da CNL, seria fundamental assegurar a possibilidade de uma efetiva formação e atualização científico-pedagógica, relativa à formação contínua, à frequência de cursos especializados ou à realização de investigação aplicada, com a fixação do contingente previsto no n.º 1 do artigo n.º 108 do ECD (licenças sabáticas), a aguardar despacho governamental há mais de uma década;

13. A revisão dos programas das diversas disciplinas, procurando-se um correta articulação horizontal e vertical e a sequencialidade dos ciclos de ensino;

14. A reconfiguração das cargas horárias das áreas curriculares, revalorizando-se as Ciências Socias e Humanas e eliminando o conceito de “disciplinas estruturantes”;

15. A redução do número de alunos por turma e a definição de um limite máximo de turmas por professor, evitando-se situações injustas de sobrecarga de trabalho entre docentes;

16. O respeito efetivo pelas reduções no âmbito da aplicação do artigo n.º 79 do ECD, que deverão voltar a ser atribuídas nos limites de idade originais e transferidas para a componente de trabalho individual do professor;

17. O reforço substancial da redução horária atribuída ao cargo de Diretor de Turma, hoje por hoje, um dos cargos de maior responsabilidade, envolvimento pessoal, desgaste e dispêndio de tempo por parte dos professores que assumem esta função;

18. A revisão da carga horária dos educadores e professores em monodocência, assegurando uma maior igualdade na componente letiva comparativamente a colegas de outros ciclos de ensino e a aplicação do artigo n.º 79 sem alíneas discriminatórias ou necessidade de  autorização prévia;

19. A possibilidade de uma aposentação antecipada, sem penalização, para quem tenha completado 36 anos de serviço e/ou 60 anos de idade, por forma a combater a exaustão, o “burnout”, e evitar as baixas médicas prolongadas (mais do que justificadas, dadas as condições em que muitos docentes exercem a sua profissão), promovendo-se também o rejuvenescimento dos quadros;

20. A alteração dos critérios e uma maior transparência do regime da mobilidade por doença (MPD), pois as doenças (com listagem/descrição por atualizar há longos anos) não obedecem a quotas/vagas, ainda para mais não publicitadas no início do processo de mobilidade, ou a distâncias mais ou menos alargadas, ofensivamente contadas em linha recta;

21. A possibilidade de integração na CGA de todos os docentes que manifestem essa intenção, em particular os que foram injustamente excluídos no passado, evitando-se assim situações totalmente inaceitáveis de discriminação;

22. A eliminação das tarefas e registos burocráticos inúteis, redundantes e de nula/questionável eficácia ou justificação, devolvendo tempo ao professor para a preparação das atividades letivas, entre outras, relacionadas com a docência;

23. O abandono da injusta comparação entre escolas públicas e privadas, através dos “rankings” de resultados em exames, pois é impossível e falacioso comparar o incomparável, desde logo, porque a Escola Pública não segrega, não exclui, não seleciona, inclui todos e é com todos que desenvolve o seu trabalho e se apresenta a exames;

24. A prevenção e o combate efetivo à indisciplina, à violência e ao bullying em meio escolar, pois o respeito e o cumprimento das regras e normas de conduta são a base do ato educativo e todos os elementos da comunidade escolar têm o direito a um ambiente de trabalho seguro e motivador, sem esquecer o pessoal não docente, tantas vezes esquecido e pouco valorizado não só no interior das escolas mas também pelos governos, nomeadamente nos salários e condições de trabalho;

25. Por fim, mas não menos importante, a criação de um clima de diálogo e respeito mútuo entre a tutela e os professores, que permita negociações sérias e resultados céleres e concretos, dando resposta às justas reivindicações docentes e eliminando práticas e posturas arrogantes, provocatórias e de falta de respeito em relação aos profissionais de educação, de que são exemplos… a suspeição constante sobre as baixas médicas (que em boa parte deixariam de existir se o Estado tivesse mantido a reforma após os 36 anos de serviço, impedindo desse modo o brutal envelhecimento da classe docente, entre outros fatores de desgaste causadores de muitas dessas baixas), a determinação de serviços mínimos “à la carte” que colocam em causa o direito à greve (reiteradamente considerados ilegais pelos tribunais), os atropelos e abusos na composição dos horários docentes,  a insensibilidade face a situações de agressão perpetradas por pais e alunos (com o silêncio dos responsáveis políticos, incapazes de assumir uma posição firme de repulsa e condenação), a recusa da mobilidade por doença, com a aplicação de critérios desumanos e injustos, e a incapacidade em resolver o problema da “casa às costas” de largos milhares de docentes ao longo de muitos anos, numa vida de precariedade, dificuldades financeiras e sonhos adiados.

São estas as 25 propostas e desafios essenciais que apresentamos em defesa da Escola Pública, pilar fundamental do nosso regime democrático e fator determinante de justiça social, de uma Educação de qualidade para todos e de um País com Futuro! Para tal, é imperioso que se respeitem e valorizem os professores!

Porque sem professores não há Educação!

E sem Educação não há progresso, nem futuro!

Fátima Inácio Gomes – Depois de Bruxelas

Em jeito de balanço… tanto que teria a dizer, mas os tempos atuais são de textos breves, por isso procurarei ser breve.

Da minha/nossa ida a Bruxelas destaco dois aspetos que, para quem espera mudanças efetivas, pode ser pouco, mas é desse espírito que as grandes mudanças se fazem: Generosidade e Simbolismo.

A GENEROSIDADE viu-se ontem, na forma como muitas pessoas se dispuseram a sair de casa, no fim de um dia de trabalho, para nos receberem no aeroporto. Vi-a no ato espontâneo e generoso de muitos colegas do meu agrupamento, Barcelos, que no domingo passado me enviavam contributos pelo mbway para me ajudarem na minha despesa com o voo/estadia/tranfers. E não só eles, também colegas que nem conheço (!) da Pedro Barbosa, em Viana. Aconteceu o mesmo com outros colegas que foram a Bruxelas, apoiados pelos seus colegas. Só gestos destes valem mais do que todos os ministros juntos. Estes também tratam dos seus amigos, mas com o dinheiro dos outros e esperando dividendos. Estes professores ajudaram com o seu e sem mais interesse que o de apoiar uma causa. Uma causa nacional e não apenas de um coletivo. E é graças a pessoas destas que podemos acreditar que há Humanismo nas escolas.

Quanto ao SIMBOLISMO… desde 2008 que ando a dar a cara por algo que acho fundamental e desde aquele primeiro momento o referia (não faltam textos públicos para o provar): o futuro da escola pública, pedra basilar para uma sociedade capaz, evoluída, de progresso. A sociedade que eu quero para o meu país. E o que tenho visto são sucessivos governos sem qualquer visão do futuro, fazendo a gestão corrente e miúda de problemas, muitos criados pela própria incompetência e interesses subreptícios. Não vejo no Governo atual, nem nos partidos da Oposição, sentido de Estado, visão de Futuro, planeamento a longo prazo. Por isso, confesso-vos, não tenho o entusiasmo e a fé que vi em tantos que me acompanharam a Bruxelas. Contudo, mesmo quando descremos dos que nos governam, ou especialmente aí, temos de ser capazes de nos erguer. É na adversidade e na “apagada e vil tristeza” (sempre Camões!) que se testa o carácter. Daí o Simbolismo: “Não paramos” tem sido o grito mais ouvido, e importaria que não apenas nós, professores, obedecêssemos a esse grito. Devemos exigir aos nossos governantes o tal sentido de Estado, devemos exigir a todos os políticos, os da oposição incluídos, a defesa do interesse comum em tempos de tanta adversidade, e não a defesa dos seus interesses partidários com vista ao pedaço apetecido.

Possivelmente, esta sim é a aula que os professores estão a dar, e que devem dar, já que a sua função é ensinar: já basta de sermos esse povo afundado na “austera, apagada e vil tristeza”, basta de sermos esta “coletividade pacífica de revoltados” do Torga.

Eu não apelo à queda do Governo… não acredito em nenhum dos que se perfilam para o suceder: eu apelo é à exigência e à intransigência com quem nos governa.

É hora de sermos, todos, ouvidos, respeitados.

Na luta, como na vida, mais vale tarde que nunca…

Tendo sido, enquanto professor e membro da APEDE, ao longo destes anos de luta, bastante crítico da forma como as cúpulas sindicais foram conduzindo a ação reivindicativa dos professores, nomeadamente com memorandos e acordos de triste memória, ao arrepio dos apelos das bases para uma luta mais dura e no “osso” (recordo “apenas” as intervenções dos professores no 15 de Novembro de 2008 e as moções aprovadas nos Encontros de Escolas/Professores em Luta, em Leiria, entre outras tomadas de posição públicas dos movimentos e de diversos bloggers) não posso deixar de reconhecer e afirmar que mais vale tarde que nunca!

A marcação, finalmente(!!!), de uma greve “a doer”… como há longo tempo muitos de nós exigiam, veio a revelar-se um fator importante e decisivo nesta luta. Poderia questionar as razões da demora, pois sempre acreditei (ao contrário de muitos dirigentes sindicais) que os professores não falhariam numa greve às avaliações e aos exames, desde que sentissem força e determinação nos negociadores sindicais e podendo neles confiar. Por outro lado, tenho dúvidas que os sindicatos (e o governo) acreditassem na tremenda adesão dos professores a esta greve. A verdade indesmentível é que ela foi muito expressiva, muito de dentro, muito “do terreno” e muito bem organizada e gerida nas escolas, pelos professores. Isto prova que a maioria deles estão disponíveis para lutar, e mesmo sacrificar parte dos salários, desde que percebam que pode valer a pena, que faz todo o sentido, que tem peso político efetivo, e sobretudo, que não serão “traídos”, ou abandonados na luta, em troca de um “prato de lentilhas” (ou pizza para quem assina).

Quanto aos resultados obtidos com esta greve, e é isso que mais importa referir neste momento, faço uma primeira leitura clara, positiva, afirmativa, e sem subterfúgios ou meias palavras:  esta ata negocial, se vier a traduzir-se integralmente em normativos legais representa, no contexto atual, um ganho efetivo para os professores, em diversas matérias, e uma vitória incontestável das estruturas sindicais e dos seus líderes, em particular da FENPROF e de Mário Nogueira! É por isso que repito: luta assim… mais vale tarde… que nunca!

Não é possível escamotear (e foi importante a insistência para que tudo ficasse escrito e com redação inequívoca) que estão expressos naquela ata negocial ganhos reais para os professores: quer quanto à componente individual, quer quanto às atividades que podem ser consideradas letivas (na prática dificilmente haverá horários zero, e isso só acontecerá com diretores tiranetes e apenas se os professores nessas escolas facilitarem e cederem – sendo a culpa, nesse caso, dos professores… capados!!! dos CG’s e dos CP’s!), quanto à DT… que cresce para 100 minutos e fica na letiva, quanto à passagem à reforma dos docentes que solicitaram aposentação, quanto à manutenção (pelo menos por agora) do artigo 79. E mesmo para os contratados, apesar de tudo, também há algumas (é verdade que deveriam ser mais) boas notícias: a redução dos DACL’s, a manutenção da DT na letiva e as aposentações até Agosto (sem atribuição de horário em Setembro), representam, em princípio, mais horários disponíveis para as necessidades residuais e contratações de escola. Não chega, é certo, mas o próximo Setembro, que se adivinhava ser o mês do adeus definitivo para muitos milhares de contratados, poderá não ser assim tão negro. Aqui, como em muitos outros domínios, a luta tem de continuar. A começar pelo combate à precariedade, pela abertura de concursos de afectação com as vagas reais declaradas, passando pela urgentíssima reformulação do modelo de gestão não democrático, pela formação contínua estupidamente obrigatória em tempos de congelamento (que não pode manter-se indefinidamente), pelo nº de alunos por turma, etc. etc.

O problema maior que persiste e o mais grave de todos (a par da precarização dos contratados) é, sem dúvida, a quebra do vínculo… não sendo despicienda a questão da mobilidade geográfica (60km é muito km, pois significam na prática 120 km dia, situação que considero muito penalizadora – e sim, eu sei que há quem faça ainda mais e há muito tempo! Inaceitável!). Nesta questão da alteração dos vínculos, sabemos que ainda terá de passar pelo Tribunal Constitucional, precisamos de manter a pressão alta e nada impede que a luta regresse, em força, para se evitar este atropelo às normas constitucionais e aos direitos e garantias que delas emanam.

Resumindo: nos tempos que correm, e face ao modo como o governo tem atacado os funcionários públicos e, em particular, os professores, este foi, na minha opinião, um “acordo” bastante satisfatório e provou que a luta, quando é “no osso”, vital, significativa, politicamente dura e operativa, é melhor compreendida e apoiada pelas bases, tendo resultados efetivos e pode ser concluída (por agora) com a sensação de que valeu a pena!!! Importa, assim, felicitar os professores, por mais um exemplo da sua capacidade de resistência e de luta, que pode e deve ser acompanhada e replicada noutros sectores, a que acresceu, em muitas escolas, a solidariedade financeira demonstrada, com a organização espontânea de fundos de greve que permitirão aliviar (ou mesmo anular – e sei do que falo) o corte salarial dela decorrente. Este é um ponto que deveria merecer reflexão, muito atenta, por parte das direções sindicais. A constituição de um fundo de greve é possível, é desejável, e deveria passar a ser uma preocupação e um objetivo dos sindicatos de professores.

Concluindo: fica uma sensação positiva, pessoal e coletiva, de dever cumprido dos professores com esta greve, exceptuando alguns, quiçá muitos, “amarelos primários” (sem nenhuma intenção de desrespeitar ou generalizar quem agiu de outro modo na luta, pois a democracia é isto mesmo), que não conseguiram ou não quiseram compreender a importância desta hora e, em termos de resultados obtidos (salvaguardando desde já a possibilidade do manda-chuva Gaspar atirar a ata  para o lixo o que, como se sabe, depende muito da meteorologia), dizer que, dado o contexto político e económico, não podemos lamentar ou repudiar as assinaturas sindicais de ontem. Nem sequer duvidar de que a luta deve mesmo continuar, como foi dito!

Um último apontamento para os invejosos sociais de outros sectores profissionais (que não lutam pelo seu progresso, e melhoria de direitos, mas sim pela regressão dos direitos dos outros): considero particularmente delicioso, e justíssimo, que o aumento das 5 horas de trabalho seja todo refletido na componente individual (fazendo fé no texto assinado pelas partes). Por aí até poderiam considerar muito mais de 5 horas. E pagá-las… já agora!

Abraço a todos e como diria, mais ou menos, o eterno Mário Nogueira: “quem luta nem sempre ganha, mas quem desiste será sempre derrotado!”

Até concordo!

Ricardo Silva (APEDE)

Manifesto Para Uma Luta Necessária

Em 2008, os professores dos ensinos básico e secundário souberam organizar-se na luta pelos seus direitos profissionais e pela defesa da Escola Pública, lançando um movimento reivindicativo sem precedentes em Portugal. De norte a sul do país formaram-se grupos e movimentos independentes de professores, à margem dos sindicatos, fizeram-se centenas de assembleias em escolas, realizaram-se diversos encontros à escala nacional e, quando as direcções sindicais finalmente acordaram para o fenómeno que estava a ocorrer, duas manifestações em Lisboa juntaram a maior concentração de uma só classe profissional que alguma vez se verificou neste país. Uma terceira manifestação, que congregou mais de 2 mil pessoas, foi promovida por movimentos independentes, sem quaisquer apoios logísticos e lançada na base dos contactos em correio electrónico, antecipando assim o que vieram a ser, mais tarde, as grandes manifestações convocadas nas redes sociais.

Os professores estiveram então no centro da atenção mediática e, por algum tempo, fizeram tremer o ministério de Maria de Lurdes Rodrigues e o governo de Sócrates. Nessa altura, o motivo de uma tão grande mobilização era um modelo de avaliação do desempenho absurdo, burocrático e gerador de desigualdades espúrias, a par de uma estrutura da carreira docente que criava divisões ilegítimas e despropositadas entre docentes. Ao lutarem contra estes ataques à sua profissão, os professores batiam-se também pela qualidade do ensino, que viam ameaçada por decisões políticas que degradavam a qualidade das suas condições de trabalho.

Sabemos bem o que sucedeu a seguir. As direcções sindicais, inicialmente aturdidas por uma movimentação que lhes escapava, conseguiram retomar o controlo das iniciativas, procederam a uma desmobilização maciça nas escolas e encetaram um processo negocial com o Ministério da Educação cujo resultado defraudou a maior parte das expectativas dos docentes. De então para cá, a classe dos professores foi somando derrotas atrás de derrotas. Com a ascensão ao poder do governo da dupla Gaspar/Coelho, a imposição mais agressiva do austeritarismo como política, iniciada pelo PS de José Socrates, tem tomado as funções sociais como alvo a abater e tem-se concentrado, em especial, no desmantelamento da Escola Pública e do que ainda resta de um ensino pautado pelos princípios da integração social e do acesso democrático ao conhecimento e à qualificação dos portugueses.

O programa governamental de destruição da Escola Pública assenta na deterioração dos direitos laborais dos professores, na sua máxima precarização, na eliminação planeada de postos de trabalho, objectivos que foram recentemente alcançados com a reorganização curricular e com uma nova metodologia para o cálculo das horas de trabalho. Porém, não contente com isso, a clique que nos desgoverna, a mando de uma “troika” que ninguém elegeu e à qual o governo tem alienado toda a soberania nacional, prepara-se para aumentar a carga lectiva dos professores. Passar de 35 para 40 horas semanais é agora o novo método concebido para lançar no desemprego cerca de 50 mil docentes – a grande finalidade que este governo afixou para a política de ensino em Portugal.

50 mil professores desempregados constitui, desde logo, um drama profundo para profissionais que dedicaram já muitos anos da sua vida a um trabalho que qualquer nação civilizada saberia valorizar e acarinhar. Muitos desses professores tornar-se-ão desempregados de longa duração e terão grande dificuldade em encontrar empregos compatíveis com as suas elevadas qualificações. Mas a essa tragédia pessoal somar-se-á a catástrofe para o sistema educativo português: os docentes que se mantiverem no activo verão as suas condições de trabalho degradar-se a um ponto que pareceria impensável. Ficarão com turmas sobrecarregadas, sem possibilidade de qualquer acompanhamento individualizado dos alunos, e com um horário laboral absolutamente esgotante numa profissão que, por si mesma, já coloca sobre os professores uma enormíssima pressão e um considerável desgaste físico e psíquico.

O governo e os serventuários que fazem a sua propaganda nos órgãos de comunicação pretendem justificar esta medida com o argumento de que 40 horas semanais é já o horário normal do sector privado. A isto respondemos: para além de este ser um discurso sempre apostado em nivelar por baixo os direitos e as condições laborais, ele revela também uma imensa ignorância e insensibilidade em relação às exigências específicas do acto de ensinar, as quais requerem tempo necessário à preparação das aulas, à transmissão do saber, à avaliação dos alunos e à energia anímica que tudo isso implica. Uma carga lectiva de 40 horas semanais tornará impossível o cumprimento desses requisitos com um mínimo de qualidade. Portanto, não serão só os professores que ficarão a perder: serão também os alunos, os encarregados de educação e a sociedade no seu todo. A semana de 40 horas, a concretizar-se, vai ser a medida que faltava para a destruição definitiva e irreversível da Escola Pública de qualidade. No seu lugar restará apenas uma ruína insustentável e grotesca.

Por isso, dizemos: é tempo de os professores regressarem à mobilização colectiva, é tempo de superarem os medos e a resignação, de recusarem os argumentos falaciosos da austeridade inevitável e da precariedade como destino colectivo, de saírem do buraco onde uma governação miserável os quer meter, de ultrapassarem divisionismos e calculismos individuais, de abandonarem a táctica do “salve-se quem puder” e a ilusão de que “o mal só acontece ao colega do lado”, “ao que está no último lugar da lista graduada”. A sanha sociopática dos governantes actuais vai afectar todos e ninguém estará seguro perante gente tão empenhada em demolir o Estado Social e em construir um Estado mínimo para quem trabalha e máximo para quem vive de mordomias e de negócios protegidos. Chegou o tempo de os professores lutarem, novamente, pela sua dignidade, por um sistema de ensino decente e pelo futuro do país.

Assim, apelamos a que os professores se organizem de modo a efectuar assembleias de escola onde possam debater a situação actual, o futuro da sua profissão e da Escola Pública em Portugal, e as formas de luta a travar contra a semana das 40 horas.

Apelamos a que os professores, nos Conselhos Gerais e em contactos directos com as associações de pais, se juntem aos encarregados de educação e a outros sectores locais com representação nas escolas, de modo a criar uma mobilização conjunta, transversal à sociedade portuguesa, no combate contra o aumento da carga lectiva e de todas as demais formas de destruir o ofício de professor.

Apelamos a que os professores pressionem, das mais diferentes maneiras, as direcções regionais e nacionais dos sindicatos para que formas de luta eficazes possam ser concretizadas nos locais de trabalho. Os sindicatos têm apostado tudo nos protestos de rua, desinvestindo totalmente no combate desenvolvido dentro dos espaços laborais. Está mais do que demonstrado que essa estratégia redunda em derrotas sucessivas para os trabalhadores. O tempo é de lutar onde dói mais ao governo e aos beneficiários das políticas austeritárias. A multiplicação de greves regionais, sectoriais e nacionais, articuladas num programa continuado e coerente de luta, a multiplicação de modalidades de desobediência civil no interior das escolas sempre que estiver em causa decisões arbitrárias e injustas, são recursos que os professores têm ao alcance da mão, mas que só podem ser utilizados se as direcções sindicais, por uma vez na vida, estiverem à altura de quem dizem representar.

Desde o 25 de Abril que a sociedade portuguesa não enfrenta uma hora tão grave como esta. Um dia a memória futura chamará à responsabilidade quem podia ter agido e, em lugar da acção, optou pela inércia e pelo silêncio. Este é o momento de cada professor português responder a essa responsabilidade.

 Mário Machaqueiro

Purificando o ar

Nunca definimos aqui uma política restritiva em relação às caixas de comentários. Porque entendemos que um blogue é também (ou pode ser) um fórum de discussão, de troca de ideias, de debate que, sendo por vezes aceso, deve visar a construção de pensamentos partilhados. Mesmo quando a partilha implica a divergência.
Mas é claro que um blogue desta natureza, que não foge à controvérsia e que incomoda pela sua atitude de dissidência relativamente aos pretensos donos da “luta”, expõe-se a ser visitado pelos cães-de-guarda do situacionismo político. Estes não estão interessados em manter um debate com um mínimo de elevação. Estão apenas apostados em poluir a atmosfera com os seus métodos habituais: a difamação e as insinuações desonestas, a distorção dos argumentos, a tresleitura permanente, as “bocas” parvas, etc., etc.

Quando o “debate” desce a este nível, a tentação é acompanhar-lhe a tendência e responder com troco do mesmo jaez.

Para evitar semelhante trajectória, que só faz perder tempo a quem procura, nas nossas caixas de comentários, algo que tenha efectivo interesse, tomámos uma espécie de decisão editorial: doravante, quem entre aqui a querer puxar a conversa para o nível da chinela e do chocarreiro, tem o destino traçado: vai direitinho para o caixote do lixo.

Por enquanto, não vamos optar, como outros se sentiram forçados a fazer, pelo condicionamento ou pela filtragem prévia dos comentários. Sabemos como isso é aborrecido e frustrante para os que pretendem expor as suas opiniões de maneira sadia. Mas não hesitaremos em fazê-lo se for esse o único meio de travar o cano de esgoto.

Estamos entendidos?

A ADD no Semanário SOL e as respostas (completas) da APEDE

Semanário SOL, pág. 16, edição de 1-4-2011 (clicar na imagem para ampliar)

Reproduzimos, de seguida, as questões que nos foram colocadas pela jornalista Margarida Davim e as respostas na íntegra:

Nas escolas, que trabalho foi já feito de acordo com este modelo de avaliação do desempenho?

Nalgumas escolas já se verificaram assistência a aulas, noutras houve pedidos de esclarecimento relativamente aos indicadores e descritores (esclarecimentos que ninguém conseguirá dar, de forma precisa e esclarecedora, dada a forma absurda e profundamente incompetente como foram formulados). Há pois escolas que estão numa fase muito inicial e, mesmo noutras, onde o processo estará mais adiantado, sabemos que existem sérias dificuldades na operacionalização. A noção óbvia que prevalece é a de que, para se concluir este processo avaliativo, com este modelo de ADD, seria necessário fechar muito os olhos à razão, à justiça e à seriedade profissional.

Aquilo que já tinha sido feito nas escolas é, de acordo com a informação de que dispõe, muito semelhante? Ou há escolas em fases muito diferentes deste processo?

A verdade é que este processo foi decorrendo com calendários díspares de escola para escola, em parte pelas razões acima referidas, mantendo-se até um certo secretismo no desenvolvimento de cada uma das várias fases de aplicação do modelo, em cada escola, pois as CCAD não se pautam inteiramente pela transparência de procedimentos, fora do grupo restrito dos professores avaliadores. Como referi acima há realmente escolas em fases muito diferentes do processo.

Com a suspensão deste modelo, os professores devem entregar um relatório de auto-avaliação para poderem ainda beneficiar de uma avaliação?

De acordo com a norma transitória aprovada na AR, os professores deverão ter uma “apreciação intercalar” com vista à conclusão deste ciclo avaliativo. Logicamente, os professores não poderiam perder o tempo de serviço correspondente a estes dois anos de trabalho, que efectivamente cumpriram, tendo em vista a progressão futura na carreira (por agora congelada).

Com as progressões na carreira suspensas, que benefícios terá ser avaliado?

Com o actual modelo de avaliação, em termos formativos e de melhoria das práticas, absolutamente nenhumas. A única vantagem é a salvaguarda do tempo de serviço. Convirá insistir num ponto: os professores nunca deixaram de ser avaliados, nunca deixaram de se confrontar com as suas práticas, no sentido da reflexão e melhoria, quer em termos individuais, quer no trabalho desenvolvido no seio dos seus grupos disciplinares, departamentos e demais órgãos de gestão escolares.

Como é que foi recebida pelos docentes a notícia da suspensão deste modelo?

Naturalmente com satisfação, pese embora o atraso nesta tomada de decisão que já deveria ter acontecido, pelo menos, no final de 2009. A sensação que tínhamos, e agora confirmamos, é que a Razão teria de acabar por triunfar sobre as campanhas de manipulação da opinião pública, e as mentiras sobre a avaliação dos professores, que se multiplicaram, com origens diversas, nestes últimos dois, três, anos e também sobre as injustiças, arbitrariedades, incompetência técnica e iniquidades diversas que decorrem deste modelo de ADD.

Como é que comenta a afirmação da ministra Isabel Alçada, quando esta diz que a suspensão foi votada apenas por «motivos políticos»?

A APEDE congratula-se com o fim desta farsa e só lamenta o tempo que se perdeu até que tal fosse conseguido. A sua não suspensão, por parte do governo é que se deveu seguramente a “motivos políticos”, de pura retaliação contra os professores e de bravata política por parte de José Sócrates que elegeu os professores como uma classe a amesquinhar e que ergueu a ADD como uma bandeira que não poderia cair, de modo algum, sob risco de perder a face e sofrer uma clara derrota política. A verdade clara, claríssima e inatacável, é que não há nenhuma razão pedagógica para se manter de pé este modelo de ADD. Não se encontra nele qualquer utilidade ou ganho para a Escola ou para o trabalho de professores e alunos. E o governo, claramente por “motivos políticos” (e também economicistas, bem o sabemos), persistiu nessa imposição cega, contra todo o bom senso, infernizando a vida nas escolas, apenas para não perder a face, em termos de imagem pública. A razão estava do lado dos docentes, esteve sempre e, de uma forma ou de outra, acabaria por vir ao de cima a justeza dos nossos argumentos contra este modelo de ADD. Consideramos profundamente irónico, e até algo patético, que Isabel Alçada venha falar de “motivos políticos” para a sua suspensão, quando a ADD se manteve em grande medida por “motivos políticos”. Só o governo não quis perceber, ou aceitar, as diversas e repetidas evidências de absoluta falência técnica e inexequibilidade da ADD que os professores foram tornando públicas, ao longo dos últimos tempos, através de diversas tomadas de posição, que foram sempre comunicadas ao Parlamento e aos diversos grupos parlamentares.

Houve aqui alguma tentativa de aproveitamento eleitoral por parte do PSD?

Será importante conhecer e avaliar o programa eleitoral do PSD para se perceber melhor se esta foi uma medida avulsa, tomada apenas no momento, com vista a “seduzir” potenciais eleitores, ou se se enquadra numa proposta global para a Educação que seja coerente e orientada para a defesa da Escola Pública, da qualidade do Ensino e da valorização socioprofissional dos docentes. Uma coisa é certa: o PSD já teve oportunidades anteriores para tomar uma posição deste género e não o fez. Isso certamente provocou um descontentamento eleitoral para com o PSD por parte dos professores.

Como deverá ser o modelo de avaliação do desempenho dos professores?

A APEDE apresentou, publicamente (inclusive junto da Comissão de Educação da AR), em devido tempo (Dezembro de 2009), a sua Proposta Global Alternativa, que pode ler-se aqui. Em resumo, e sobre a nossa proposta de modelo de ADD, ficam os seguintes tópicos:

-não deve sujeitar-se aos espartilhos e entropias resultantes da ideologia pedagógica reinante no ME, vulgo “eduquês”, nem ao modelo da “performance” empresarial;

– não deve ser fragmentada em actos parcelares, atomizada e afogada em procedimentos puramente burocráticos;

– não deve basear-se exclusivamente na avaliação entre pares;

– deverá ser essencialmente formativa, tendo apenas reflexos directos na progressão na carreira em duas situações: nos casos de reconhecido mérito excepcional ou naquelas em que se registe um reiterado incumprimento de deveres e obrigações ou manifesta inadequação a funções docentes;

– compreenderá, fundamentalmente, três componentes/modalidades com periodicidade e objectivos distintos:

a) uma primeira componente de auto e hetero avaliação, de carácter exclusivamente formativo, realizada anualmente no âmbito dos grupos disciplinares, com vista a uma análise conjunta das práticas e estratégias desenvolvidas, podendo existir recurso à mútua assistência de aulas, numa perspectiva de partilha e melhoria das práticas.

b) uma segunda modalidade que designamos por avaliação funcional, efectuada no ano correspondente à mudança de escalão, abrangendo o período de permanência no mesmo, a cargo do órgão de gestão executiva (ouvido o delegado de grupo disciplinar) e que focará os aspectos administrativos, de distribuição do serviço e de cumprimento de normas e  objectivos definidos na escola, valorizando também a formação contínua efectuada pelo professor. Desta modalidade de avaliação resultará a atribuição das menções de “Satisfaz” ou “Não Satisfaz”, com diferentes consequências quanto à progressão na carreira e contabilização de tempo de serviço.

c) finalmente, consideramos igualmente necessária uma componente de avaliação externa do desempenho global da escola e dos grupos disciplinares, que identifique e permita corrigir dificuldades ou actuações claramente inadequadas, mas que também possa salientar e difundir boas práticas.

Haverá condições para que a maioria dos professores aceite um modelo de avaliação do desempenho?

Não tenho dúvidas, desde que se resolva o problema da burocracia e da credibilidade e competência dos avaliadores, se desligue a avaliação de desempenho da existência de quotas na progressão (a avaliação poderá ter relação com a carreira, acelerando-a ou atrasando-a, de acordo com as condições que defendemos na nossa proposta de ADD) e que a avaliação de desempenho contemple uma forte componente formativa e de melhoria das práticas.

Neste contexto, que importância terá a Marcha pela Educação, promovida pelos sindicatos, no dia 2 de Abril?

Deixámos de acreditar nos actuais dirigentes sindicais, comprometidos que estão com a assinatura de “Memorandos” e “Acordos”, e feridos na sua credibilidade por um conjunto de coreografias negociais que apenas atrasaram a luta dos professores e não têm resolvido os seus problemas, sentidos no dia-a-dia nas escolas. Entendemos mesmo que urge uma renovação nas estruturas sindicais e nos seus estatutos e funcionamento, e um refrescamento da “praxis” de luta, abandonando velhos vícios e rotinas, sustentado num diálogo concreto e comprometido com a base dos professores, escola a escola, com vista a um acréscimo de representatividade e credibilidade, não só junto da classe mas, também, perante a opinião pública. E isso já não nos parece possível com os actuais dirigentes, cuja agenda reivindicativa e estratégia de condução da luta são, no essencial, tributárias da agenda política dos partidos que os controlam. Esta “Marcha da Educação” surge como mais uma iniciativa avulsa e sem consistência, uma simples prova de vida, um acto que não se articula com um plano de luta coerente e consequente. Marcha da Educação que foi lançada a partir de uma Plataforma de instituições que já se desuniu e que não dá mostras de qualquer unidade e coerência de propósitos.

Com a dissolução da Assembleia da República, que medidas de política de Educação ficam em suspenso?

Há outros temas na agenda dos professores que devem continuar a merecer a atenção de um futuro governo e, claro está, do Parlamento:

– a alteração do actual modelo de gestão, que deve ser revisto, no sentido de fazer regressar a democracia plena às escolas;

– a necessidade de se reabrir a revisão do ECD para acabar, de vez, com desigualdades na progressão entre professores (entre outros aspectos);

– a importantíssima questão dos mega-agrupamentos, que tem apenas por base intuitos economicistas, sem se cuidar, minimamente, da qualidade do Ensino, da identidade própria de cada escola e respectiva comunidade escolar, dos aspectos organizativos e de gestão, sem falar da segurança dos alunos, entre outras questões;

– a situação dos professores contratados, eternamente precários, que urge resolver;

– o Estatuto do Aluno que continua a merecer reparos e correcções, nomeadamente no que respeita às situações de indisciplina (o Parlamento aprovou medidas de criminalização do “bullying”, que agora ficaram suspensas), sua prevenção e combate;

– a reformulação curricular e dos programas, a requalificação dos espaços escolares, etc.

Balanço da Concentração/Vigília de Professores, organizada pela APEDE, em Sintra.

Na sequência da iniciativa de luta que a APEDE promoveu nas Caldas da Rainha, em 28 de Janeiro último, voltámos ontem à rua, em Sintra, com a mesma determinação e convicção de sempre, fundada nas justíssimas razões de luta que, publicamente, mais uma vez, afirmámos:

– a exigência da suspensão imediata do actual modelo de avaliação (?!) de desempenho (que todos sabemos não ser sério nem rigoroso, mas sim profundamente injusto, arbitrário, perverso, burocrático, não formativo, tecnicamente incompetente, potenciador de conflitos e um óbice ao desenvolvimento do trabalho cooperativo dos professores) e a sua substituição por um outro modelo mais consensual e que seja exequível e justo;

– a frontal discordância face à anunciada intenção de constituição de Mega-Agrupamentos em Sintra (que poderão ultrapassar os 3500 alunos), exemplo claro de que este governo não tem qualquer ideia de Escola Pública, muito menos da sua defesa, mas apenas intenções economicistas, com cortes cegos que colocam em causa a identidade das Escolas, os seus Projectos Educativos, e a qualidade do Ensino;

– a recusa das medidas de reorganização curricular que nunca tiveram por base critérios pedagógicos, mas apenas  economicistas (transformando, cada vez mais, o ME numa mera dependência administrativa do Ministério das Finanças), medidas que, felizmente, foram ontem derrotadas no Parlamento (por uma oposição que, finalmente, soube unir-se colocando acima de interesses conjunturais, de índole político-partidária, os interesses superiores da Nação),  e que forçaram a ministra da Educação (?!) e o governo a deixarem cair a máscara das boas intenções pedagógicas e da melhoria do ensino, emergindo a verdadeira face de um governo refém da sua incompetência, já muito longe dos sorrisos nas salas de aula, onde alunos  (convertidos em figurantes) exibiam os Magalhães do regime, perante a desfaçatez do “ilusionista” que nos (des)governa;

– o reforço das redes de contacto e mobilização docente, com vista à multiplicação de atitudes de resistência nas escolas (com a tomada de posições públicas de recusa deste modelo de ADD, por exemplo) e de protestos públicos face às actuais políticas educativas (que irão continuar, já o sabemos);

– finalmente, e fundamentalmente, a afirmação da dignidade profissional docente e a exigência de respeito pelos professores, vergonhosamente desconsiderados pela tutela nos últimos anos.

Quando aos objectivos que nos propunhamos atingir, com esta iniciativa de luta, podemos afirmar que eles foram  conseguidos, embora lamentemos a falta de comparência de muitos professores que poderiam ter estado connosco e não estiveram. Valeu a pena continuarmos a manter acesa a chama da resistência, valeu a pena perceber que continuamos a ter professores que não desistem e se mantêm activos nesta luta, valeu a pena rever muitos professores e activistas de sempre, e ficou bem claro que iremos continuar juntos nesta luta, e nesta caminhada cívica, em prol da Escola Pública e da dignificação da nossa profissão.

Queremos, por isso, saudar e enviar um abraço aos colegas das escolas da zona de Sintra que, resistindo ao frio e ao cansaço de um dia de trabalho, não quiseram deixar de dar o seu contributo a esta luta. Estiveram presentes professores das escolas D. Carlos I, D. Fernando II, Montelavar, Secundária de Sta. Maria, Visconde de Juromenha, Secundária de Mem Martins, Ferreira de Castro, Secundária Ferreira Dias, Secundária Matias Aires, Fitares e, provavelmente, de algumas outras que não conseguimos identificar (um abraço também para os colegas que vieram, propositadamente, do Entroncamento). Aos professores e activistas de sempre, muitos deles vindos de longe, fica também o nosso agradecimento e reconhecimento: Paulo Ambrósio, da Frente de Contratados e Desempregados do SPGL, sindicalista de todas as lutas, José Farinha do MUP, André Pestana e Eduardo Henriques do movimento 3R’s, Jaime Pinho do MEP, Paulo Prudêncio (autor do blogue “Correntes”), Mário Carneiro (autor do blogue “O Estado da Educação e do Resto”) e António Ferreira (do núcleo da APEDE das Caldas da Rainha). O agradecimento e o abraço é, naturalmente, extensivo a todos aqueles que não podendo estar presentes, nos enviaram mensagens de incentivo e apoio e também nos ajudaram na divulgação desta iniciativa, através da blogoesfera.

A APEDE não pode também deixar de agradecer o interesse e a disponibilidade da deputada do BE, Ana Drago, que mais uma vez marcou presença ao lado dos professores, e nos falou sobre o trabalho parlamentar desenvolvido, as suas convicções quanto ao presente e futuro desta luta, e as iniciativas que, em breve, o seu partido irá desencadear no Parlamento, nomeadamente, uma proposta de suspensão da ADD, que será discutida em plenário, já no dia 25 de Março. Neste contexto, a APEDE salienta a importância das tomadas de posição de escolas contra a ADD, que têm vindo a suceder-se e podem e devem multiplicar-se nos próximos dias/semanas. É importante sublinhar que a APEDE enviou convites de participação nesta iniciativa a outros grupos parlamentares, tendo obtido resposta por parte do PCP (o deputado Miguel Tiago agradeceu o convite que teve de declinar devido a compromissos já assumidos) e, claro está, do Bloco de Esquerda, através da presença da deputada Ana Drago.

Concluímos afirmando a necessidade e a urgência da continuidade da luta, uma luta que tem de acontecer nas escolas e fora delas, uma luta que se confronta com um certo desânimo e frustração de muitos colegas, cujas razões conhecemos bem, e que se prendem com a forma como o processo foi sendo conduzido pelas estruturas sindicais representativas dos professores, desembocando na assinatura de um Acordo de Princípios que frustrou expectativas e contribuiu para a desmobilização de muitos e muitos colegas. Mas há uma verdade que tem de ser dita: se é verdade que os colegas têm razões para não confiarem nas actuais direcções sindicais e na sua fiabilidade/credibilidade quanto a garantias de uma firme e correcta condução da luta, é também verdade que não têm qualquer razão para desistirem de lutar, para se renderem e pactuarem, dentro das escolas,  com  a concretização da farsa da ADD (sobretudo quando nada os obriga a tal) e com os desvarios de certos Directores “tiranetes”, apenas para referir dois exemplos.  A coerência na luta é um imperativo de consciência. E esse terá de ser um motivo de reflexão, para muitos de nós, se se quiser assumir, com seriedade e verticalidade, as responsabilidades que nos cabem como professores e cidadãos, nesta importantíssima luta  que vimos travando.

A luta tem de continuar, precisa de continuar, e está nas nossas mãos.

Abraço a todos os colegas

NOTA: Indicamos, de seguida, os links da cobertura jornalística da SIC e da Lusa, sobre esta iniciativa de luta, assim como dos posts dos blogs de professores:

SIC, Jornal da Tarde – 5 de Março, 2011 (a partir do minuto 8:50)

Notícia da Agência Lusa

Na Blogosfera:

Sala de Professores

Correntes

O Estado da Educação e do resto

Pérola de Cultura

Esquerda.net

Facebook da APEDE

(Re)começar a mexer: Concentração/Vigília de Professores em Sintra, dia 4 de Março, 21h.

O núcleo de Sintra da APEDE organizará no próximo dia 4 de Março, sexta-feira, pelas 21 horas, junto ao edifício da Câmara Municipal de Sintra, uma Concentração/Vigília de professores que visa reforçar e dar visibilidade pública ao sentimento geral de contestação à actual política educativa.  

As razões desta Acção de Protesto e Luta são, acima de tudo, as seguintes:

– a recusa e a exigência do fim imediato da verdadeira farsa que constitui este modelo de Avaliação (?!) de Desempenho Docente,  dada a sua injustiça,  falta de rigor e seriedade, para além da profunda  incompetência técnica e delirante teia burocrática que o envolve;

– o combate à anunciada constituição de Mega-Agrupamentos em Sintra, por razões meramente economicistas, situação que  irá criar ainda mais dificuldades à gestão das unidades educativas no nosso concelho (nalguns casos poderão atingir cerca de 4000 alunos), descaracterizando totalmente a identidade de cada Escola, fazendo tábua rasa da tão propalada autonomia, agravando a falta de recursos técnicos, materiais e humanos para fazer face aos problemas de insucesso, indisciplina e abandono escolar, comprometendo a qualidade do trabalho pedagógico e cooperativo dos professores (reuniões de departamento com mais de 100 professores)  reduzindo serviços e o número de funcionários administrativos, em suma, colocando em causa a qualidade do Ensino e o funcionamento das Escolas;

– a resistência activa  à ofensiva de precarização laboral perpetrada por este governo que ameaça lançar no desemprego, já em Setembro,  milhares de professores que investiram anos e anos da sua vida  num projecto, num trabalho e  num percurso profissional que se vê agora criminosamente interrompido, com a eliminação/redução de Área de Projecto e Estudo Acompanhado (defendemos a redistribuição dessas horas pelos Departamentos Curriculares), extinção do par pedagógico em EVT, etc.;

– a defesa intransigente da dignidade profissional docente e de uma Escola Pública de Qualidade, seriamente ameaçadas por políticos sem estatura moral e ética para conduzirem os destinos da Nação; 

–  o reforço da mobilização dos colegas (das escolas do concelho de Sintra, mas não só) no sentido de um trabalho conjunto de esclarecimento, denúncia e resistência às actuais políticas educativas. É sobretudo nas escolas que a luta tem de persistir e aprofundar-se. Para isso, precisamos de criar redes de contactos e sinergias de actuação.

É por estas e outras razões, que nunca  deixaremos cair, nomeadamente, o combate ao  actual modelo de gestão, o reforço dos meios materiais e  humanos de apoio ao trabalho dos professores e uma resistência activa à usurpação continuada dos nossos direitos laborais, que apelamos à presença combativa de todos os colegas  nesta Concentração/Vigília de Professores, em Sintra, no próximo dia 4 de Março.

Pára de remoer a tua resignação e vem afirmar a tua dignidade!

O núcleo de Sintra da APEDE,
Ricardo Silva
Eduardo Alves
Cristina Didelet
Isabel Parente
José Manuel Faria

Balanço de uma acção de protesto

Foto da autoria de Mário Carneiro - Blogue "O Estado da Educação e do Resto"

O núcleo da APEDE de Caldas da Rainha agradece a todos os professores que ontem, 28/01/2011, à noite, estiveram presentes na vigília/concentração que teve lugar nesta cidade, correspondendo, assim, ao apelo que lhes foi dirigido. Destaque-se o facto de terem comparecido alguns colegas que, revelando um notável sentido de combatividade, se deslocaram, dezenas, nalguns casos centenas, de quilómetros para participarem numa acção de protesto. Vai ainda uma palavra de reconhecimento para o Ricardo Silva, presidente da APEDE, e para o núcleo de Sintra, os quais, desde a primeira hora, se empenharam na concretização desta iniciativa.

Esta acção de protesto teve como principal escopo dar visibilidade ao mal-estar e ao descontentamento profundo que grassa nas escolas, motivado pela tomada de consciência, por parte dos professores, de que as medidas mais gravosas implementadas no consulado de Lurdes Rodrigues, não só permanecem inalteradas nos seus aspectos essenciais, como têm vindo a ser complementadas, de forma consistente e continuada, por outras que, além de subverterem a identidade organizacional daquilo que até agora conhecemos como Escola Pública, visam aniquilar em definitivo a autonomia intelectual e pedagógica do exercício da docência.

Infelizmente, o nosso intento não foi plenamente conseguido, atendendo ao facto de que um número pouco impressivo de participantes (perto de uma centena) dificilmente cria o assomo de combatividade necessário para converter o queixume inconsequente numa vontade de recuperar a dignidade profissional e de expulsar a burocracia insana que tomou conta das escolas.

Podemos considerar que o momento de realização e a forma de divulgação da iniciativa não foram os mais adequados, que o trabalho preliminar de mobilização foi insuficiente, que as condições meteorológicas foram adversas: estaremos a passar ao lado do essencial.

Certo é que, não havendo capacidade de perseverar na luta, a possibilidade de melhorar as actuais condições de exercício da docência e de impedir a erosão sistemática e continuada dos direitos laborais dos professores será uma miragem.

Colegas e amigos, em qualquer luta há momentos mais e menos exaltantes; é preciso saber lidar com ambas as situações, com elas aprender e, sobretudo, manter a chama da vontade e não desistir!

Concurso 2010/11 – Uma Página Negra do Sindicalismo Docente

A FENPROF veio defender que os professores ultrapassados no concurso, por via da contabilização dos resultados da ADD nas listas graduadas, devem reclamar dessa situação e colocou mesmo, on-line, uma minuta específica para o efeito. O prazo da reclamação parece já ter terminado, embora, na nossa opinião, talvez nem tanto…

Perante tal indicação da FENPROF, há uma pergunta pertinente a colocar: os professores, agora ultrapassados nas listas graduadas, devem reclamar exactamente contra quem?

– Contra José Sócrates? Se sim, por que motivos? Por ter imposto aos negociadores (dos 2 lados da mesa) a aplicação da legislação em vigor sobre concursos (embora iníqua, geradora de injustiças e profundamente perversa) que apenas se conseguiu protelar e nunca revogar?

– Contra os responsáveis do ME que se limitaram a ir sorrindo e adiando, perante o beneplácito e anomia total dos representantes sindicais no que a este assunto diz respeito? Porquê só agora e com base em que compromissos factualmente assumidos e não cumpridos?

– Contra aqueles professores que, aproveitando as quotas deixadas livres pelos que decidiram não pactuar com o modelo de avaliação, exploraram as hipóteses abertas pela legislação de concursos, cuja revogação ficou por conseguir? Será que estes colegas violaram a lei? Muitos deles terão agido de forma oportunista, é um facto, mas não sabíamos todos que isso poderia acontecer?

– Ou… contra aqueles que defraudaram as expectativas de milhares e milhares de professores, rematando a noite da “capitulação” com um lamentável número de “ilusionismo” afirmando, publicamente, que tinha ficado garantido que a avaliação não iria contar nos concursos e que esse era, precisamente, um dos ganhos do “Acordo”? Essa afirmação irresponsável (e sem qualquer suporte nas actas negociais, pré 8 de Janeiro) teve, para além do mais, uma consequência grave: a necessária e imediata contestação foi totalmente esvaziada pois os professores só perceberam que afinal nada estava garantido após a abertura do aviso de concurso. Meses desperdiçados, facto consumado, milhares de professores prejudicados.

Perante isto, contra quem deverão então reclamar os professores?

Mas há mais. E mais grave: ao terem apelado fortemente, num momento chave da luta, à recusa da entrega de OI, os dirigentes sindicais sabiam perfeitamente que, com isso, estavam a retirar a todos aqueles que adoptassem essa forma de luta, a possibilidade de solicitarem aulas assistidas tendo em vista a obtenção das classificações ditas de “mérito”. Todos se recordarão dos lamentos sindicais perante o relativo fracasso dessa forma de luta e das acusações implícitas de falta de firmeza e solidariedade na luta aos que correram a entregar OI. Sendo assim, como será possível aceitarmos, sem indignação e repúdio, que os mesmos dirigentes sindicais que apelaram à não entrega de OI, venham a abandonar todos esses colegas, que resistiram e lutaram, permitindo que lhes puxassem o tapete, de forma perversa e vingativa, não tendo mais para lhes oferecer, neste momento, do que uma mera minuta de reclamação? Como se sentirão esses colegas? Traídos na luta? Já o afirmaram, alto e bom som, muitos deles. Como podem esses mesmos dirigentes sindicais continuar a ignorar as suas falhas e graves erros na condução da luta, “assobiando para o lado” e, sem qualquer pudor, terem ainda sido capazes de afirmar que as actas negociais demonstravam o seu enorme empenho na defesa dos interesses da classe? Não ficou ali absoluta e inequivocamente demonstrado que não conseguiram garantir rigorosamente nada quanto a esta questão, nem sequer um novo adiamento da aplicação da norma legal, que confere a bonificação às classificações ditas de “mérito”, até que os professores pudessem voltar a reagir? Aberto o precedente… será muito mais complicado reverter todo este imbróglio.

Da nossa parte, não podemos deixar de considerar que esta é uma das páginas mais negras da história do sindicalismo docente, pelas gravíssimas consequências que irá ter para a vida de milhares de professores, com danos irreversíveis nas suas carreiras. A nossa solidariedade vai inteira e activa para todos aqueles que acreditaram, confiaram, lutaram, e agora são abandonados à sua sorte, ultrapassados nas listas graduadas, acabando muito naturalmente por chegar à triste conclusão que talvez tivessem feito melhor entregando OI e solicitando avaliação completa. E não colhe argumentar-se que num processo de luta há ganhos e perdas, que nada pode ficar garantido à partida, e que todos estavam conscientes dos riscos das opções que tomaram, porque o que está aqui verdadeiramente em causa é uma falha gravíssima dos “generais” que pouco ou nada fizeram para defender os “soldados” e não souberam, minimamente, controlar as perdas e danos neste “combate” particular. Aquilo que deveria ter sido feito, na nossa opinião, era eleger esta questão como um pré-requisito fundamental, inegociável e inadiável, a salvaguardar, preto no branco, antes do arranque de qualquer tipo de negociações com vista a um eventual “Acordo” com o ME. Foi exactamente isso que a APEDE sempre defendeu, desde o início, publicamente, e diversas vezes na presença dos dirigentes da FENPROF e FNE.

Voltando às reclamações, avancemos agora para um outro ângulo da questão: parece pois, caros dirigentes da FENPROF, que a solução que encontraram para camuflar a vossa incompetência, e total falta de respeito por quem lutou (correspondendo ao vosso apelo de recusa de OI), é a entrega de uma minuta de reclamação, correcto? Colocar colegas contra colegas, em litigâncias judiciais, por mais oportunistas que os donos dos “asteriscos” possam ter sido? É isso?

Não nos espanta o dislate! Sabemos muito bem que esse é um dos recursos da velha cartilha sindical, não mais do que uma tentativa de “atirar areia para os olhos” (com expectativas de eficácia que nos escusamos sequer a comentar, embora aguardemos com muito interesse os respectivos resultados) e um estratagema que já foi, bem recordamos, vergonhosamente usado no passado, nomeadamente, contra os licenciados dos ramos integrados, com estágio pedagógico, que foram também alvo de acções judiciais de reclamação, como muitos se recordarão ainda. Um “circo” absolutamente desprezível e lamentável, agora de novo ensaiado, que não pode passar sem a nossa manifestação de profundo repúdio. Porque isto tem de ser dito, e tem de ser dito sem tibiezas: quem verdadeiramente errou, quem verdadeiramente defraudou expectativas legítimas de luta e mobilização, perante tantos milhares que foram à luta e a assumiram até ao fim, foram aqueles que permitiram que fosse concluído o 1º ciclo avaliativo com a atribuição de classificações e que, não satisfeitos, vieram a assinar, em Janeiro, um “Acordo de Princípios” que não limpava de todo essa “nódoa”, nem impediu as nefastas consequências que agora se apresentam em sede de concursos.

Desde sempre, nos movimentos independentes, alertámos para esta questão e para os potenciais riscos que dela decorriam, pois sabíamos muitíssimo bem que poderia vir a acontecer, exactamente, aquilo com que agora nos confrontamos. Mas, infelizmente, os “donos” da luta não quiseram dar-nos ouvidos. Acusavam-nos de propormos formas de luta irresponsáveis (greve rotativa de uma semana, em Abril/Maio do ano passado) que podiam conduzir os professores para becos sem saída. Pelos vistos, e como este lamentável e gravíssimo problema bem demonstra, os “experts” da luta, os experimentados e sagazes negociadores sindicais, com a tarimba de décadas de luta, foram por outros caminhos, certamente mais seguros e com saídas largas para os professores. Preferiram confiar no destino, talvez na sorte ou, quiçá, em eventuais promessas de bastidores feitas por uma dupla de “fantoches”, sem qualquer poder decisório autónomo, integrantes de um governo sem escrúpulos e sem palavra. Preferiram, em sede negocial, passar o tempo, em reuniões a fio, a discutir índices remuneratórios e regimes de transição (garantindo quase tudo para uns e quase nada, ou menos que nada, para outros), em vez de defenderem e garantirem a justiça, a equidade e a verdade nos concursos de professores. Quando foram acordados para o problema, já a “casa ardia” e, mesmo assim, com o “cheiro a fumo” que alastrava pela blogosfera docente ainda tiveram o desplante de escrever, no seu site, que o “fumo não era fumo” nem o “fogo era fogo” afirmando, no próprio dia de publicação em Diário da República do aviso de abertura do concurso, que a ADD não era considerada. Foi apenas mais um episódio lamentável, mais um exemplo da leviandade com que esta questão foi encarada, num processo de negociação que deveria envergonhar quem o assinou em nome dos professores.

Talvez seja pois chegada a altura, passado todo este tempo de luta, dos professores se interrogarem, muito a sério, se consideram que estão a ser bem representados e bem defendidos nas negociações com o ME e o governo, se entendem que fomos bem sucedidos nesta luta (dela retirando os resultados que exigíamos), e se pretendem continuar a ser representados deste modo. Depois disso, feito o diagnóstico e o balanço do passado recente, é ainda fundamental que avaliem o que estão ou não dispostos a fazer para alterar o “status quo”. Nesse processo, é importante manter presente que, enquanto os estatutos dos sindicatos que temos continuarem blindados, e a limitação de mandatos dos seus dirigentes não passar de uma promessa, eternamente adiada, os recorrentes “soundbites”- “só por dentro é que podemos mudar os sindicatos e melhorá-los” e “os sindicatos são o que os sócios quiserem e fizerem deles”- não passam de “slogans” demagógicos e artificiais e de uma “cortina de fumo” com o objectivo claro de travar a mudança e impedir uma reforma profunda das organizações sindicais. A verdade é que estamos, cada vez mais, necessitados dessa reforma. Ou de um outro caminho. O tempo urge…

NOTA– No passado dia 16 de Junho, durante a audiência da APEDE na Comissão de Educação e Ciência da A.R., esta questão foi apresentada e assumida como um dos problemas mais sérios para a classe, tendo a APEDE apelado para uma intervenção parlamentar no sentido de evitar a repetição desta situação em próximos concursos. A deputada Ana Drago teve ocasião de nos anunciar que o BE irá avançar com uma iniciativa legislativa no sentido de alterar a legislação de concursos, para impedir que as classificações da ADD tenham influência nas listas de graduação. Afirmou ainda, dirigindo-se à deputada do PSD presente, que esperava uma postura diferente deste partido comparativamente ao que sucedeu na votação da suspensão da ADD. Naturalmente, a APEDE subscreve esta preocupação e faz questão de lembrar que foi ontem publicada, em D.R., a Resolução nº 61/2010, aprovada na A.R., com votos favoráveis de toda a oposição, que recomenda ao governo a não consideração da ADD para efeitos de concurso. Recomendação que o governo ignora, fiel ao seu autismo e arrogância de sempre, mas que terá de respeitar se se vier a aprovar, no hemiciclo, uma posição vinculativa. A APEDE manterá sobre esta questão uma atenção permanente e continuará a empenhar-se na alteração da realidade actual.

Mega-Agrupamentos

Esta medida surpreendeu todos pois nada a fazia antever. Não se sabe de estudos prévios, planificação, calendarização, sequer justificação plausível e menos ainda a discussão pública que lhe emprestasse um mínimo de credibilidade. O monstro está em roda livre pelo país e já conta com a total adesão de muitos municípios que aí viram um filão onde esperam ganhar protagonismo, sem se preocuparem minimamente com a verdadeira questão que devia nortear iniciativas como esta:

A eficácia do sistema melhorará em que aspectos??? Claro que não existe nenhuma resposta credível para esta interrogação fundamental. Como em quase todas as medidas em que o governo do Sr. Sousa se vem especializando, o simples equacionar desta questão nem sequer aflora às mentes iluminadas da clique. E a razão é simples. A sua única preocupação é DESTRUIR. Veja-se o que acontece com o fecho das 900 escolas do 1º Ciclo que é outro exemplo paradigmático. No entanto, aqui o poder decidiu avançar com algumas “piedosas” justificações. Uma é a de que é preciso por fim àquele ensino ministrado a meia-dúzia de crianças escrevinhando nas suas velhas lousas perdidas na serrania. É obvio que esse quadro já não existe, mas colhe dividendos a nível da comunicação social e da opinião pública, sempre muito desinformada. A desertificação do interior é para a clique uma noção inexistente. Ao contrário, a realidade é bem diferente. Muitas dessas escolas condenadas foram equipadas nos últimos anos com toda a mais recente tecnologia, bom número de computadores, quadros interactivos, material didáctico do mais actual e muitas até com refeitório completo. O facto de os seus Projectos Educativos terem sido aprovados pela tutela e estarem em vigor não tem qualquer peso na decisão, mostrando assim o profundo desprezo do poder central pelas iniciativas locais e até pelos normativos legais que ele próprio engendra. Urge perguntar. Será que somos um país assim tão rico e perdulário que nos podemos dar ao luxo de deitar ao abandono tantos e tão valiosos meios???

O mesmo se diga do cabedal de experiência e know-how que as dezenas de milhar de professores entretanto aposentados levam consigo, perdas essas que o sistema não tem como repor, sabendo como sabemos o modo como funciona a formação docente. Tanto a loucura dos Mega-Agrupamentos, como o fecho das escolas do 1º Ciclo, como outras iniciativas, inscrevem-se numa ofensiva permanente que visa objectivos da mais baixa política. Eis alguns:

– Rebaixar mais ainda e paralisar a classe docente.

– Precarizar, amedrontar e desautorizar os professores e suas estruturas.

– Avançar no sentido da municipalização forçada do ensino de modo a diluir a perspectiva global que tem de informar todas as lutas docentes.

– Dificultar e impedir a coesão dos docentes com vista a acabar com um sentido de unidade.

– Tornar a classe docente completamente refém da pequena politica partidária em que se move o poder local.

O facto insofismável de estas e muitas outras medidas terem como óbvia consequência uma queda na qualidade da performance do sistema é algo que nem preocupa os (ir)responsáveis, confiantes que estão na grosseira manipulação das estatísticas. Aliás, a melhoria dos resultados está garantida a priori porque um grande número de estabelecimentos de ensino já a inscreveu no seu Projecto Educativo. Milagrosamente, os números já lá estão antes ainda de se saber como. Mas isso também já nem interessa.

José Manuel Faria

(Professor, recentemente aposentado, Membro da Direcção da APEDE)

Fórum Educação – Mesa da Polémica Sobre a Luta dos Professores

Reconhecendo a  importância de um debate sério sobre o passado, o presente e o futuro da luta dos professores, a APEDE marcou presença  na Mesa da Polémica correspondendo ao convite formulado pelo Bloco de Esquerda. Não tendo havido tempo para  mais do que duas rondas de intervenções de cerca de 5 a 7 minutos, consideramos que o debate foi, ainda assim, esclarecedor. Talvez, até, infelizmente esclarecedor.

Da nossa parte, sublinhámos a postura que sempre tivemos de participação e mobilização para a luta, numa perspectiva de defesa da dignidade profissional docente e da qualidade do Ensino e da  Escola Pública, com a apresentação de propostas construtivas, num clima de  abertura e diálogo com todos e em todos os momentos da luta, sem deixarmos de lamentar e criticar a forma como as direcções sindicais foram conduzindo o processo reinvindicativo em diversos momentos, por exemplo, com o Memorando de Entendimento em 2008, com a perda da oportunidade em endurecer a luta em Novembro de 2008, após as greves de Janeiro, ou depois da  Consulta às Escolas em Abril de 2009 (cujos resultados continuamos à espera de conhecer e cuja divulgação não desistiremos de solicitar),  bem como  após a manifestação de 30 de Maio, sem um plano de luta definido, consequente e emanado das bases, terminando com o Acordo de Janeiro de 2010. Quanto a este Acordo, renovámos as críticas que apresentámos logo nos dias seguintes e apontámos a incoerência da FENPROF em ter aceite em 8 de Janeiro um Acordo que não contemplava a grande maioria das 30 exigências que impôs para se chegar a um entendimento e que inscreveu  num documento, enviado ao ME, poucos dias antes. Curiosamente, tivemos ocasião de ouvir, por parte de um dos dirigentes sindicais presentes, que  o programa de acção e luta para este ano estará centrado na questão dos horários, no modelo de gestão escolar e nos concursos, não tendo sido referida a avaliação. Para a APEDE esta é também uma questão fundamental, consideramos que os professores não podem continuar à mercê de mais experimentações e da insanidade que representa qualquer tentativa de aplicação do modelo de avaliação do ME, seja ele completo ou em qualquer versão simplificada/remendada/adaptada. E estamos à vontade para dizer isto porque não nos limitámos a fazer críticas, delineámos e apresentámos um modelo de ADD alternativo, em Dezembro de 2009, como é público.

O futuro da luta dos professores, acreditando que todos estão empenhados em mobilizar os professores para as lutas que temos para travar, e são muitas, terá de passar forçosamente (na nossa opinião e como bem sublinhámos no debate) por uma postura de diálogo com os professores, de regresso efectivo e continuado às escolas, às salas de professores, na base, com reuniões e plenários, num trabalho sindical de proximidade, escola a escola, olhos nos olhos, ouvindo, explicando, fazendo a pedagogia da luta e, acima de tudo, respeitando as opiniões e o sentir da classe! Decidir a luta no topo, adoptar formas de luta sem uma consulta real e efectiva às bases, é certamente um caminho errado, como todos já nos podemos ir dando conta.  Assim como é errado manter, persistir e reforçar  uma postura de arrogância e uma política de “terra queimada” que parece ser o caminho ensaiado, por alguns dirigentes de topo da FENPROF,  no sentido de tentarem silenciar/condicionar todos aqueles que assumem uma postura crítica em relação às suas atitudes e decisões.  Ao fim de todo este tempo ainda não entenderam que essa é uma estratégia  errada, infrutífera e verdadeiramente contraproducente? O debate de anteontem só veio confirmar isso mesmo como, aliás, alguns dos colegas, presentes no auditório, bem referiram. Talvez fosse mais vantajoso, em termos de ganhos de luta, concentrarem esforços na resolução das trapalhadas onde se deixaram enredar, de que  é um lamentável e gravíssimo exemplo a questão da eventual contabilização dos resultados da ADD na graduação a concurso, problema para o qual a APEDE vem alertando, insistentemente, desde 2008 (bastará ler o penúltimo parágrafo deste post) e que apenas se conseguiu adiar e nunca resolver definitivamente.

A verdade é que a luta tem de continuar, e da nossa parte continuaremos nela, nas ruas (onde voltámos a estar ontem), na blogosfera, nas escolas, nos debates públicos, no Parlamento (com nova audiência já confirmada, com a Comissão de Educação e Ciência, para o próximo dia 9 de Junho), nos orgãos de comunicação social, onde quer que possamos fazer ouvir a nossa voz e as razões que nos assistem, pois para além dos horários, dos concursos e da alteração do modelo de gestão, há muitos outros problemas por resolver: a questão do Estatuto do Aluno, cada vez mais central, as condições de trabalho dos professores, o respeito pela  dignidade profissional docente, a recuperação integral do tempo de serviço, a alteração do ECD, a vinculação dos colegas contratados, a alteração da regulamentação de concursos (concursos para afectação a quadro, opcionais, de 2 em 2 anos e não de 4 em 4) e das regras de renovação de contrato (retirando ao Director os poderes totais que possui, colocando os professores contratados numa situação de inaceitável fragilidade), a questão da formação contínua, a revisão e reorganização curricular, a redução do número de alunos por turma e de turmas por professor, o inferno da burocracia que inunca e sufoca  o desempenho da docência/direcção de turma/coordenação e direcção das escolas, o controlo da indisciplina e da violência, o problema da Educação Especial, o reforço de meios e técnicos especializados nas escolas e a sua requalificação material, os perigos da municipalização e da perda dos vínculos, a qualidade do Ensino, as questões da inclusão e da qualificação, entre outros aspectos que devem continuar a merecer a nossa atenção e redobrado empenho na luta.